Nem on nem off. É sobre pessoas

Por Matheus Freire, para Coletiva.net

Sim, isto é uma crítica aberta. Entendemos nossos processos diários e nossas relações a partir de uma timeline, em que algo novo vem constantemente para substituir algo que, até ontem não era velho. Na comunicação, a televisão já eliminou o rádio; o cinema, o teatro. Estamos em 2018 e todas essas formas de impacto e interação ainda existem - e emocionam, encantam e engajam. Fala-se muito em multiplataforma, branded content, digital (leia em inglês, é mais cool).

Vamos combinar, o publicitário ama usar nomes que possam encantar clientes, mesmo que estes, às vezes, nem saibam o que está sendo dito. Partindo deste princípio, no início desta década tivemos um grande 'boom' das agências ditas digitais. Na teoria, as mesmas acabariam com todas as agências ditas tradicionais dentro do processo (ou do nosso hábito 'publicitares', citado anteriormente), de que algo novo vem para acabar com o velho.

Ficamos muitas vezes enrolados, tentando mostrar para o colega do veículo concorrente ou da agência ao lado que estamos atentos a todas estas terminologias trazidas de algum festival de conhecimento em alguma pequena e charmosa cidade do interior dos Estados Unidos. Claro, extremamente importante olharmos as tendências apontadas para a comunicação, inovação e tecnologia no mundo. Mas e para a cidade ao lado e os hábitos de consumo fora do nosso eixo diário de convivência, estamos olhando? Será que não estaríamos precisando parar um pouco de olhar para nosso próprio umbigo, ou quem sabe utilizar esta vontade infinita de entender novos termos e passar a olhar para o que está acontecendo à nossa volta, aplicando isso no nosso dia a dia?

Fazemos parte de uma ciência social e não exata: métodos como design thinking podem ser úteis, mas com minha pequena vivência de mercado, sinto que não estamos aplicando tudo aquilo que aprendemos ou ouvimos em infinidades de fóruns, encontros, palestras e workshops. A Nike, numa estratégia de entender melhor o hábito de seus consumidores, abriu lojas pop up pelo interior dos Estados Unidos, a fim de compreender como a comunicação pode ter o sotaque, o jeito e as características daqueles locais. Estamos falando de Nike: marca sólida no mundo inteiro.

Nos últimos três anos, deixei o dia a dia de profissional de Porto Alegre. Fui muito criticado, inclusive, tendo que ouvir coisas como "Mas Matheus, tu não tem nem 30 anos (na época né, agora já tenho), o que tu vai fazer no interior? Por que não vai para o mercado Nacional? São Paulo? Ou até pra fora do País? Tu es jovem, tem que arriscar". Ok. Mas o que seria esse arriscar? Por que minha carreira continuaria crescendo apenas se eu fosse para um grande centro ou metrópole? Não podemos negar que nestes lugares as pessoas são diferentes. Afinal, em todos os lugares as pessoas possuem características e hábitos que as diferenciam, e é encantador ver que em Canoas, Esteio, Gravataí, Cachoeirinha, São Leopoldo, Novo Hamburgo, Dois Irmãos, Picada Café (esta última à apenas 60 km de Porto Alegre), têm seus próprios hábitos, seus sotaques, gírias, bordões. Mas muitos de nós, que estamos em Porto Alegre, ainda não paramos para ver, ouvir, olhar, ou, dentro do nosso contexto profissional, analisar este mercado e público.

Por isso, concluo que não deixei de entender de mídia ou de pessoas por não ter ido para um grande centro. Neste caso, prefiro dizer que todos somos iguais e só o que nos diferencia, de fato, são nossos hábitos e peculiaridades. Mas estamos trocando este conhecimento por novos termos e tendências de mercado, pois não estamos vendo há 60 km dos nossos olhos. Não estamos olhando para a forma de se comunicar destes públicos das cidades que talvez não frequentamos no dia a dia ou em nossos finais de semana.

O que estou tentando dizer, e que não sei se estou conseguindo ser claro, é que estamos muito, mas muito ligados no que está acontecendo fora, porque queremos dizer para os outros que sabemos, mas a aplicabilidade disso está sendo muito baixa. O On? O Off? Sobre o que estamos falando, de fato? Não é sobre pessoas? Ainda utilizamos poucos métodos de pesquisa, ainda somos pouco assertivos em nossas decisões, ficamos muito no meio do caminho, esperando pelo novo termo em inglês que dará as novas diretrizes do mercado e os fóruns de comunicação que falarão sobre o tal assunto pelos próximos dois anos. Mas será que não está na hora de olharmos um pouco mais para o que está acontecendo aqui, ou a 10, 20, 50 ou 100 km?

Acredito estarmos esquecendo que o mais rico e encantador da nossa profissão é entender de pessoas, as ferramentas são apenas uma forma de interagir com elas. Façamos da nossa profissão algo mais humano, isto sim sempre será tendência.

Matheus Freire é coordenador de Projetos da rádio União, de Novo Hamburgo.

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