Pobreza no jornalismo Argentino

Por Márcio Fernandes É no silêncio de uma redação de um jornal argentino que se percebe os efeitos da crise sócio-econômica que há meses …

Por Márcio Fernandes
É no silêncio de uma redação de um jornal argentino que se percebe os efeitos da crise sócio-econômica que há meses atinge o país vizinho. Por volta de 14h de uma tarde qualquer, mesmo um visitante estranho ao mundo da imprensa poderá notar o desânimo que se abate sobre repórteres, editores, fotógrafos, paginadores e outros profissionais que costumam perambular pela redação com alvoroço, condição sine qua non para que uma redação seja de fato verdadeira. No final de agosto passado, quando uma comitiva de estudantes e professores do curso de Jornalismo da Universidade Paranaense (Unipar) passou três dias na cidade de Posadas, a capital do estado argentino de Misiones, se pôde descobrir in loco a diminuição média de 30% nos salários dos jornalistas portenhos, as férias forçadas de alguns, sem direito a remuneração extra, e a violenta queda no número de anunciantes e de vendas de jornais.
Tome-se aqui o sintomático caso do El Território, o maior diário de Misiones. Acostumado a comercializar 30 mil exemplares por dia, a direção de El Território, um matutino com quase 80 anos de existência, tem autorizado nas últimas semanas a rodagem de apenas 8 mil cópias, rezando para que a tiragem não despenque ainda mais. Nas rádios de Misiones, estima-se que o custo das inserções publicitárias tenha baixado 50% nas últimas semanas. E as perspectivas não são positivas.
Mesmo o mais desatento dos visitantes de Posadas, Corrientes ou Puerto Iguazu, todas cidades do Nordeste argentino, uma das regiões mais pobres da nação platina, acaba notando as imensas filas de desempregados que se formam em frente às agências bancárias com freqüência a partir de 7h da manhã. É que, em determinados dias do mês, essa multidão aguarda pacientemente a abertura dos bancos para sacar uma espécie de abono anti-pobreza fornecido pelo governo federal. Para o leitor que, por ventura, considerar essa notícia um exagero, uma estatística a mais: dados divulgados em agosto atestaram que 2/3 da população da Posadas já está abaixo da linha de pobreza, conforme os padrões estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU). Pior: desse volume, 1/3 está em situação de miséria absoluta.

Alguém há de se perguntar: e o que isso tem a ver com o jornalismo? Na Argentina, a crise é uma só e atingiu a todos os segmentos da economia. É provável que, numa redação de jornal, rádio ou televisão de Posadas ou cercanias, ainda não seja possível encontrar jornalistas em estado de pobreza. Ainda.
* Professor de Jornalismo da Universidade Paranaense (Unipar), de Cascavel, SC. Colaboraram Gustavo Vidal, Henrique Netzlaff e Júlio César Santos, acadêmicos do 3º ano do curso.

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