O piloto e o porteiro

Por Gilnei Lima O homem, usando uniforme típico de companhias aéreas, caminha apressado em direção ao portão de acesso ao prédio puxando uma mala …

Por Gilnei Lima
O homem, usando uniforme típico de companhias aéreas, caminha apressado em direção ao portão de acesso ao prédio puxando uma mala pela alça, ao mesmo tempo fala ao celular. Chegando ao portão, puxa-o com um solavanco.
O portão estava travado. Pelo interfone o porteiro o aborda e pergunta em que pode ser útil - abordagem comum de quem trabalha nesta função e não reconhece o recém-chegado.
Irritado com a ação do porteiro, despeja soberba e arrogância sobre ele, falando em outro idioma:
- Who do you think you?re talking about? Who do you think I am?
( Com quem você pensa que está falando? Quem você acha que eu sou?)
E resmunga, afastando-se um pouco do portão, mas sem deixar de falar ao celular - ou simulando que conversava com alguém:
- What a stupid and ignorant people?
( Que gente estúpida e ignorante?)
Imediatamente o porteiro responde:
- Sorry sir, but I don?t know you . And yes, on land we are all ignorant and stupid. Probably not only we are, when we observe the flight safety, keeping locked cockpit?s door, opening just for someone we have absolute confidence that offers no real threat.
( Desculpe-me senhor, mas eu não o conheço. E sim, em terra somos todos ignorantes e estúpidos. Provavelmente só não o somos, quando observamos a segurança de voo, mantendo a porta da cabine de comando trancada, abrindo apenas para alguém que tenhamos absoluta confiança de que não oferece ameaça real.)
Engolindo em seco por ter sido surpreendido, o homem trajado com uniforme de aeronauta se identifica:
- Meu nome é Alberto e sou filho do morador do 602, aqui é minha residência eventual, quando chego na cidade. O senhor pode me anunciar para autorizar minha entrada?
O que o comandante de aeronaves não poderia imaginar é que o porteiro era fluente naquele idioma, pois tinha sido jornalista durante anos, até que o cenário de desconstrução do país começasse a acabar com os veículos de comunicação e imprensa, deixando desempregados milhares de jornalistas, restando agarrar-se a este digníssimo emprego. Do mesmo modo que, em breve, com o desmoronamento da economia, o piloto fosse lançado à condição de ex-motorista de avião, com a quebra das companhias aéreas.
Gilnei Lima é jornalista.
[email protected]

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