Agosto, sexta-feira, 13

Por Márcia Fernanda Peçanha Martins* Acompanhada de uma legião de seguidores, não acredito em bruxarias e outras misturas esotéricas feitas no caldeirão da panela …

Por Márcia Fernanda Peçanha Martins*
Acompanhada de uma legião de seguidores, não acredito em bruxarias e outras misturas esotéricas feitas no caldeirão da panela naqueles castelos assustadores. Mas, como diz o ditado español, "yo no creo en las brujas, pero que las hay, las hay". Portanto, internautas, crentes ou não de bruxarias, preparem-se. O último dia útil da semana poderá ser de arrepiar. A próxima sexta-feira é 13, e como se isso não bastasse, o mês é agosto, do desgosto, do cachorro louco, das desgraças, enfim. Não custa nada chegar à redação ou ao local de trabalho com um dente de alho, um crucifixo, evitar passar embaixo de escadas e fugir de gato preto.
Se podemos dar uma força, ainda que pequena, para a sorte, não custa nada. Uma boa dica é evitar falar no antônimo de sorte, para que ele não se sinta num terreno mais fértil para se instalar. Nas redações, esses dias costumam mostrar cabeças pensantes em ebulição. Se fosse possível uma foto panorâmica dos jornalistas em ação, certamente apareciam pequenas sinais de fumaça na cabeça. É que, para culminar com o 13 de agosto, sexta-feira é o dia da semana em que se está adiantando o que é possível para as edições de domingo e segunda, uma vez que os jornais trabalham com plantões nos finais de semana.
Então, aquelas redações que normalmente já refletem um ambiente não tão calmo e sereno assim, como poderia supor quem lê ou toma contato com o produto final, ficam completamente elétricas em dias assim. Tudo pode acontecer. Não é bom duvidar do poder das bruxas. Agora, as coisas andam mais calmas em Brasília, mas nos tempos de José Sarney, Fernando Collor de Mello, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, duas editorias eram sempre premiadas nas sextas-feiras, fossem elas 13 ou não. O pânico rondava as Editorias de Economia e Política.
Na Editoria de Política, aquele ministro que tinha ficado toda semana no edifício "balança, mas não cai" resolvia demitir-se, conforme o caso, ou era demitido pelo presidente, via de regra, depois das 19h. Todos os repórteres eram chamados, uma mini reunião era feita - porque o tempo valia muito neste caso - e o plantel de repórteres era imediatamente escalado para fazer repercussão, especular sobre o próximo, já tentar antecipar seu currículo e contar o caso desde o início. Na editoria de Economia, principalmente no final dos anos 80 e início dos anos 90, rondava o fantasma dos pacotes e planos econômicos.
As mudanças na Economia, naquela época costumavam sempre ocorrer nas sextas, depois das 19h, quando até o Caderno de Economia (que circulava naqueles anos em Zero Hora) estava quase pronto. Era muito Plano, muita mudança de moeda, de ministro, medida provisória e a mini reunião convocada para ver quem fazia o quê, a opinião do empresariado, e qual a expectativa da taxa de inflação a partir de agora, e quem será o presidente do Banco Central. E o pior de tudo, mudar o caderno de Economia, para não ficar desatualizado.
Lembro de uma sexta-feira de um dia cansativo de trabalho, por volta das 18h30min, e o pessoal da Economia enxergou um certo burburinho da sala do diretor do jornal. Como os preços estavam uma gangorra, um colega acostumado a este tipo de empreitada tinha passado o dia num périplo em supermercados anotando os preços, fazendo contas, para ver o aumento dos preços dos produtos principais em uma semana. A tabelinha e a matéria prontas. A notícia veio quentinha da sala do diretor do jornal: vem novo plano econômico e os preços estão sendo remarcados.
Por motivos evidentes, o repórter habituado a conferir os preços nos supermercados não poderia fazer o trabalho porque eles estavam remarcando os valores antes que os plano econômico fosse editado, a fim de pegar os preços no pico. De posse de uma pequena listinha de produtos básicos, com a melhor cara de dona de casa que arrumei em função do horário, fui para os supermercados acompanhada de uma grande colega, que iria me ajudar, e num carro sem logotipo (símbolo da empresa). No primeiro supermercado, vimos que não iria dar certo. Nenhuma de nós passeava com desenvoltura por um supermercado e nenhuma tinha idéia de onde ficava cada produto.
Acertamos uma estratégia. Pegamos um carrinho, colocávamos alguma coisa dentro dele e comentávamos, e o preço heim, Dona Maria? Pois é, parece que subiu há pouco, comadre Isaura. O número ainda tá borrado. Assim, fizemos em mais ou menos quatro ou cinco supermercados. Quando entrávamos no carro de Zero Hora, as duas tinham ataques insanos de risos. De volta ao jornal, as suspeitas confirmadas. Tudo havia subido, e naquele momento o ministro da Fazenda dava uma coletiva. Em seguida, o chefe providenciou um pequeno lanche coletivo, e sentados à frente dos teclados mudamos o jornal e o Caderno de Economia daquele final de semana. Não lembro, muito bem, comadre Isaura, se era 13 de agosto, mas que era sexta-feira fervilhante, ninguém duvide, e que as bruxas estavam soltas também.
* Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista. Formada pela PUCRS, trabalhou no Jornal do Comércio, Zero Hora e atualmente está em assessoria de comunicação social.
[email protected]

Comentários