Impasses empresariais estratégicos

Por Günther Staub Esta reflexão diz respeito a uma empresa multinacional que, desde o início de suas atividades, foi líder de mercado no Brasil. …

Por Günther Staub
Esta reflexão diz respeito a uma empresa multinacional que, desde o início de suas atividades, foi líder de mercado no Brasil. De todas as que operavam, era a que melhor interpretava e entendia o consumidor brasileiro, seja pelo lançamento de novos produtos, seja pela política de qualidade e de preços, seja pelo jeito de se comunicar com os consumidores. Era a mais brasileira das multinacionais do setor e, durante anos, chegou a ter cerca de 80% do mercado. Era uma marca forte, líder inconteste.
Num determinado momento, a empresa começou a cometer erros no lançamento de novos produtos e, ao longo do tempo, foi estabelecendo rígidos critérios de gestão e sofrendo, em contrapartida, uma agressiva ação da concorrência. Como resultado, viu cair sua participação para cerca de 50%.
Enfim, como se diz em futebol, foi estabelecida e passou a ser posta em prática "a cultura do salto alto". Embora preocupados com as perdas, todos, do presidente aos operários, não encontravam soluções suficientemente eficazes que tirassem a companhia desse redemoinho preocupante.
Entre as muitas tentativas feitas, foi criada uma "joint venture", com a última empresa colocada no mercado. Ela teria complexas funções de holding operacional. Cada empresa manteria suas marcas e sua independência, ficando centralizados os setores de finanças, compras, logística, gestão de pessoal, projeto de novos produtos. Eram duas ferozes concorrentes no mundo todo, uma de origem européia e outra americana. As diferenças culturais a serem superadas eram enormes.
Novos produtos foram lançados, que, no entanto, apresentaram erros de projeto, desempenho insuficiente, baixa qualidade. Os consumidores e franqueados assinalavam os erros e pediam mudanças, mas ninguém de direito lhes dava ouvidos. As duas marcas perderam mercado e, num certo momento, o somatório de participação das duas já era inferior ao da primeira empresa quando iniciara a nova sociedade.
Em contraste, as campanhas de propaganda e as ações promocionais continuaram com elevados padrões de criatividade e com excelente capacidade de dialogar com os consumidores. Aconteceu, porém, uma distância entre a comunicação e a realidade. A propaganda não conseguiu superar as limitações e as deficiências, apresentadas pelos novos lançamentos, e a rigidez operacional das companhias. Estabeleceu-se uma "distorção" na comunicação, pouco perceptível no plano racional, embora nítida no plano subjetivo e imaginário do consumidor. Os resultados foram menos vendas, prejuízos, fracasso, dissolução da holding.
Novamente sozinha, a empresa contratou um gênio em mudança de culturas e especialista no corte de custos. Sua característica era calcular as margens dos fornecedores e impor-lhes novos preços que em geral os deixavam sem lucros e até com prejuízo. Para isso usava uma ?técnica especial". Telefonava para os fornecedores em suas casas sábado à noite, domingo pela manhã, no almoço, no jantar, na hora do cinema, do teatro ou da caminhada de fim de semana e comunicava: a partir de hoje nós pagaremos 11,64% a menos pelos seus produtos. E assim por diante. Para alguns ia ao exagero de informar que os novos preços se estendiam aos produtos já produzidos e àqueles em viagem (a logística era complexa). Além disso, dizia que as mercadorias somente seriam recebidas quando a empresa recebesse as notas de desconto sobre as faturas já emitidas. Era um horror, pois, na maioria dos casos, eram produtos exclusivos que só poderiam ser vendidos para aquela empresa. Outra ação foi o fechamento sumário de escritórios de vendas, de centros de treinamento e de assistência técnica e a demissão de equipes longamente treinadas. Na logística anterior, os vendedores percorriam distâncias médias de mais ou menos 150 km, ou 300 km de ida e volta; com a nova logística, passaram a percorrer 870 km ou 1.740 km de ida e volta. Some-se a isto o cansaço das equipes de vendas, o que acarretou improdutividade crescente.
Os franqueados, além de se sentirem abandonados, viram seus custos de comunicação e viagens aumentarem e passaram a enfrentar um congestionamento para se comunicar com filiais distantes e com pouca gente para atender seus pleitos. Enfim, com as distâncias nas linhas de comunicação aumentaram os custos e a fragilidade operacional dos franqueados e da empresa.
Os concorrentes fizeram o contrário. Aproximaram-se e apoiaram mais ainda seus franqueados, abrindo novos escritórios de vendas e de assistência técnica.
O resultado dessas políticas foi, ao final de um certo tempo, o encerramento das atividades de 1/3 dos franqueados. Assim, a empresa perdeu a liderança de mercado e, há alguns anos, não consegue se recuperar. No caso, os maiores inimigos foram, sem dúvida nenhuma, a cultura da empresa e os recursos humanos.
Isso mostra como é importante a uma empresa lutar contra o imobilismo e não dormir sobre o sucesso. É preciso perseguir constantemente a inovação e tê-la incrustada em sua cultura.
* Publicitário

Comentários