De
vez
em
quando
pego
o
carro
e saio
por
aí
.
Não
pelas
grandes
vias
. Pelas
pequenas
. Vem
assim
, de
repente
.
Pego
o
mapa
,
fecho
os
olhos
e bato o
dedo
. Dessa
vez
caiu Belluno, a
70 quilômetros
aqui de Podenone, onde estou, uma cidade perto de Veneza. Belluno,
então
.
Como
está o
tempo
? Parece
que
vai
chover
.
Cappuccino
com
chuva
em
Beluno,
portanto
.
Na
verdade
, os
primeiros
20
quilômetros
sigo
pela
auto-estrada
,
até
Conegliano, essa
cidade
famosa
por
ser
o
berço
do Prosecco e
pelos
seus
famosos
cursos
de enologia.
Mas
depois
a
estrada
estreita
e corta cidadezinhas e
vilas
, às
vezes
margeando
rio
e
lagos
.
Um
deles -
olha
lá
embaixo
- ao
lado
da
estrada
San Floriano, é
pintado
de
um
verde
azulado.
Tinta
grossa
, pode-se
perceber
na
crista
das
marolas
.
Nunca
vi
igual
.
Vontade
de
sair
do
carro
,
descer
pelo
barranco
e
erguer
a
margem
do
lago
ou
a
ponta
do
trapiche
,
para
ver
o
que
tem
por
baixo
, se
tela
ou
cartolina
.
Aposto
tela
,
mais
apropriada
para
esse
tipo
de
paisagem
.
Sigo
com
essa
imagem
por
muitos
e
muitos
quilômetros
, passando
por
Fedalto Basso,
onde
paro,
para
ter certeza de
que
o
lago
é
mesmo
pintado
,
por
Borgo Menegon,
onde
já
me
arrependo de
não
ter
descido a
ravina
,
até
chegar
a Fadalto, deixando a
província
de Treviso e entrando na de Beluno. Paro o
carro
e peço
um
cappuccino
. Vejo
que
a
atendente
joga
canela
na
espuma
do
leite
.
Tanto
melhor
.
Não
gosto
de
chocolate
, nessa "bevanda
composta
da caffè espresso e latte montato a schiuma".
Tento
passar
os
olhos
sobre
o Gazzeta dello Sport
mas
não
consigo
.
Em
vez
de
letras
,
apenas
o
pequeno
lago
incrustado nas
montanhas
,
em
um
jornal
incorpóreo
- tem no
mapa
,
mas
sem
nome
- circundado
por
estradas
de
nomes
esquisitos
,
como
San Floriano,
Via
Fadalto
Alto
e
Via
Fadalto Basso. Deixo o
café
, arrependido de
não
ter
pedido
também
um
brioche ou um croissant, talvez preocupado com a irrealidade que pode exibir uma paisagem imaginada.
Só
sossego
mais
adiante
, ja na
província
de Belluno, ao
circundar
o
Lago
Santa
Croce e
perceber
que
esse
,
sim
,
não
é
pintado
nem
de
cartolina
,
com
suas
comunas
de
Santa
Croce,
Farra
d"Alpago,
até
tomar
a
esquerda
em
Cadole e
chegar
a Belluno,
agora
já
no
frio
e
com
a
chuva
tamborilando, tendo à
frente
- do
pára-brisa
- a
imponência
dos Dolomitas.
Chove
agora
mais
forte
me
fazendo
errar
a
entrada
de Belluno, essa
cidade
com
um
Duomo do
século
16, o Palazzo dei Rettori, de 1491,
onde
moravam os
governantes
venezianos
e a Piazza dei Martiri,
com
seus
palácios
renascentistas
. É
aqui
que
estaciono, na
frente
de
um
supermercado
, ficando
ainda
um
bom
tempo
ouvindo os
pingos
.
Depois
abro o
guarda-chuva
e
pouco
depois
me
abrigo
sob
as
arcadas
,
até
encontrar
um
café
simpático
,
onde
passo
boa
parte
da
tarde
. E dessa
vez
,
sim
, peço
brioche
,
porque
a
moça
diz
que
é
brioche
,
mas
,
para
mim
, pain au chocolat, e
enquanto
como
, observo os
rostos
em
volta
, a essa
hora
do
dia
.
Não
,
não
quero
museus
. Quero
apenas
essa
chuva
caindo
calmamente
sobre
a
praça
,
como
se fosse uma
chuva
antiga
,
que
se renova de
quando
em
quando
, nessa
paisagem
que
os
olhos
compõem
lentamente
. Numa
paisagem
quase
abstrata
, tenho
certeza
. E
quando
a
chuva
diminui, bisbilhoto
mais
um
pouco
os
arredores
, leio
um
cartaz
sobre
uma
apresentação
musical,
não
,
não
posso, tenho de
voltar
. Dessa
vez
,
sim
,
mesmo
com
chuva
, descerei a
ravina
,
apenas
para
me
certificar
da
irrealidade
do
lago
,
pois
tenho
toda
a
volta
para
reconstruir
a
paisagem
.
* Sérgio Capparelli é jornalista e escritor, colaborador de Coletiva.net.