As
manhãs
de
sábado
chegam
sempre
de
bicicleta
. E
então
saio pedalando.
Mas
Beijing tem
muita
pressa
.
Bairros
inteiros
viram
condomínios
de
edifícios
de uma
hora
para
outra
. Mudam os
costumes
e os
preços
. E
também
as
pistas
especiais
de
ciclistas
. Veja se consegue
me
acompanhar.
Pego a
bicicleta
na
área
de
serviço
e desço
com
ela
até
o
térreo
.
Dona
Mifan
já
está colocando a
gaiola
do mainá no
terraço
.
Ele
,
ave
falante
,
cumprimenta
, dizendo nin hao,
com
seu
jeito
sóbrio
,
olhos
escuros
e
expressão
séria
.
Em
vez
de responder-lhe,
cumprimento
Dona
Mifan. Nin hao.
Olho
os
pés
de
magnólia
floridos no
meio
do
pátio
. Três deles lilases,
um
branco
.
Me
lembro de
que
tenho de
bater
algumas
fotos
e dou
um
impulso
na
bicicleta
. Levo o
pé
esquerdo
ao
pedal
,
projeto
levemente
o
corpo
por
sobre
o
selim
e saio a pedalar.
Na Jiang Hua Nan Lu bailam
painas
de
primavera
.
Milhares
delas nesse
dia
de
vento
.
Vento
,
não
,
ventania
: a
poeira
forma
pequenos
redemoinhos.
Parte
do
pó
vem das
construções
. A
prefeitura
está instalando
novas
tubulações de
esgoto
dos
dois
lados
da
rua
e
vão
retirar
os
fios
elétricos
aéreos
.
Um
tapume
estende-se
até
a Jianguomen.
Beijing está
assim
.
Cheia
de
guindastes
.
Metade
dos
guindastes
do
mundo
está
aqui
. Os
edifícios
erguem-se da
noite
para
o
dia
.
Não
dá
para
acompanhar
o
ritmo
.
Muita
gente
,
muita
máquina
e
muito
trabalho
.
Não
sei se os
números
são
confiáveis,
mas
os beijinenses dividem o
espaço
a
ser
construído
em
pequenas
porções
de uns 15
centímetros
quadrados
cada
, deslocando de 350 a 400
trabalhadores
e de 50 a 60
guindastes
para
cada
uma dessas
porções
.
Até
parece
que
estou inventando. Estou,
mas
é
quase
isso
.
Assim,
rápidos
.
Um
operário
prepara
o
cimento
, o
outro
o
aço
, e o
terceiro
já
está na
fila
,
com
o
vidro
que
vai
ser
posto
na
janela
.
Um
termina,
outro
retoma. Duas
horas
depois
já
estão
prontos
cinco
andares
.
Mas
não
param
aí
,
porque
começou
outro
turno
. Os
anúncios
de "aluga-se"
já
estão
nos
jornais
. Os
primeiros
moradores começam a
ocupar
o
edifício
e, numa
reunião
de
condomínio
, decidem a
primeira
reforma, o primeiro
casamento
, o
primeiro
filho
e o
primeiro
enterro.
Enquanto
isso
,
guindastes
quase
tocam o
céu
.
Como
técnica
de
marketing
, põem e dispõem
nuvens
para
flutuar
no
pedaço
, exercem
controle
familiar
rigoroso
, abrem o
mercado
para
o
capital
estrangeiro
, investem na
construção
de
navios
, reparam o vazamento de
poluentes
químicos
no
rio
de Harbim e fecham as
rachaduras
dos
diques
do Yangtze.
Anoiteceu nesse
meio
tempo.
Não reconheço
minha
rua
nem
meus
vizinhos
.
Então
me
dou
conta
de
que
meu
passeio
de
bicicleta
na
manhã
de
sábado
durou
anos
. Pergunto à
síndica
se conhece
um
estrangeiro
que
morava no
segundo
andar
da Yong An Li,
apartamento
504,
edifício
9,
ela
me
olha
com
curiosidade
e
pergunta
,
qual
edifício
? Insisto e
ela
diz
que
indago
sobre
acontecimentos
de
muito
tempo
atrás
e
ela
tem
memória
fraca.
Um
senhor
de
idade
, de
barbas
brancas,
que
passeia
devagar
no
pátio
, apóia-se na
bengala
, dá uma
meia
volta
e informa
que
havia,
sim
, no
início
do
século
,
um
estrangeiro
nos
antigos
apartamentos
da Yong An Li,
mas
que
ele
saiu
um
dia
de
bicicleta
e
nunca
mais
voltou.
Fico
ali
, apoiado
em
minha
bicicleta
durante
algum
tempo
.
Dois
homens
e
três
mulheres
estão jogando "cuju",
um
jogo
parecido
com
o
atual
futebol
,
mas
que
existia na China há
mais
de 2.500
anos
. As
regras
do
jogo
,
com
observações
sobre
os
times
, goleiras, e supervisionados
por
um
juiz
, chegou
até
os
dias
de
hoje
nas
páginas
do
livro
"25
Regras
do Cuju",
escrito
durante
a Dinastia Han do
Oeste
(206 a.C-a.C 24).
Esses
jogadores
- os de
agora
, na
minha
frente -, fazem
embaixadas
, dão
toques
com o
tornozelo
e recebem
aplausos
dos
que
assistem das sacadas.
As
luzes
de
neon
piscam desatinadas no KMT
Pátio
dos
Ventos
. E acho
muito
estranho
estar
, a essa
hora
, empurrando uma
bicicleta
em
uma Beijing
desconhecida
. E
então
me
assusto,
com
a possibilidade de
ter
sido
eu
que
mudei
muito
depressa
nesse
outono
da
vida
.