A Revoada

Por Sérgio Capparelli Um dia me perguntei por que as feiras do livro aqui acontecem geralmente no segundo semestre, em agosto, setembro, outubro e, …

Por Sérgio Capparelli

Um dia me perguntei por que as feiras do livro aqui acontecem geralmente no segundo semestre, em agosto, setembro, outubro e, algumas vezes, em novembro. Talvez porque parte dessa mobilização pela leitura e pelos livros venha das escolas, o que requer muitos preparativos. Além do mais, feiras do livro como as de Novo Hamburgo, Dois Irmãos, Morro Reuter, Sapiranga, Ivoti, Garibaldi, Bento Gonçalves ou Caxias exigem uma feira de livro permanente em cada escola e em cada sala de aula.


Achei boa a minha interpretação, mas insuficiente: "deve ser mais do que isso!" E, olhando o calendário, descobri que a maior parte das feiras de livro acontece na primavera ou um pouco antes. Isso quer dizer que existe também um tempo para os livros se abrirem nas praças e nos jardins, espalhando o perfume de suas histórias e de seus versos pelas cidades. Por outro lado, como em toda primavera, algumas flores desabrocham antes, dependendo do lugar. Perto de onde moro, por exemplo, foi a vez das magnólias. Muitos pés de magnólias, sem folhas, apenas flores brancas, garças prontas para voar. Não é primavera ainda, bem sei, mas o que fazer? Essas flores não se agüentam!  E perto da cidade onde moro, por exemplo, tem Novo Hamburgo. Milhares de estudantes pendurados nos seus livros, pequenos e grandes, com histórias e versos prontos para voar.  Não é primavera ainda, bem sei, mas o que fazer? Esses, de Novo Hamburgo, não se agüentam!


Achei boa a minha interpretação, mas mais uma vez eu me disse: "deve ser mais do que isso ainda!" E logo me dei conta de que feiras de livro não se fazem sozinhas. Que elas se parecem com uma revoada de pássaros e de livros, até aceito, tudo bem. Mas escute o que diz Brecht nesses casos: "Quem construiu a Tebas de sete portas? Nos livros estão nomes de reis. Arrastaram eles os blocos de pedra?"  "Para onde foram os pedreiros na noite em que a Muralha da China ficou pronta?"  É isso, pensei, falta nas feiras de livro o nome de muito mais gente. O das professoras, por exemplo, que há meses preparam seus alunos. O dos pais dos alunos, ajudando como podem seus filhos em casa. O do cidadão que pagou seu imposto com dificuldade, para tornar possível o evento. O de quem planejou tudo isso.  E até o de quem madrugou para os serviços de limpeza.


Só assim, me disse, seremos todos pássaros e seremos todos livros.


 


* Sérgio Capparelli é jornalista e escritor, colaborador de Coletiva.net.

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