2019: Pessimista ou otimista?

Por Ely José de Mattos, para Coletiva.net

Quando se faz projeção econômica, os termos "pessimista" e "otimista" não carregam qualquer juízo de valor. Tratam-se apenas de cenários que envolvem uma ou outra situação onde a variável em questão se comportará positiva ou negativamente, em função das condições do seu entorno. Para o caso do crescimento do PIB, por exemplo, o cenário pessimista contempla que algumas coisas poderão acontecer (ou deixar de acontecer), de modo que o resultado será um crescimento baixo.

Note, ser otimista ou pessimista tem a ver com o objeto em análise. Se o PIB cair em função de que todos os brasileiros resolveram trabalhar menos e viver mais humildemente, numa espécie de conversão coletiva ao minimalismo, isso seria algo retratado num cenário pessimista do PIB. Preste atenção: do PIB! O fato de o economista desconsiderar que as pessoas estão mais felizes com menos dinheiro não significa que ele está fazendo qualquer juízo de valor sobre isso. Ele simplesmente está olhando para uma variável em específico e trabalhando nela.

Por isso, acho muito difícil simplesmente afirmar ser otimista ou pessimista sobre o ano que se avizinha em um texto como esse. Prefiro um exercício de análise mais normativo, que seja mais multidimensional e complexo. Então, vou focar em questões que me parecem essenciais para nosso futuro próximo... a começar pela economia, claro.

A equipe econômica do governo do presidente eleito, Jair Bolsonaro, comandada por Paulo Guedes, tem uma série de desafios pela frente. Desde a reforma da previdência até o processo de desburocratização da economia, passando por privatizações, tudo é difícil. Mas algo precisa ser feito. O viés da equipe é liberal, de modo que existe uma agenda clara de aumento da autonomia (e poder) do setor privado sobre a economia, com o governo sendo o agente facilitador. Se parássemos por aqui, tenderia a ser otimista, pois a ineficiência do estado brasileiro não permite mais a inércia. Ações neste contexto facilitarão a retomada do crescimento econômico.

Mas a minha faceta pessimista surge quando mudo o objeto de análise e avalio quem pode pagar a conta dos ajustes. Já conhecemos de outras experiências mundo afora, que agendas como essa, a depender de como são implementadas, jogam sua conta no colo dos mais pobres, com a ultrapassada e bolorenta promessa de que "é preciso fazer o bolo crescer para depois dividir". A ideia do aprofundamento da reforma trabalhista é a materialização deste meu ponto. Ao considerar que é preciso "aproximar as leis trabalhistas da informalidade", sugere-se uma ampliação do desequilíbrio de forças entre empregado e empregador. Um expediente como esse vem a aprofundar o cenário de desigualdade já catastrófica que vive o Brasil.

E essa agenda passa também pelo meio ambiente. Com relação a esta pasta, sou pessimista. Não há qualquer sinal progressista no que tenho visto da equipe de transição e do futuro ministro. A posição de destaque internacional que o Brasil conquistou na área ambiental, como importante ator internacional, está sendo destruída antes mesmo de o governo começar. É imprescindível que a nova pasta abra espaço de discussão com a sociedade civil e com a importante rede de ONG's que atuam nesta área no Brasil. O Ministério do Meio Ambiente não existe para coordenar licenças ambientais de obras: isso é apenas uma consequência de todas as outras atividades de proteção e gestão ambiental que ele desempenha.

Sobre educação a peteca ainda não foi jogada. Sabe-se pouco sobre projetos concretos. Vou ficar em cima do muro nessa. O que alimenta um pouco o meu lado pessimista nessa área é o excesso de energia depositado em projetos como o Escola sem Partido, que em nada contribuem com o debate que é realmente urgente: a qualidade da educação básica. Também é vaga a ideia da criação dos "vouchers", tanto do ponto de vista de estrutura de oferta de vagas quanto de financiamento. Iniciativas que parecem ser promissoras, de outro lado, têm partido da sociedade civil e das universidades, e têm relação estreita com a inovação... temos muito pela frente nesse filão.

No que toca à saúde, o SUS precisa de atenção imediata. E ela passa, de modo bastante especial, pela questão do seu financiamento. Colocar as contas públicas em dia é mandatório para que se tenha maior liberdade de investimento na saúde. Mas também é preciso aperfeiçoar a gestão. Episódios como a mais recente polêmica envolvendo o Mais Médicos me preocupam, pois o novo governo já assumirá com um problema instalado, que ele mesmo criou: a dificuldade na interiorização dos médicos. No lado positivo, destaco que existe um espaço imenso para melhoria na gestão da saúde através de iniciativas mais inovadoras, como o que ocorreu em Porto Alegre com a marcação de consultas e serviços de ortopedia.

Mas, então, será que não sai um balanço entre pessimismo e otimismo, pra ver quem ganha? Não sai, não! Melhorar a qualidade de vida das pessoas é algo que passa por todas essas áreas de forma conjunta, com efeitos cruzados. Agora, otimista ou não, o que não podemos é perder a fé nas pessoas, arregaçar as mangas e fazer a nossa parte. Feliz Natal e um desejo de um 2019 com muita energia positiva!

Ely José de Mattos é economista e professor da Escola de Negócios da PUC.

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