A mesmice estratégica das campanhas

Por José Carlos Aragão Basta dar uma olhadinha nas campanhas publicitárias dos grandes anunciantes do meio TV para que se constate uma forte tendência …

Por José Carlos Aragão
Basta dar uma olhadinha nas campanhas publicitárias dos grandes anunciantes do meio TV para que se constate uma forte tendência da propaganda brasileira à mesmice estratégica: bateu, levou. Virou moda uma campanha de sucesso ter uma quase imediata resposta do principal concorrente, parodiando ou parafraseando a anterior. Muitas vezes a pendenga vai às barras do Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária) que recomenda a retirada de um ou outro comercial do ar. Logo, logo, vem outro filme ironizando os protestos do concorrente ou a decisão do Conar.
Se analisarmos bem, é um modismo que vai e vem. E estamos vendo, de novo, um período "vem".
Talvez essa mania tenha começado com as cervejas pré-Ambev. Talvez até antes, com os refrigerantes (Coca-Cola X Pepsi, Guaraná Antártica X Coca-Cola, Guaraná Kuat X Guaraná Antártica) - arranca-rabo que acaba de ser também retomado, na versão Pepsi Twist X Coca-Cola Lemon. Se a memória não me falha, algumas marcas de cigarro também já andaram trocando farpas mais sutis, em priscas eras, quando, para alguns, Chanceller era o fino que satisfazia e, para outros, o importante era ter Charm. Já aconteceu também, sem tantas sutilezas ou gentilezas, em época mais recente, com as prestadoras de serviços de telefonia fixa (em Minas, de onde escrevo, Telemar, Intelig e Embratel).
Os mais novos exemplos dessa mesmice estratégica envolvem a telefonia celular (em Minas, Tim, Oi e Telemig Celular, alternando-se em polarizações cíclicas entre elas); de novo as cervejas (agora pós-Ambev); o HSBC e alguns bancos rivais; e - representando o segmento do varejo popular de eletromésticos e móveis -, a caçula das pelejas entre concorrentes: Ponto Frio Bonzão X Casas Bahia.
De fato, cada nova peça, em si, vem carregada de humor, às vezes fino, sutil, requintado; às vezes, apelativo, forçado, até deselegante.

O fusuê envolvendo a Nova Schin e a Antártica, por exemplo, com seus testes cegos, surdos e portadores de outras deficiências, começou por uma ironia quase nonsense ("a número 1, no teste cego"), seguiu pela ironia de graça duvidosa (o tal "teste surdo") e terminou (terminou? a gente nunca sabe ao certo quando essa coisa acaba?) num irônico elogio à campanha "Experimenta", da primeira. A gênese mais remota de todo o frege entre as duas marcas, no entanto, remonta à polêmica retirada do ar dos filmes da tartaruga aposentada (referência à Brahma) e da velhinha (ironizando os recorrentes apelos eróticos de campanhas da Kaiser, Skol, Antártica e outras), no pré-lançamento da Nova Schin.
Já o Banco HSBC adota uma linha mais soft, tentando demonstrar com depoimentos artificiais as contradições das linhas de comunicação adotadas por seus concorrentes. Chega a ser tão sutil, que quase ninguém percebe - nem os outros bancos, já que, parece, nenhum partiu abertamente para o contra-ataque.
É interessante notar que quem toma a iniciativa do ataque é sempre quem está em segundo lugar na preferência dos consumidores ou quem está entrando no mercado. Parece ser a única estratégia de quem está nessas condições. Confundem marketing agressivo com agressividade.
Se a estratégia visa forçar um maior recall a partir de conversas no dia seguinte, do tipo "você viu o comercial daquela sandália nova gozando as Havaianas?", pode ser um tiro no pé (desculpem, eu não resisti ao trocadilho, talvez contaminado por esse novo gênero de redação publicitária). Acontece que se, por um lado, a estratégia pode ser um bom exercício de criatividade para os redatores das agências, por outro, são de uma tediosa repetição e previsibilidade.
Em suma, enquanto algumas agências - com a conivência dos seus próprios clientes que aprovam as campanhas e peças - não decidem se contrataram redatores de publicidade ou de humorísticos de TV, o espectador se diverte mais tentando descobrir as ironias e estocadas subliminares entre anunciantes concorrentes. Alguns podem achar tudo muito divertido, outros nem tanto. É possível ainda que muitos se lembrem do filme, da piadinha, mas se esqueçam das vantagens de adquirir o produto anunciado.
* José Carlos Aragão é jornalista, publicitário e escritor, de Belo Horizonte. O artigo foi originalmente publicado no site www.observatoriodaimprensa.com.br

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