Eu, um fantasma

Por Mario de Almeida* Estreei como jornalista aos 9 anos, no jornal “Nosso Esforço”, da minha escola, onde colaborei até concluir o curso primário. …

Por Mario de Almeida*
Estreei como jornalista aos 9 anos, no jornal "Nosso Esforço", da minha escola, onde colaborei até concluir o curso primário. Aos 13, entrei para o time dos ghost writers, escrevendo a carta para a namorada carioca de um colega de ginásio em São Paulo. O divertido é que ele, depois de copiar a carta, guardou o meu rascunho e o achou uns 30 anos depois, o que nos valeu momentos de curtição. Aliás, esse amigo, e mais uns 40, almoçam ou jantam juntos uma vez por ano e, quando estou disponível, pego um avião e vou a São Paulo abraçar os antigos companheiros. Ano passado eu fui e, ao chegar ao restaurante, perguntei à recepcionista:
- Onde é a mesa dos velhos? - Ela nem piscou ao apontar a mesa onde já se encontravam uns 20, os hoje chamados idosos.
Antes de ir trabalhar na Globo, eu já era o ghost writer do Walter Clark. Otto Lara Resende era o do Roberto Marinho, para os assuntos de TV. Ao ir para a Fundação Roberto Marinho, fui escalado para escrever os textos sobre a instituição assinados ou "discursados" pelo chefe maior.
Para Walter Clark escrevi palestras proferidas no Congresso, Escola Superior de Guerra, no exterior, em recebimento de títulos honoríficos e em outras ocasiões. O esquema era assim: a secretária do Walter me telefonava, dizia assunto, público e data; eu escrevia e entregava. Ele e eu jamais falamos sobre o assunto, ou seja, tudo transcorria na mais absoluta harmonia, até que?
Um dia, eu já na Globo, a secretária me telefona e diz que o Walter não tem como escapar de uma homenagem numa formatura de contabilistas e me pedia um discurso super breve. Dia seguinte à formatura, ele me telefona diretamente e diz:
- Mario, nunca mais use a abertura do meu discurso de ontem.
Cocei a cabeça, imaginando que eu quebrara a cara logo num texto tão simples. E Walter prosseguiu:
- Desde ontem, aquela abertura é só minha e usarei sempre nos meus discursos de improviso.
Não só concordei, como desliguei o telefone aliviado. O início era: "A unidade de tempo do profissional de TV é o segundo. Não se assustem. Serei breve."
Fiz alguns importantes trabalhos na área de propaganda para a DPZ e, um dia, recebo um telefonema de um executivo de lá, pedindo algo inusitado para as nossas relações profissionais: um discurso. Roberto Duailibi (o D da DPZ) prometera escrever, pessoalmente, um discurso para importante cliente da agência e o chefe da conta desconfiava do cumprimento da promessa? Entreguei o discurso e, dias depois, recebo o recado para "tirar a nota", pois o texto fora aprovado por Duailibi e, depois, pelo cliente. Tratando-se de um trabalho que eu nunca fizera para a agência, telefonei para um jornalista amigo, com empresa de assessoria, para saber se R$1.000,00 seria um preço razoável. Ele disse que sim e eu telefonei para a secretária do diretor da agência no Rio:
- Regina, diga ao Edeson que eu ia cobrar R$1.000,00, mas me dei conta que o Duailibi pode se ofender por cobrar barato um texto dele e prefiro receber R$1.500,00.
No fim da tarde, Regina me telefona e manda eu tirar a nota, pois o Edeson disse que a piada, que sacudira de riso a agência, valia os 500 pila.
* Mario de Almeida é jornalista, publicitário, dramaturgo, autor de "Antonio?s, caleidoscópio de um bar" (Ed. Record), "História do Comércio do Brasil - Iluminando a memória" (Confederação Nacional do Comércio) e co-autor, com Rafael Guimaraens, de "Trem de Volta - Teatro de Equipe" (Libretos).
[email protected]

Comentários