Para valer o que está escrito

Por Chico Bruno O novo governo, depois de algumas trapalhadas de comunicação provocadas por ministros e secretários, decidiu fazer cartilha explicativa para o relacionamento …

Por Chico Bruno
O novo governo, depois de algumas trapalhadas de comunicação provocadas por ministros e secretários, decidiu fazer cartilha explicativa para o relacionamento com a mídia. A incumbência de criar a tal cartilha coube ao experiente jornalista Ricardo Kotscho, assessor de Lula da Silva desde a primeira campanha presidencial, em 1989, e nomeado seu secretário de Imprensa.
Distribuída em reunião com todos os envolvidos na comunicação social do governo, incluídos assessores de autarquias, estatais e fundações, a cartilha foi recebida, por alguns, com reservas. Mas, como Luiz Gushiken, secretário de Comunicação Social e Gestão Estratégica, deu ordem unida, todos saíram cônscios de obedecer ao que estava escrito e determinado na cartilha.
Pois não é que no primeiro teste a cartilha está ameaçada de escoar pelo ralo do faz de conta, ou melhor, do esqueça o que está escrito? O que vai de encontro ao "vale o que está escrito" que encima as pules do Jogo do Bicho, contravenção penal que, ao que se sabe, nunca deixou de honrar o que está escrito e paga religiosamente os prêmios aos ganhadores. Se até os contraventores honram a palavra não faz o mínimo sentido não fazê-lo as autoridades públicas do país, em qualquer nível ou escalão.
O caso é o seguinte: em nome da propalada transparência, a Folha de S.Paulo solicitou ao governo federal que informasse os custos da Caravana da Fome, da ida do presidente e comitiva ao Fórum Mundial Social e das viagens internacionais de Lula da Silva e comitiva - a Quito, Davos, Berlim e Paris. Uma coisa corriqueira e normal, que deveria estar à disposição de todo mundo no sítio do governo federal na internet, principalmente num governo petista.
Coerência e ética
Não é nenhum bicho de sete cabeças fazer isso na internet, haja vista que o governo do Amapá já o faz há dois anos. No sítio, um link informa os custos de todas as passagens e diárias de servidores públicos do estado. Vale a pena o governo federal procurar saber os detalhes com a empresa estadual de processamento de dados do Amapá, para fazer o mesmo o mais rapidamente possível.
Voltando à solicitação da Folha, cumpre informar que até agora não foi atendida. O porta-voz André Singer tem postergado a informação, com a desculpa esfarrapada de que estão fazendo levantamento de todas as viagens presidenciais dos últimos 10 anos, isto é, de Itamar Franco e Fernando Henrique. Ora, o que a Folha quer saber é o custo das viagens do atual governo, só isso. Por que postergar a informação para compará-la a governos anteriores? Talvez seja para mostrar que estão gastando menos, mas isso não vem ao caso, pelo menos para a Folha. Adiar a resposta pode vir a ser um tiro no pé.
Ao tergiversar - o que a cartilha proíbe, assim como rodeios, evasivas e subterfúgios -, o governo vai de encontro ao que está escrito, que entre outras recomendações diz: "(?) A informação é um bem público, não é propriedade do governo; a informação é um direito, não um favor; a informação é um requisito básico para o exercício de outros direitos, como escolher, julgar, optar e participar (?)."
Um governo que tem como base um partido, o dos Trabalhadores, que no dia 10 completou 23 anos de coerência e ética não tem por que não fazer valer o que está escrito, principalmente porque foi escrito para pôr ordem no relacionamento com a imprensa, em nome da transparência tão preconizada durante a campanha eleitoral pelo presidente Lula da Silva.
* Jornalista

Comentários