Os "fannullone" de lá e de cá

Por Sérgio Capparelli Já fez parte do anedotário a figura do funcionário público municipal, estadual ou federal que batia o ponto, pendurava o chapéu …

Por Sérgio Capparelli

fez parte do anedotário a figura do funcionário público municipal, estadual ou federal que batia o ponto , pendurava o chapéu e o paletó , e saía para beber um café na esquina . E assim passava o dia , de café em café , até a hora de bater o ponto novamente e voltar para casa .


Hoje isso não acontece mais , porque chapéu e paletó não estão mais na moda . Mas o funcionário absenteísta não perdeu o hábito do cafezinho.


Até bem pouco tempo bastava telefonar para uma repartição   público para saber que ninguém podia atender pois estavam em reunião . E essa reunião prosseguia hora depois de hora , dia depois de dia , ano depois de ano .


"Está em reunião " passou a ser numa tradução livre de "está no cafezinho". E dessa vez , sem chapéu e sem paletó .


Mas o que faz no cafezinho ou nas reuniões esse tipo de funcionário público ? O governo italiano decidiu investigar esses "fannullone", levantando a ponta do tapete para ver que tipo de lixo havia embaixo . Para isso um policial foi destacado para acompanhar os passos de Santi Giccone, 58 anos , da pequena localidade de Scaletta Zanclea, na costa jônica da Sicília,  nos dias 15 e 16 de maio deste ano .


1.A primeira coisa que o "fannullone" Santi Giccone fez ao chegar ao trabalho na prefeitura de Scaletta Zanclea, às 7h30min, foi bater ponto , passando alguns minutos na recepção ;


2. Em seguida deixou a seção e foi para a praça em frente ;


3. Depois da praça foi para um bar beber o café da manhã e ler jornal ;


4. Voltou à central telefônica , onde era telefonista , às 8h25min, e saiu novamente às 9h02min, para se exercitar em videopoker numa sala perto da prefeitura ;


5. Voltou à central , onde ficou durante quatro minutos , dirigindo-se em seguida à cidade vizinha para retirar dinheiro no caixa eletrônico ;


6. Voltou ao trabalho , ali permanecendo durante uma hora , o mais longo período na jornada , e saiu logo depois para comprar peixe numa peixaria;


7. Passou na lavanderia ;


8. Fez compras para si e para os seus parentes ;


9. Voltou à seção , limpou a garganta , para chamar a atenção dos outros , mostrando que estava ali , ergueu o telefone , repôs o aparelho no gancho , e saiu novamente ;


10. Voltou no fim do expediente , colocando na frente do guichê dos telefonistas um cartaz , com os dizeres : "fechado para o almoço , favor não insistir ".


A tarde foi quase uma repetição da manhã . Mas no dia seguinte ? bem , no dia seguinte foi tudo igual :


1.O "fannullone" bateu ponto , como de costume , às 7h30min;


2. Em seguida foi para o shopping;


E assim por diante , durante o resto do dia .


O policial fez questão de registrar pequenas diferenças . O "fannullone", por exemplo , fez compras , mas acompanhado de sua mãe , levando-a de volta para casa . E no fim deste segundo dia , outra mudança : Santi Giccone foi algemado e levado para a prisão .


O policial afirma que ele ficou muito surpreso ao saber que seria acusado de fraude , com o agravante de danos ao patrimônio público . E desde então os moradores de Scaletta que discaram para a prefeitura receberam uma pronta resposta do telefonista . Que não era Santi Giccone, evidentemente . pois ele foi despedido por justa causa .


Mas não se preocupem: os "fannullone" existem na Itália.


*Sérgio Capparelli é jornalista e escritor, colaborador de Coletiva.net.

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