Aparência é tudo

Por Rafael Soares* Acho que foi na coluna-blog do Marcelo Tas, no UOL, que eu li sobre o ponto mais importante da série de …

Por Rafael Soares*
Acho que foi na coluna-blog do Marcelo Tas, no UOL, que eu li sobre o ponto mais importante da série de debates que começou ontem nos Estados Unidos: a aparência. Opinião do Tas - com a qual concordo - é de que ganha o debate quem se posiciona melhor, responde de maneira mais calma e firme e sabe aproveitar cada pequeno deslize do adversário para alfinetá-lo, e fazê-lo parecer bobo em frente às câmeras. Com os números das pesquisas cada vez mais apertados (lembrando: Kerry liderava, Bush virou o jogo e a diferença agora está em 4 ou 5 pontos percentuais), os próprios americanos sabem que, independentemente do que tenha sido feito até agora, é o candidato que melhor utilizar a mídia daqui até novembro que vai vencer a eleição.
No caso desse primeiro debate, parece consenso na mídia americana - excluindo, claro, a opinião da "não!-nós-não-favorecemos-ninguém" FOX News - de que o senador John Kerry foi mais bem sucedido no auditório em Miami. Prova disso são algumas das pesquisas divulgadas após o debate, pelas próprias redes de TV americanas. A ABC e a CBS fizeram pesquisas instantâneas durante e até algumas horas após o final do debate. A CBS apurou os votos de duzentas pessoas selecionadas para assistir e comentar o debate. Destas, 44% apontaram a vitória de Kerry, contra 26% de Bush e 30% que consideraram "um empate". A ABC fez sua pesquisa por telefone, e o senador Kerry levou 45% dos votos com a pergunta "Quem você acha que venceu o primeiro debate?". Bush ficou com 36%, e 17% votaram no empate. A FOX, curiosamente, não realizou pesquisas, apenas comentários de seus articulistas. O reflexo deste tipo de ação é instantâneo. Hoje pela manhã, CNN.com, por exemplo, repetia a pergunta da ABC e apontava uma vantagem de 72% a 21% pró-Kerry, com mais de 400 mil votos.
Em um país onde o voto não é obrigatório, os indecisos são quem, na verdade, decidem a eleição. Ambas coordenações de campanha sabem disto, e querem aproveitar os debates para convencer eleitores e, ainda, transformar a opinião de alguns que não tomaram lado. Kerry, por exemplo, vai aproveitar para ficar dois dias em campanha pela Flórida - lembram da confusão em 2000? Al Gore de certo não esqueceu - ostentando os louros do debate e mostrando que se preocupa com as questões internas do país. Bela mídia em um Estado ainda enfraquecido depois da passagem das tempestades. Aliás, Bush também já fez sua parte na Flórida (antes do debate), entregando água e alimentos para os desabrigados. Pose de super-herói é o que importa no momento. É como dizer: "Vejam, americanos, eis aqui seu presidente ideal: ele é mais esperto, mais articulado e mais inteligente do que o outro cara, e todo mundo está dizendo isso na TV e nos jornais. Você não vai querer votar em um perdedor, vai?!".
E assim será até o dia 2 de novembro. No último mês de campanha, as propostas e estratégias já estão na mesa há tempo, resta saber quem vai se manter firme com as mesmas, quem vai saber fazer um melhor jogo-de-cintura e tentar acalmar os ânimos internos e externos. Pelo que podemos perceber daqui, a briga é "Bush e anti-Bush". Kerry não parece ter carisma suficiente para ganhar "por si" (sic) esta guerra da mídia. Como a rejeição é algo que os americanos exercem muito bem, não é de se duvidar que o senador, apoiado por bons programas de TV e boas apresentações em Estados considerados essenciais para a decisão dos votos pode, sim, virar o jogo e vencer a eleição. Já George W. Bush se vê em uma encruzilhada: no momento em que as coisas começam a acalmar no Iraque (enfim, estão matando menos americanos por dia do que há alguns meses), ele tem de se voltar para os Estados Unidos e sua economia estagnada. Talvez aí esteja o grande erro de Bush, que pode custar-lhe a eleição: teria sido o Iraque a sua grande cartada? Talvez ele esperasse que a situação estivesse bem melhor resolvida a este ponto do que realmente está, e que isto lhe valesse a eleição. Como as coisas não saíram bem como o planejado, o Presidente teve de se envolver - e desgastar - muito mais do que o previsto, o que custou sua presença e participação em outros temas. E, aí - curiosamente, lembrei agora: o tema único do debate de ontem foi a Guerra no Iraque - Kerry levou vantagem, como quem diz: "Ó, eu não esqueci do resto". Pois bem, o segundo debate, de três previstos, será no dia 8 de outubro na Universidade de Washington, em St.Louis. Até lá, veremos.
* Rafael Soares é jornalista
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