Zen e a arte de nutrir ideias

Por Roberto Schmidt, para Coletiva.net

Tenho que falar para todo o mercado: sim, ainda existem ideias. Isso não é coisa do passado, nem nenhuma lenda que algum professor contou na faculdade.

Diferentemente do que anda acontecendo nas agências (o redator recebe o briefing e faz um texto para alguém passar para o diretor de arte fazer o layout), ainda existem trabalhos em que o redator e o diretor de arte e quem mais estiver no job criam juntos ideias, que, depois, podem virar roughs, que podem virar layouts, que depois podem ir para o lixo ou, para a glória, virar uma bela campanha que resolva o problema proposto pelo cliente e ainda renda alguns prêmios.

Eu tenho o meu processo criativo, deixa eu falar um pouco sobre isso, talvez te inspire.

O artista é um colecionador, já diria Austin Kleon. O criativo também. Se você sempre vê as mesmas coisas, você cria as mesmas coisas. É meio óbvio, mas isso é importante.

Se você só vê propaganda, você sempre repete o que já foi feito.

A revista se chama Archive porque ela realmente é um arquivo do que já foi feito.

Qual foi a última vez que você foi numa exposição? Cinema? Boteco com os amigos? Conversou com o motorista do Uber? Você tem que se alimentar de histórias, referências. Mas não se esqueça de registrar tudo de alguma forma. Reserve um caderno para esses insights, trechos de livros ou entrevistas e até mesmo sonhos. Eu uso um que são três moleskines grudados, um para ideias, outro pra coisas legais que eu vi e um terceiro que é o diário que estou escrevendo para a minha filha Sofia sobre o período da gravidez.

Experimente meditar um pouco, observar a mente.

Só aparece o caos?

Então abrace o seu caos, perceba o que ele te diz. Perceba o momento em que ele silencia e o que aparece entre um pensamento e outro. Espere cristalizar as ideias. Tudo o que é importante precisa de tempo, mesmo que o pessoal da pauta ache que não.

Abra espaço para o flow. Odeia meditar? Experimente cozinhar em atenção plena. Ou se imponha limites. Ou os dois. Desde que virei vegetariano, quase vegano, comecei a dedicar um tempo para criar receitas e pratos sem carnes, sem farinhas, sem lactose e sem glúten. Te garanto que tem que ser criativo para fazer isso. É um baita exercício. E resume bem o meu processo criativo.

Passo 1: Vou ao mercado escolher produtos. Dentro dos limites, seguindo uma regra estabelecida.

Passo 2: Experimento os produtos, conheço o que eu tenho para usar.

Passo 3: Tento combinar coisas. Por exemplo, berinjela com tomate temperados com sálvia e azeite no forno.

Passo 4: Sirvo e peço o feedback para minha família.

Percebe como é parecido com o processo de criação de qualquer outra ideia?

Vejo referências dentro do briefing proposto, estudo o máximo sobre o produto, faço conexões com o que eu tenho e com tudo que eu já passei, experimento formas e testo. É a mesma coisa.

Saiba valorizar o seu caos e seu nonsense. A criatividade se manifesta em muitas formas não racionais. Relaxe um pouco na busca obsessiva do sentido. Largue de mão o complexo de perfeição. Processos criativos são fluidos, não existe erro, existe movimento. Desapegue das ideias. Você tem várias guardadas, nem fique grudado na primeira que aparecer. Ela ocupará o espaço das outras que estão por vir.

Criatividade é diversão. Se o caminho que você está seguindo não te traz alegria, questione, suspeite. Está tão difícil achar inspiração? Nada parece bom?  Repense. A vida é curta demais para gastar tempo fazendo algo que você odeia. Valorize mais os seus talentos. Crie sem medos.

Viva a criatividade, não a performance da criatividade. O mundo já está cheio de ego e performers. Milite em prol da autenticidade. No final, tudo se resume à sua história de vida e às narrativas que você vai deixar nesse mundo. Faça bonito. O mundo está precisando.

*Com a colaboração de Maria Cláudia Quinto Schmidt.

Roberto Schmidt é publicitário.

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