A pseudo-inclusão digital

Por Rafael Lourenço A internet ocupa cada vez mais espaço na vida dos chamados “incluídos digitais”. Definir o que é inclusão digital e quantos …

Por Rafael Lourenço
A internet ocupa cada vez mais espaço na vida dos chamados "incluídos digitais". Definir o que é inclusão digital e quantos são os incluídos é tarefa das mais complicadas, senão impossível. No artigo "O caráter pseudo da inclusão digital", a pesquisadora Denise Correa Araújo afirma que "seria difícil dizer até que ponto é possível afirmar que há uma inclusão digital, se considerarmos que muitos usuários da rede a usam somente para seus e-mails. Seria isso a inclusão digital?" Somado a isso, podemos imaginar também as crianças que frequentam demasiadamente lan houses como se fossem cassinos, apenas para jogos. A inclusão digital ainda me parece bem aquém de seu potencial. Enquanto ferramenta, a internet, para atingir o objetivo real da inclusão, precisa ser usada para facilitar o dia-a-dia, evitar uma ida ao banco ou à banca de jornais, por exemplo, ou o uso do telefone além do acesso fácil a notícias mundiais e a praticamente qualquer conteúdo de interesse do usuário.
Semana passada, pudemos assistir ao primeiro debate online no Brasil, organizado pela Folha/Uol e transmitido ao vivo por vários sites. Pelo Twitter, o debate era assistido e comentado simultaneamente, gerando uma interatividade inédita. A meu ver, o debate propiciou ao público os principais pilares do que a internet pode gerar de positivo e, em especial, um dado negativo.
Houve uma real e saudável interação e convergência dos meios de comunicação. Qualquer indivíduo, em qualquer lugar do mundo, munido de um computador conectado à internet, pode, em tempo real, assistir ao debate, comentar o conteúdo, ver comentários de outros internautas e ler opiniões de jornalistas e especialistas que logo postaram textos na internet (seja em portais, sites de jornais ou blogs). Alguns internautas ainda tiveram a oportunidade de fazer perguntas (previamente gravadas) aos candidatos.
Povo pode começar a enxergar as distorções
Essa mudança do eixo central da comunicação (TV/impresso) e sua descentralização para a internet é superpositiva no sentido de dar voz aos comunicados que ganham o direito de ser também, e por que não, comunicadores, na medida em que de pronto publicam suas opiniões. O problema, e por isso deixei claro haver ainda um ponto negativo, é que a grande mídia e, consequentemente, a lógica capitalista, é quem organiza e apresenta esse show. No momento de selecionar as perguntas dos internautas para os candidatos, me pareceu (assim como a capa da revista Época sobre o passado de Dilma) que a parcialidade do meio foi embora. Em um debate onde o intuito era expor propostas, a Folha/Uol selecionou e apresentou uma pergunta à candidata Dilma no mínimo constrangedora. Não era mentira, a pergunta foi baseada em fatos, porém, que nada tinham a ver com propostas. A pergunta, em linhas gerais, foi: "Como você se sente sendo o resto do PT, aquilo que sobrou e que apenas por isso foi escolhida para ser candidata?"
Não quero defender este ou aquele candidato. Mas se é para bater, vamos bater, se é para ouvir, vamos ouvir. Acho que perguntas como essa não acrescentam nada à exposição de propostas. Mas se era para partir para esse lado, por que não perguntaram ao Serra, para equilibrar o desconforto, algo como: "Como você se sente tendo rachado seu partido e criado inimizades com os principais ícones do PSDB?" Ou ainda: "O que você tem a dizer sobre candidatos que assumem compromisso com um cargo público por quatro anos e largam para concorrer a um cargo melhor?"
Internet, interatividade e convergência são pontos positivos, mas falta transparência. O povo não é passivo a tudo e, com um bom uso da internet, pode começar a enxergar as distorções. Mas esse ainda é um longo caminho que começa por melhores políticas de educação, a base do esclarecimento.
O artigo foi publicado originalmente no site www.observatoriodaimprensa.com.br  

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