A questão do direito de resposta

Por Sebastião Jorge Muitos foram os arranjos feitos pela Coroa Imperial, no século 19, a partir de D. Pedro I, para controlar os jornais. …

Por Sebastião Jorge
Muitos foram os arranjos feitos pela Coroa Imperial, no século 19, a partir de D. Pedro I, para controlar os jornais. Nessa tentativa publicaram editais, decretos reais etc., com o fim de censurar o que saía da tipografia nacional subordinada à Corte. Até uma Lei de Imprensa portuguesa, de 1821, usaram para calar os jornais, sem conseguir, apesar dos protestos dos publicistas, como eram conhecidos os jornalistas.

Nessa trajetória incluem-se os remendos no século seguinte, pós-República, não menos, as tentativas, ainda, hoje, para se aprovar uma peça jurídica que corrigisse os erros e exageros do passado. Em resumo: a Lei de Imprensa de 1967 foi extinta pelo STF, em abril do corrente ano, mas restaram muitos anteprojetos, projetos e nenhuma decisão definitiva, para se chegar a um final reparador.

Aquele estatuto que se imaginava ser unanimidade quanto à queda, pelo que se lia, via e ouvia nos jornais, TV e rádio, tão logo desapareceu e há quem considere que alguns artigos não deveriam ser extintos, e sim, aperfeiçoados. A divergência é quanto aos que desejam uma nova Lei de Imprensa ou uma lei que abone o Direito de Resposta, enquanto outros consideram que os códigos Civil e Penal, sob a tutela da Constituição, resolvem os problemas. Até o Código do Consumidor, nos dispositivos que tratam da Propaganda e Contrapropaganda, se pode usar, por analogia, na opinião do juiz (Rio de Janeiro) Luiz Gustavo G. C. Carvalho, professor de pós-graduação da Universidade Estácio de Sá, um especialista em legislação de imprensa.
Indenizações, para a Justiça comum
O esquecimento abateu-se sobre a memória dos interessados ou dos envolvidos com a mídia, a curto prazo. Por falta de anteprojetos e projetos engavetados no Congresso Nacional não deixaríamos de ter uma nova Lei de Imprensa para substituir a antiga. A ANJ encaminhou um documento ao senador Josaphat Marinho (1915-2002), que o transformou no Projeto de Lei de no 3232/92, debatido pela última vez três anos depois. Alguns dispositivos geraram polêmica, a exemplo do artigo 6º, do Capítulo IV - Da Responsabilidade Civil, que no parágrafo único não estipula um valor-limite para indenizações, permitindo que o juiz o fizesse de acordo com a proporção da ofensa. Este um problema existente que continua dando dores de cabeça para jornalistas e os donos de algum tipo de mídia. A indenização por sentença de danos morais muitas vezes supera o valor do patrimônio do veículo de comunicação. Isto intimida e se constitui num pretexto para contrariar a livre manifestação de pensamento e informar.

O relator do projeto, deputado Vilmar Rocha, declarou não poder estabelecer uma base às indenizações por ser inconstitucional. No seu entendimento, a perda por parte da mídia mereceria avaliação ao longo do processo. Aplicação da pena: fixada de 1 a 10 meses e paga com serviços prestados à comunidade. O texto original do senador Josaphat Marinho, que tinha como relator o seu colega José Fogaça, não previa a indenização como forma punitiva de eventuais deslizes praticados pelos infratores. Dispositivos introduzidos nas comissões criaram conflitos de interesses.

Os senadores Jutahy Magalhães (1929-2000) e Márcio Lacerda apresentaram anteprojetos. Nos originais previa-se a instituição de penas pecuniárias variáveis de acordo com o delito cometido. Há mais. O senador Roberto Requião, outro personagem do cenário de 1996, quando se instalou uma crise institucional no país, nos deu o Projeto de Lei do Senado no 257, que dispõe sobre o Direito de Resposta. Declarou-se contra uma nova Lei de Imprensa, com este argumento: "Em que são diferentes os jornalistas de um marceneiro, um advogado, um parlamentar ou engenheiro? As questões específicas referentes a indenizações devem ir para a Justiça comum" (revista Consulex, Brasília, no 10 - 31.10.1997).
Um novo estatuto?
Talvez a resposta esteja com o jornalista e professor de Ética, Carlos Chagas, da Jovem Pan. Expôs com base na realidade e longa experiência sem dispensar a ironia o desempenho de um profissional de comunicação:

"A imprensa comete excessos. O jornalista faz o papel de delegado de polícia, porque apura as coisas antes da polícia ou do Judiciário; faz o papel de promotor, porque denuncia; faz o papel de juiz porque condena, e até o papel de carrasco, que executa" (revista Consulex, no 44, p. 6, 31.8.2000).

O jornalista Alberto Dines, numa longa entrevista ao Jornal da ABI no 342 - junho, 2009, p.20, referindo-se ao assunto, lembrou: "Reunimos em um dos nossos programas (TV Cultura) vários juristas importantes, entre eles Miguel Reale Júnior. Realmente, há quem discorde se a Lei de Imprensa deveria ser jogada toda fora, como entulho autoritário, mas todos admitem que é preciso um novo entendimento sobre como vão ficar as coisas agora, se haverá outro código ou se alguma lei já existente passará a regular o assunto. Para não haver indenizações absurdas e abusos, como é costume acontecer no Brasil."

Afinal, o que se quer hoje, com relação à Lei de Imprensa? Um novo estatuto que substitua a finada Lei de 67 ou que se extraia do seu cadáver algumas peças, que possam servir à democracia e uma imprensa livre?
Fartura de boas intenções
Do último número do Jornal da ANJ (agosto de 2009) extraímos nomes e tendências dos que pensam diferentes e sugerem alternativas. O diretor jurídico daquela entidade, Guliver Leão, considera que quanto menos legislação houver melhor (?), mas será necessária uma legislação para assegurar o Direito de Resposta, que ficou em aberto. Para Walter Ceneviva e o jurista Manuel Afonso Ferreira, respectivamente, advogados da Folha de S.Paulo e do Estadão, o fim da L.I. deixou um "apagão jurídico" que os Códigos Civil e Penal não preenchem, pois não têm detalhamento para especificidade ao direito de resposta. Isto, embora o professor Ferreira veja o artigo 5º da Constituição, capaz de resolver o problema. Ceneviva é favorável a uma nova Lei de Imprensa, aprovada pelo legislativo. Manuel Ferreira quer uma lei que contemple a mídia de um modo geral, inclusive as novas tecnologias. O Estadão em editorial de 21/5/09, tratando da revogação da Lei de Imprensa de 67 pelo STF, disse a certa altura:

"Segundo os especialistas, as lacunas mais importantes dizem respeito a direito de resposta, pedido de explicações, retratação, retificação espontânea, sigilo de fonte, exceção da verdade, cálculo da indenização por danos morais. Diante das especificidades técnicas no campo do jornalismo, o "apagão jurídico" provocado pela revogação da Lei de Imprensa deixou jornais, revistas, rádios, televisões, além de promotores e juízes, sem regras claras que balizem principalmente as situações de conflito entre os direitos da informação e os da proteção à honra e a imagem."

Há fartura de boas intenções. Faltam ações concretas que se materializem e resolvam de uma vez o problema que como está não pode ficar.
 

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