Fome, um zero à esquerda

Por Marcos Linhares Recebi um correio eletrônico de um aluno de jornalismo, que desconheço. Na mensagem me pedia que respondesse a três perguntas sobre …

Por Marcos Linhares
Recebi um correio eletrônico de um aluno de jornalismo, que desconheço. Na mensagem me pedia que respondesse a três perguntas sobre a fome. Divido com vocês o que disse a ele. Em minha modesta opinião, pois não sou especialista no assunto, a fome é um problema que cruza fronteiras e não é "invenção" brasileira. Contudo, a maneira como lidamos com a fome é bem interessante.A fome sempre foi e continua sendo usada como "moeda política", de mote fácil, para angariar aceitação,simpatia, votos?
Algo parecido com as inovações da indústria automobilística, na qual são diluídas como gotas as inovações a cada lançamento de ano. Hoje, um novo retrovisor (inventado há uns quatro anos e planejado para a versão 2003?), amanhã,um um teto solar, e por aí vai?
Se a fome for enfrentada de frente, o que sobrará depois? Essa pergunta incômoda ressoa tanto no consciente quanto no inconsciente dos "tomadores de decisão" do país. Até mesmo no Governo Lula, que admiro, vê-se isso. Escalam um "Graziano" para uma pasta estratégica como esta. Apesar das críticas, o despreparado continua lá. Fidelidade numa situação que envolve a vida de milhões é no mínimo incoerência. Pode ser que o Programa engrene. Faça alguma coisa válida. Espero, até, estar enganado. Entretanto, desconfio da vontade política de resolver o problema.
Um governo apoiado por conhecidos políticos que, usualmente,se beneficiam eleitoreiramente da fome, das adversidades de seus estados, e enriquecendo ilicitamente disso, como Sarney e ACM, não merece ter, no mínimo, as rédeas afrouxadas. Quem sabe seja estratégia do Lula. Manter por perto os inimigos, para quem sabe, conseguir o desejado. Espero que sim?
Quanto a nós, profissionais de comunicação, também temos nossa triste e terrível "parte que nos cabe neste latifúndio", como diria o saudoso poeta pernambucano que tão bem cantou a fome e a seca, João Cabral de Mello Neto.
A cada dia que passa, cobrimos o interessante do momento, o fugaz, o factual, a Big Midiocridade, a Casa dos Autistas e as grandes notícias caem no esquecimento. Quando,às vezes, surge um veículo que insiste em gritar diferente, como foi o Correio Braziliense, por algum tempo, vê-se calado pela chibata capitalista dos interesses corporativos.
A tal prestação de serviço à comunidade, tão decantada nos vilipendiados cursos universitários, hoje meros consórcios de diploma, se esvai pelo ralo da verba publicitária governamental, que ajuda a pagar os nossos salários, tapar nossa vista e emudecer nossas palavras. E olha que há raríssimas exceções, que, quando acontecem, advêm, geralmente, de ações isoladas.
Certa feita fui a um encontro de alunos universitários. Noutra, a uma festa de colegas que estudavam comigo. Em ambas as oportunidades, deparei-me com a fome de droga, de ambos. Eu, o careta, com fome de ir embora. Quem sabe, para eles, a droga tenha servido para tentar lidar melhor com isso tudo, se é que a droga serve para alguma coisa.
A notícia perene está perecendo.E a fome continua. Longe de nossas pautas, de nossas prioridades, de nossa sensibilidade. Um zero à esquerda, dos talões de cheque? O duro é agüentar, às vezes, essa danada de nossa consciência, chutando tudo, tirando o sono, impedindo de continuarmos "zumbis", indo para as redações, a cada dia mais sem rumo, sem prumo e sem ética. Dona Ética está quase Zero. Deve estar morrendo de fome e de medo de ter que esperar Godot, ou seria Graziano??.
*Jornalista, escritor e correspondente, em Brasília, do site Comunique-se.
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