Para empresas é Big Data, para os consumidores é Big Brother

Por Márcio Oliveira Escutando um comentarista numa rádio um dia, ouvi uma afirmação dizendo que quem está na Internet publicando seus dados, não importa …

Por Márcio Oliveira
Escutando um comentarista numa rádio um dia, ouvi uma afirmação dizendo que quem está na Internet publicando seus dados, não importa como, onde e para quê, não pode querer tanta privacidade, já que a Internet é pública. Em tempos de discussão em toda parte sobre o controle ao acesso de informações, me pareceu muito estranho escutar isso, pois coloca em risco o poder de escolha consciente das pessoas sobre quem e quando seus dados são acessados.
E acredito que este seja o ponto principal de toda esta discussão sobre Privacidade de Informações, a Consciência sobre as consequências tanto das pessoas que fornecem informações como de quem usa estas informações nas empresas.
Mas onde isso se liga com o BIG DATA? Termo da moda no marketing atual, conceitualmente o BIG DATA não traz nada de novo, a não ser que hoje temos muitos mais dados disponíveis, principalmente os dados comportamentais na Web, e tecnologia disponível para processar de maneira muito mais rápida e inteligente tantos dados.
Sim, temos muitos mais dados para analisar (e não apenas na web) mas será que devemos realmente usar todos eles? Ou, pelo menos, será que devemos utilizá-los como muitas empresas estão querendo? E vamos focar esta discussão apenas no uso comercial para alavancar vendas ou "estratégias" de marketing, já que sabemos que governos podem também se aproveitar disso para outras finalidades (algumas boas e outras duvidosas).
Você deve ter, provavelmente, centenas de cookies instalados em seu computador, tablet ou smartphone. Um usuário com um nível razoável de esclarecimento sobre o mundo Web sabe em profundidade o que significa isso, mas a grande massa das pessoas, não. E acredito que é nesta falta de consciência que está baseado todo este discurso de BIG DATA, ou o que na visão como consumidor, chamo de BIG BROTHER de dados.
A pergunta é simples. Se você disser para uma pessoa que vai rastrear tudo o que ela faz na Web, para depois usar estas informações para analisá-la e fazer mais ofertas de vendas para ela, ou mais, podendo até vender estas informações para outras empresas, qual você acha que seria a resposta? Qual seria a sua resposta se a pergunta fosse feita a você?
Talvez muitos não se importassem, mas acredito que uma parcela significativa das pessoas não aprovaria este uso se tivesse a real consciência do que pode acontecer. Mais do que isso, eu acredito que o uso indiscriminado destas informações para "enriquecer" as bases de dados e "turbinar" as vendas das empresas, acaba muitas vezes ultrapassando uma barreira ética.
E a mesma coisa acontece quando juntamos todos os dados do mundo on-line de uma pessoa aos seus dados do mundo off-line.
Ah, mas fazer "enriquecimento de dados" é uma técnica usada desde os primórdios do Marketing Direto, alguns podem dizer. Sim, é verdade, mas o problema é o tipo e a profundidade de informações pessoais que conseguimos ter acesso hoje.
Meu chamado com este artigo é o de alertar e trazer à consciência os profissionais das empresas que pensam em usar BIG DATA ou mesmo fazer um simples enriquecimento de sua base de dados. Faça, mas com critérios claros e ética. Se coloque verdadeiramente no lugar do seu público-alvo e pense o que de fato você gostaria que uma empresa soubesse de você e por que. Um bom caminho é ser simples e transparente nas políticas de uso e privacidade de dados de sua empresa, alertando a cada mudança e dando a opção das pessoas continuarem sendo seus clientes mesmo não permitindo que você utilize ou compartilhe seus dados desta maneira.
Depois disso, monte uma estratégia verdadeira e sustentável para RELACIONAMENTO com seus clientes, que eles darão conscientemente seus dados para sua empresa utilizar. Construa com calma o seu próprio "BIG DATA". Pode demorar um pouco mais, eu sei. E pode dar mais trabalho também. Mas ninguém faz relacionamento com clientes de verdade de maneira rápida e sem trabalho, além disso, o resultado a longo prazo para sua empresa será muito melhor e mais saudável.
E, para ficarmos um pouco mais conscientes, trago aqui 4 fatos que mostram movimentos do mercado e que vejo como consequência de mau uso dos dados pelas empresas:
1 - Há algum tempo o Google falou na imprensa que os usuários do Gmail não têm o que a empresa chamou de "expectativa razoável" de que seus emails sejam confidenciais. Este fato causou um tremendo mal-estar nem tanto pelo fato em si, mas pela consciência que ele trouxe aos usuários de algo que se imaginava, mas não se dava muita importância.
2 - Em 2014 entrou em vigor o Marco Civil da Internet, que trouxe de maneira imposta muitas regras para controlar entre outras coisas a privacidade dos dados. Atualmente ele está em processo de consulta pública para regulamentação de alguns pontos pendentes.
3 - Estamos também agora em 2015, em fase de consulta pública do texto do Anteprojeto de Lei de Proteção de Dados Pessoais que será criado para regular esta questão específica.
4 - Recentemente a revista Veja trouxe em suas páginas amarelas uma interessante entrevista sobre Big Data com um especialista do MIT, traçando vários aspectos de sua utilização, porém, uma coisa chamou a atenção quando ele coloca de maneira muita objetiva que os dados pessoais são um ativo das pessoas e, tratado de maneira individual, significa que as pessoas tem o direito inclusive de vender seus dados para as empresas e não mais simplesmente cedê-los ou "trocá-los". Este comportamento, se praticado em massa, mudaria totalmente o cenário atual de coleta de informações pelas empresas.
Márcio Oliveira é p ublicitário, professor, sócio e VP de Planejamento da youDb (www.youdb.com.br).
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