A propaganda (eleitoral, e às vezes gratuita)

Por Roberto Schultz* Quando surge a velha polêmica sobre o nome correto da atividade chamar-se Publicidade ou Propaganda eu sempre pergunto a quem tem …

Por Roberto Schultz*
Quando surge a velha polêmica sobre o nome correto da atividade chamar-se Publicidade ou Propaganda eu sempre pergunto a quem tem a dúvida, caso a pessoa trabalhe no ramo: você se considera um publicitário ou um propagandista? Ele vai responder, claro, que é um publicitário. Isso mata a dúvida, pelo menos para não estender muito a polêmica e a maioria das polêmicas hoje no Brasil é completamente inútil.
Aqui não há polêmica imediata. No caso do termo Publicidade, ele vem associado a um uso explicitamente comercial, para divulgar um produto ou serviço que vai ser vendido ao potencial consumidor. Já o termo Propaganda implica na divulgação de uma ideologia, qualquer uma, sugerindo que seja política ou religiosa. Há também quem chame a Publicidade de Propaganda Comercial, mas deixemos assim. Nada mais acertado, então, do que chamar a Propaganda Eleitoral de propaganda mesmo, eis que o objetivo dela é justamente divulgar uma ideologia, dos partidos políticos. Só que a Propaganda Eleitoral não é monitorada pelas Normas da Publicidade. Ela tem Lei própria, a chamada Lei Eleitoral, ou Lei 9.504/97.
Como todo mundo sabe, algumas agências de publicidade literalmente tomam partido e trabalham para esses ou aqueles partidos políticos ou candidatos. O mercado publicitário, hoje, está nessa estiagem a que nós estamos assistindo, às vezes até com um certo ar blasé de que não é com a gente, mas já tem gente comemorando a "conta" de carrocinha de pipoqueiro. Nada contra os pipoqueiros. O fato é que se comemora muito e com estardalhaço, mas realiza-se pouco. Então muitos publicitários (e não os "propagandistas") resolvem nessa época fazer um bico na propaganda eleitoral. Os mais afoitos, ou os convictos, trabalham antes de receber. E nem sempre recebem.
O maior anunciante brasileiro são as Casas Bahia, onde o freguês escolhe como quer pagar. Na política, salvo as honrosas exceções que sempre existem, o candidato ou o partido político são quem escolhem como querem pagar e acabam pagando somente as primeiras parcelas do serviço contratado. O primeiro problema, pois, é financeiro. Não, o CENP não tem nada a ver com isso. Ao menos não num primeiro momento. Essa discussão está muito mais na esfera da cobrança de uma dívida comum pela prestação de serviços do que na discussão entre agências e anunciantes.
O problema, nesses casos, e que ainda complica mais as coisas, é que em situações assim pouca gente trata de fazer um contrato escrito com o partido, a coligação ou o candidato. E depois não consegue cobrá-los. O segundo problema é de veiculação. Ela não é livre, mas toda regulamentada pela Lei. Definida a partir do Artigo 36 da Lei citada, ela diz que é "vedada a pichação, inscrição a tinta e a veiculação de propaganda, ressalvada a fixação de placas, estandartes, faixas e assemelhados nos postes de iluminação pública, viadutos, passarelas e pontes, desde que não lhes cause dano, dificulte ou impeça o seu uso e o bom andamento do tráfego" o que, claro, pouca gente respeita. Para esse fim, então, vale a solidariedade da agência, na hora de responder pelo prejuízo. No CENP e no CONAR as agências são solidárias com os atos dos anunciantes.
Mas eu não acabei de dizer que não se aplicam as Normas da Publicidade para a Propaganda Eleitoral? Disse, só que, nesses casos, a agência funciona muito mais como um "departamento de marketing" do distinto vereador ou da "agremiação política" do que como "agência de propaganda política". E, assim, mesmo que não tenha sido, considera-se que foi a agência que orientou aos empolgados cabos eleitorais sobre o que podem e o que não podem fazer, ainda que esses últimos, justamente em nome da empolgação e do clima de "já ganhou", sem consultar ninguém, resolvam pintar o nome do provável prefeito no viaduto. E isso, segundo a Lei, sujeita o "responsável" (quem é ele, mesmo?) à reparação do bem e a uma multa.
Em bens particulares, está liberado, desde que o dono seja correligionário e permita. Ou que também ganhe algunzinho na transação, de preferência adiantado. A Lei diz, ainda, que "a realização de qualquer ato de propaganda partidária ou eleitoral, em recinto aberto ou fechado, não depende de licença da polícia" , mas se antes do ato você não precisa pedir a autorização, diz também a Lei que é necessário uma comunicação àquela autoridade, com antecedência de no mínimo 24 (vinte e quatro) horas, sobre a pretensão de realizar o ato.
Você também pode usar aquele magnífico "spot de áudio", geralmente acompanhado de um jingle originalíssimo, que passa o dia inteiro berrando em cima de um fusca, desde que seja das oito às vinte e duas horas e numa distância superior a 200 metros de hospitais, escolas, bibliotecas, igrejas e de outros locais onde se exija o devido silêncio. Também não permite, a Lei, que você use conceitos, frases, símbolos ou imagens associadas ou semelhantes àquelas usadas por órgãos públicos, ainda que a sua agência (aí sim, de Publicidade) tenha criado toda aquela identidade visual, contratada através de uma licitação. Por fim, o Artigo 42 da Lei Eleitoral dispõe sobre a propaganda através de outdoors cujos espaços, aliás, são sorteados pela Justiça Eleitoral e não podem ser colocados onde se bem quiser, mesmo que se possa pagar por isso.
A vantagem é a de que o preço cobrado pela propaganda eleitoral, por lei, não poderá ser superior àquele cobrado normalmente pela propaganda comercial. Por que levantar essa lebre justo agora? Porque é exatamente agora, quando ficou para trás o primeiro turno e muita gente até já enrolou a bandeirinha porque a eleição está ganha ou porque não deu, é que podem começar os problemas. Para os esperançosos - partidos e publicitários - sempre resta o segundo turno.
* Roberto Schultz é advogado de agências, criador no Brasil da expressão "Direito Publicitário".

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