Quando se discute
cultura
no Brasil e,
mais
especificamente,
leitura
, costuma-se
lembrar
que
o
país
conta
atualmente
5.560
municípios
, 5
mil
bibliotecas
registradas e 3.200
livrarias
.
Esses
números
dão
apenas
uma
visão
parcial
da complexidade do
problema
da
leitura
,
onde
o
público
não
tem
acesso
ao
livro
. As
causas
são
muitas, e
não
vamos enumerá-las
aqui
, indo de uma
recente
ditadura
que
durou
mais
de 20
anos
a uma
visão
histórica
que
busca
razões
no
processo
civilizatório
brasileiro
a
partir
dos portugueses.
Por
outro
lado
, o analfabetismo no Brasil atinge 16% das
pessoas
com
cinco
anos
ou
mais
, chegando a 24
milhões
que
não
sabem
ler
ou
escrever
.
Esses
números
do IBGE
são
recebidos
com
ceticismo
. Há
quem
diga
que
o
número
de
analfabetos
diminuiria de 5
milhões
,
caso
o
levantamento
fosse relacionado
com
pessoas
de
dez
anos
ou
mais
, ficando a
taxa
de
analfabetos
em
torno
de 11,5%.
Como
resolver
ou
,
pelo
menos
,
diminuir
esse
abismo
entre
o
público
e a
leitura
, seja
esse
público
o "
leitor
"
potencial
de
um
livro
ou
da
linguagem
audiovisual?
Novamente
as
receitas
são
muitas.
Muitos
estudiosos
dizem
que
as
soluções
passam
por
uma
melhor
distribuição
de
renda
, barateamento do
livro
,
mais
bibliotecas
e
mais
escolas
.
E
como
outros
países
em
desenvolvimento
estão tentando
resolver
esse
problema
? A
partir
desse
momento
, o
cenário
brasileiro
serve
apenas
de
moldura
para
discutir
as
medidas
tomadas
pela
China nesse
âmbito
.
Porque
dizer
que
a China tem 8,5% de
analfabetos
- tinha 25%
em
1986 - dá uma
visão
muito
parcial
,
já
que
110
milhões
de
analfabetos
na China precisam
ser
relacionados
com
a
população
de 1,3
bilhão
de
pessoas
.
O
feito
e o
por
fazer
A
partir
de 1986, a China tornou
seu
ensino
obrigatório
compulsório
, de
nove
anos
,
para
crianças
de
seis
a 14
anos
. O
que
pode
parecer
mais
estranho
é
que
esse
ensino
passou a
ser
compulsório obrigatório e
pago
. Muitas
famílias
de
áreas
rurais
não
tinham
recursos
para
pagar
a
escola
para
seus
filhos
provocando
evasão
escolar
e impedindo a
escola
universal
.
Só neste
ano
, 2006,
depois
de muitas
críticas
e
diversos
filmes
e
programas
de
televisão
tratando da
injustiça
no
campo
,
onde
as
crianças
tinham de
trabalhar
para
pagar
as
taxas
escolares
e, trabalhando,
não
podiam
estudar
, o
ensino
básico
passou a
ser
gratuito
na
maior
parte
das
áreas
rurais
.
A
partir
de
agora
,
com
o
novo
plano
econômico
para
os
próximos
cinco
anos privilegiando o
campo
, o
governo
central
vai
tratar
com
cuidado
essa
questão
. O
plano
a
ser
aplicado
em
regiões
do
interior
do
país
, criando uma
nova
área
rural
socialista
, foi apresentado há
alguns
meses, e o governo mostrou na
semana
passada
sua
receita de
como
levar
o
livro
ao
leitor
,
especialmente
esse
leitor
de
pequenos
vilarejos
,
onde
não
existem
bibliotecas
e
onde
a
iniciativa
privada
não
investe
em
livrarias
temendo
prejuízos
.
Esse
plano
é ambicioso.
Ele
pretende
criar
200
mil
livrarias-bibliotecas nas
suas
vastas
áreas
rurais
nos
próximos
cinco
anos
,
ou
seja, 3
mil
por
mês
,
durante
cinco
anos. "Cada
projeto
híbrido
, de
biblioteca
e livraria ao
mesmo
tempo
, terá
pelo
menos
mil
livros
, 30
tipos
de
revistas
e
periódicos
e
alguns
produtos
audiovisuais
", disse Liu Binjie, subdiretor da
Administração
Estatal
de
Imprensa
e Publicação da China na
quinta
passada
.
A China
tinha
divulgado na
quarta-feira
um
programa
nacional
sobre
o
desenvolvimento
cultural
durante
o
período
do 11º
Plano
Qüinqüenal (2006-2010).
Esse
plano
, divulgado
conjuntamente
pelo
Escritório
Geral
do
Comitê
Central
do
Partido
Comunista
da China e o
Escritório
Geral
do
Conselho
de
Estado
, dava ao
desenvolvimento
cultural nas
áreas
rurais
a
maior
prioridade
.
Segundo Liu, o
projeto
,
com
um
investimento
total
de
cerca
de US$ 506
milhões
, vai
promover
a
educação
e
popularizar
a
ciência
e a
tecnologia
no
campo
.
As livrarias-bibliotecas,
cada
um
com
um
orçamento
estimado
em
US$ 2.500,
serão
financiadas
pelo
governo
e
também
receberão doações públicas. "
Em
10
anos
", diz
ele
, "esperamos
que
cada
povoado
tenha
sua
própria
livraria-biblioteca". Os
valores
investidos
em
cada
unidade
parecem
pequenos
,
mas
deve-se
lembrar
que
um
bom
livro
para
crianças
, colorido,
que
no Brasil
custa
40
reais
, na China
custa
dez
vezes
menos
.
Ao
mesmo
tempo
, a China decidiu
investir
mais
nos
meios
de
comunicação
no
campo
. Se o
projeto
das
três
mil
livrarias-bibliotecas
novas
por
mês
até
o
ano
2011
já
contemplava a
oferta
de
produtos
audiovisuais
, o governo prevê
também
melhorias no
sistema
de
rádio
e de
televisão
para
agricultores
. A
iniciativa
visa
levar
melhores
sinais
de
televisão
aos
lugares
mais
remotos
do
país
e uma
maior
variedade
de
transmissões
de
programas
.
A
televisão
chinesa atinge 95% da
população
e o
rádio
tem aproximadamente a
mesma
taxa
de
penetração
. No
entanto
,
com
uma
população
tão
numerosa
, 5% significam 60
milhões
de
pessoas
sem
acesso
a
esses
meios
.
O
projeto
do
governo
chinês teve
início
em
áreas
mais
sensíveis
,
como
as duas
províncias
do
oeste
do
país
, Tibet e Xinjiang.
Em
outras
palavras
,
são
regiões
onde
existe uma
forte
busca
de
autonomia
,
com
o
governo
criando
administrações
especiais
,
que
recebem o
nome
de
regiões
autônomas.
Em
um
projeto
nessas duas
regiões
, o
governo
central
aplicou US$ 940
milhões
. Uma reportagem do China Daily informou na
semana
passada
que
só
em
2005 o
governo
investiu US$ 99
milhões
para
ajudar
a
população
de 86
mil
povoados
a
assistir
televisão.
O
governo
não
diz,
mas
isso
está
claro
,
com
a
televisão
e o
rádio
o
governo
central
pretende
integrar
culturalmente essas
regiões
no
grande
mosaico
que
é a China. Foi o
que
aconteceu no Brasil,
principalmente
nos
anos
70 e 80,
em
que
a
televisão
tornou-se uma
questão
de
segurança
nacional
e,
pela
primeira
vez
, o
único
sistema
de
comunicação
a
atingir
todo
o
país
, numa
única
língua
,
com
uma
mesma
voz
e, de
certa
forma
, os
mesmos
objetivos
,
ou
seja,
integração
econômica
e
integração
política
. O
sistema
de
televisão
chinês
não
se compara
com
o
sistema
brasileiro
, dadas as
características
de
cada
país
e os
modelos
de
comunicação
existentes. No
entanto
,
atingir
com
a
televisão
e o
rádio
os
mais
remotos
cantos
não
deixa
de
ser
uma
geopolítica
de integração.
Atualmente, muitas
pessoas
na China têm
acesso
aos
sinais
de
televisão
e de
rádio
,
mas
apenas
a
um
ou
dois
canais
e
assim
mesmo
chegando
com
baixa
qualidade
técnica
. O
projeto
Cuncuntong vai
tentar
resolver
esse
problema
, trazendo
serviços
de boa
qualidade
técnica
para
os
povoados
mais
distantes
.
Cerca
de 42
milhões
de
pessoas
, de
mais
de 300
mil
povoados
,
vão
ser
beneficiados
com
esse
projeto.
Rumo do futuro
Uma das
diferenças
entre
os
projetos
propostos
em
outros
países
e
jamais
executados é
que
na China
só
se anuncia o
projeto
quando
ele
já
foi
aprovado
. Significa
que
ele
já
está
em
movimento
.
Que
tem financiamento garantido.
Atores
escolhidos. Essa é uma das
virtudes
ou
defeitos
de
governos
muito
centralizados.
Se o
Escritório
Geral
do
Comitê
Central
do
Partido
Comunista
da China e o
Escritório
Geral
do
Conselho
de Estado anunciam 200
mil
bibliotecas
,
serão
de
fato
200
mil
.
Claro
, às
vezes
há
falhas
,
como
no
anúncio
de
que
no
ano
passado
a
poluição
deveria
ser
reduzida e as
estatísticas
mostraram o
contrário
. Mesmo nesse caso, outras
providências
são
tomadas
,
como
fazer
entrar
nos
requisitos
de
ascensão
profissional
de
funcionários
na
área
de
meio
ambiente
seus
êxitos
ou
fracassos
no
combate
à
poluição
.
Diante
desse
controle
,
certamente
as 200
mil
bibliotecas
estarão funcionando
dentro
de
cinco
anos.
Certo, a China pode
fazer
isso
porque
não
sabe
onde
aplicar
os
bilhões
de dólares de
suas
reservas
e os
novos
bilhões
de
seus
superávits
crescentes
do
comércio
internacional
.
Engano
.
Ela
sabe
muito
bem
o
que
fazer
com
esses
bilhões
. Uma
parte
deles será aplicada nessa
integração
pela
leitura
e
pelos
meios
de
comunicação
,
dentro
de
um
projeto
maior
, o de
construir
uma
grande
China,
depois
de
um
século
de
humilhações
nas
mãos
das
potências
ocidentais.