Indústria cultural e balança comercial da China

Por Sérgio Capparelli Quem está acostumado com as discussões sobre a indústria cultural brasileira fica um pouco surpreso quando os dirigentes chineses tratam desse …

Por Sérgio Capparelli

Quem está acostumado com as discussões sobre a indústria cultural brasileira fica um pouco surpreso quando os dirigentes chineses tratam desse mesmo   assunto na China. No Brasil, as discussões não acontecem no vácuo e o termo indústria cultural sempre teve um viés negativo . Em primeiro lugar , por ocupar o debate ideológico brasileiro e, em segundo , por acusar um pretenso rebaixamento da cultura mercantil. Entre os chineses, as discussões também não acontecem no vácuo . Mas ela é discutida apenas na sua acepção econômica , ao tratar de déficit da balança comercial da indústria da cultura . Não crítica ao empacotamento da cultura mas, à falta de bons empacotadores


Dizer que a China está preocupada apenas com o aspecto econômico da questão é desconhecer como a mídia trabalha seus conteúdos. Ela conhece seus limites . E se sabe, para que perder tempo nessas discussões ? Por que não economizar tempo e energia para   vender filme ou livro como se vendem computadores ? Em outras palavras , os aspectos ideológicos são tratados com discreção e os aspectos econômicos vão para a praça pública .


Vão para a praça pública e vão bem . Zhao Zizheng, por exemplo , que integra a Conferência Popular Consultiva da China, diz que o país está em posição desvantajosa no cenário internacional de trocas culturais, apesar de sua tradição cultural gloriosa . Ele diz, por exemplo , que para cada livro que exporta, a China importa 10. Ding Wei, assistente do Ministério da Cultura , faz eco das preocupações de Zhao e diz   que em anos recentes a China adquiriu 4 mil direitos para a publicação de títulos de livros dos Estados Unidos, mas vendeu apenas 16. O Diário do Povo entra na discussão com mais números , mostrando que, em 2004, Beijing enviou 61 grupos artísticos no exterior e recebeu 83. "A diferença é pequena", diz Zhang, " mas a média da bilheteria de cada espetáculo chinês foi de R$ 7.500, e a de cada espetáculo estrangeiro em Beijing foi de R$ 75 mil ", sem falar nos grandes astros que passeiam pelos palcos chineses, como Pavarotti ou Plácido Domingo .


O que fazer em um caso como esse ? Apoio governamental para as indústrias culturais destinadas à exportação dá certo? A resposta é difícil . Alguns profissionais chineses dizem que falta de produtos culturais aptos a terem uma boa aceitação no mercado internacional . Outros falam que a falta de intermediários ( vendedores e agentes ) constitui a maior dificuldade . Sem uma resposta , a China não cruza os braços . No dia 21 deste mês começa a Segunda Feira Cultural Internacional da China, em Shenzen, na província de Guangdong, no sul do país .


Esse agendamento da questão cultural na mídia , de forma organizada, com a feira internacional e a cobrança do governo central em relação aos produtores culturais, mostra que a China não quer ser apenas   um exportador tradicional de vestuário , calçados e brinquedos . Ela quer completar o ciclo da produção , circulação e consumo da cultura .


Nesse caminho , o país poderá se dar conta aos poucos de certas peculiaridades da indústria cultural. Diferentemente do sapato ou da massa de tomate , um livro ou um filme não dependem apenas de uma estratégia de marketing . Há certos produtos que "pegam" e outros que " não pegam". E muitas grandes obras de Hollywood, de Londres ou de Paris tiveram retumbantes fracassos.


A última tentativa da China para contornar essas dificuldades é buscar alianças com empresas estabelecidas no mercado . Como a legislação chinesa é rígida em relação ao capital estrangeiro na indústria cultural, as iniciativas são tímidas no setor . A Televisão Central da China (CCTV), por exemplo , contratou a News Corp"s Fox Cable para remodelar seu   site da Web e a Time Warner anunciou há poucos dias que vai transmitir programas do grupo Shanghai Media, que pertence ao governo . Tudo isso , evidentemente , como respostas ao déficit cultural anunciado pelo governo .

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