O ovo e o Prêmio Aberje 2003

Por Paulo Nassar Nesses tempos bicudos, nas paradas que o mercado tem que enfrentar, as sanhas ficam assanhadas, as bocas mais vorazes e o …

Por Paulo Nassar
Nesses tempos bicudos, nas paradas que o mercado tem que enfrentar, as sanhas ficam assanhadas, as bocas mais vorazes e o caixa, minguado. O medo passa a ser uma companhia mais presente: de perder o emprego, do seqüestro, do assaltante na esquina, do adeus do cliente. Ganha espaço a chuva na própria horta, os enganos encontram solo fértil e há o enorme risco, especialmente para os comunicadores, de se sair do contexto. Felizmente, como bem diz o jornalista Mino Carta, o exercício do ceticismo é um sinal de inteligência.
Assim, na mistura do medo, pé no freio e um apetite aguçado, a gente vê brotar a cada dia soluções mágicas que, no escuro dos bastidores, são uma luta de foice sangrenta. Nesta, tristemente, procura-se destruir o outro na tentativa e esperança de assumir seu lugar. Lamentável.
O caso da Aberje parece ser um bom exemplo, no alto de seus 36 anos de vida. Seu prêmio anual, instituído há 29 edições, passa, atualmente, por todas as regiões do Brasil na identificação dos melhores trabalhos realizados regionalmente e deságua em uma premiação nacional, escolhida entre esses vencedores regionais. O intuito do prêmio - além de reconhecer e recompensar, sem excesso de glamour e sem envolver dinheiro -, é promover, por meio desse estímulo, o desenvolvimento da atividade de Comunicação Empresarial, respeitadas as características, particularidades e diversidades de cada região brasileira. O Prêmio Aberje tem como missão fomentar a Comunicação das empresas e instituições, e não os negócios - embora não tenha nada contra eles!
Boa metáfora
Não é uma missão fácil. Além do seu significado aparente, todo o processo exige uma tremenda responsabilidade, porque envolve a vida de muitas pessoas, direta e indiretamente. Expõe na sua vitrine os candidatos e exige bastante dos profissionais convidados a julgarem os trabalhos do ano, incluídas as decisões e suscetibilidades políticas, especialmente nas regiões brasileiras em que a Comunicação Empresarial é pouco desenvolvida, ainda pouco valorizada pelo gestor, e muito significativa para uma cadeia de fornecedores do mercado.
Em 2003, a Aberje enfrentou uma dificuldade, felizmente superada a partir de uma postura ética, da sua enorme base de confiabilidade e solidez, e do tratamento profissional com que o problema foi administrado - como reza a cartilha da Comunicação, no capítulo de gestão de crises. Casa de ferreiro, espeto de ferro.
O caso foi o seguinte: no julgamento dos prêmios regionais São Paulo, Centro-Oeste/Leste e Rio de Janeiro, a divulgação dos vencedores ocorreu antes da conclusão do processo de julgamento. Ainda na fase de seleção (responsabilidade do coordenador do prêmio e sua equipe), foi divulgada precipitadamente no site da entidade a potencial relação de premiados. O que acabou provocando comemorações, justas e merecidas, mas antes da hora.
O vazamento inadvertido poderia gerar suspeita e maledicência sobre o julgamento. Para que não pairasse nenhuma sombra, os Conselhos da entidade foram envolvidos, assim como sua área jurídica. A comissão julgadora foi avisada e teve garantido o seu poder de decisão, soberano, de validar ou invalidar os nomes já divulgados. Assim foi. E o prêmio voltou ao seu curso normal, a informação lisa e transparente foi assegurada a todos os envolvidos, assim como a franquia de acesso às peças concorrentes, notas e pareceres produzidos no processo.
Nem a comissão julgadora - sempre composta por nomes independentes, da mais alta qualidade pessoal e profissional, que nessa circunstância auditou o processo e julgou os casos - ou a entidade foram questionadas por qualquer uma das empresas candidatas ao prêmio.
Mas, como nos bastidores tem-se pouca luz e a briga é feia, fica aqui, para iluminar a questão do Prêmio Aberje 2004, uma história contada no livro Contos tradicionais do Brasil pelo grande Luís da Câmara Cascudo (1898-1986): "O homem que pôs um ovo".
Uma boa metáfora para esse caso do Prêmio Aberje, que não passou de um problema de gestão, cotidiano nas empresas, que gerou algum rumor, boato e fofoca, que poderia ter virado uma crise, mas que virou um bom caso de Comunicação Organizacional.
O homem que pôs um ovo!
Um marido tinha uma mulher muito gabola de saber guardar segredo. Vivia dizendo que as outras eram saco rasgado e ninguém podia confiar senão no juízo dela. Tanto se gabou e se gabou que o marido pensou em fazer uma experiência para ver se a mulher era mesmo segura de língua.
Uma noite, voltando tarde para casa, o homem trouxe um grande ovo de pata, que é muito maior do que os da galinha, e deitou-se na cama. Lá para as tantas da madrugada, acordou a mulher, todo assustado e pedindo que ela guardasse todo o segredo, contou que acabara de pôr um ovo! A mulher só faltou morrer de admiração mas o marido mostrou o ovo e ela acreditou, jurando que nem ao padre confessor havia de dizer o que soubera.
Ora muito bem. Pela manhã, assim que o marido saiu para o trabalho, a mulher correu para a vizinha e, pedindo segredo de amiga, contou que o marido pusera um ovo na cama e estava todo aborrecido com essa desgraça. A vizinha prometeu que ninguém saberia mas passou o dia contando o caso, ao marido, aos vizinhos, aos conhecidos, sempre pedindo segredo. E como quem conta um conto aumenta um ponto, toda a vez que a história passava adiante o ovo ia mudando de número. Primeiro era um, depois dois, depois três. Ao anoitecer já o homem pusera meio cento de ovos. Voltando para casa, o marido encontrou-se com um amigo e este lhe disse que havia uma novidade naquela rua.
- Qual é a novidade?
- Não soube? Uma cousa esquisita! Imagine que um morador nesta rua pôs, penso eu, quase um cento de ovos, seu mano! Diz que está muito doente e que cada ovo tem duas gemas. É o fim do mundo.
O marido não quis saber quem estava de vigia. Entrou em casa, chamou a mulher, agarrou uma bengala e passou-lhe a lenha com vontade, dando uma surra de preceito, que a deixou de cama, toda doída e com panos de água e sal.
Depois, o homem saiu contando como o caso começara e a mulher ficou desmoralizada. Por isso é que os antigos diziam que:
Quem tiver o seu segredo,
Não conte a mulher casada,
Esta conta ao seu marido,
O marido aos camaradas?.
* Paulo Nassar é jornalista, professor e presidente executivo da Aberje - Associação Brasileira de Comunicação Empresarial

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