Jornalismo e diploma

Por Walter Galvani Sou aquilo que se chamava antigamente em Odontologia um prático-licenciado. Reconheço que alguns dos melhores dentistas que conheci não podiam pendurar …

Por Walter Galvani
Sou aquilo que se chamava antigamente em Odontologia um prático-licenciado. Reconheço que alguns dos melhores dentistas que conheci não podiam pendurar na parede do consultório o diploma, porque haviam iniciado suas carreiras como auxiliares, protéticos, e acabaram aprendendo a usar a botica, a broca e a manejar o equipo, na prática. Assim foi minha história com o jornalismo, que começou em 1954, atuando no quinzenário Expressão, que ajudei a fundar em Canoas (RS) e era dirigido pelo mais tarde advogado e juiz Túlio Medina Martins. Aliás, naqueles tempos, jornalista que se prezasse tinha que ter o curso de? Direito.
Mas, quis o destino que funcionasse melhor em minha formação um curso profissionalizante como gráfico (na Escola Profissional La Sale) e o meu gosto pela leitura que me encaminhou para as redações e mais tarde para a literatura. Hoje comemoro 48 anos de profissão e sete livros publicados. Aos poucos me encaminhei também ao rádio e ao trabalho de consultoria em comunicação social. Pelo caminho (1971 e 1972) lecionei em cursos de Jornalismo e tenho dado oficinas literárias. Pretendo seguir com este caminho, mas isto não quer dizer que eu não valorize os Cursos de Jornalismo que acabam de ser abatidos em pleno vôo pela decisão de Justiça, da juíza federal Carla Abrantkoski Rister, que suspendeu sexta-feira, em todo o país, a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para a obtenção do registro profissional no Ministério do Trabalho.
Acho, isso sim, que podem ser melhorados e para tanto devem contar com a participação e colaboração dos diplomados em outras profissões e dos formados pela escola da vida. Para isso seria necessário que os currículos fossem revistos com eficiência e muita atenção.
Não posso, nem pensar, em aceitar que a profissão de jornalista possa ser exercida por qualquer um, por pessoas despreparadas ou que desejam transformar a atividade em mais um bico ou um simples plus em sua atuação como engenheiros, médicos, comerciantes, funcionários ou empreiteiros.
Também não posso aceitar que o talento seja contido ou limitado pela grade do formalismo dos canudos oficiais, mas é preciso reconhecer que há caminhos e que toda e qualquer vocação precisa ser encaminhada dentro dos parâmetros que a própria sociedade estabelece.
Não importa que o jornalismo seja tutelado por decreto-lei de 1969, portanto oriundo do regime militar. É hipocrisia. Aquele decreto, como a freeway e os sistemas nacionais de telecomunicações, foram das boas coisas que os militares fizeram. De nada serve tentar diminuir a qualidade ou importância de alguma coisa, tentando reduzir ao mesmo nível tudo o que de bom se produziu em certo momento dado da evolução do país. Como diziam os italianos sobre o regime fascista de Mussolini: "É, mas os trens saiam no horário". Claro que o ideal é que os comboios partam em horas certas e dentro do regime democrático, de preferência sem carregar judeus para os campos de concentração?
È preciso elevar a qualidade dos cursos ao ponto de que se tornem exigência das próprias empresas na escolha de seus profissionais pelo carimbo de qualidade, pelo atestado de origem controlada, como os bons vinhos. Assim, como fulano é de Harvard, de Princeton, de Yale ou da Sorbonne ou de Coimbra. Como tantos jornalistas, saídos das faculdades gaúchas, que brilham hoje em todo o país.
* Jornalista e escritor. Artigo originalmente publicado no jornal ABC Domingo, edição de 12/01/2003.

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