Sapatinho na janela do quintal

Por Márcia Fernanda Peçanha Martins* Não fosse pelo nascimento de minha filha, no início do mês, dezembro poderia ser classificado como a época de …

Por Márcia Fernanda Peçanha Martins*
Não fosse pelo nascimento de minha filha, no início do mês, dezembro poderia ser classificado como a época de se rever a vida, repensar o presente, replanejar o futuro, deixar a emoção tomar conta de nós novamente nas festas natalinas. E quem disse que adulto não pode se emocionar? O período é propício para aflorar os sentimentos, mesmo aqueles mais escondidos no fundo do coração ou trancafiados a sete chaves no baú da memória. Nos primeiros sintomas de que existe algo diferente no ar, a gente até que resiste, faz que não vê as luzes piscando nas árvores, que desconhece porque tanto apelo do comércio para vender e porque as ruas e os shoppings estão sempre lotados de pessoas com aspectos mais estressados do que o normal.
Mas nem mesmo o século XXI, as guerras infames, a matança no Iraque, os jornais repletos de notícias trágicas, foram suficientes para embrutecer definitivamente o nosso coração. Ainda trazemos esperanças de melhorar o mundo, utopia ou não da geração dos anos 60, e deixemos que a emoção contida nas festas de final de ano nos contamine também. Experimente. Abra seu coração e deixe a alegria entrar. Tire de dentro do armário aquela criança que, às vezes, timidamente, lhe espia enquanto você dorme depois de mais um dia cansativo.
Por favor, permita-se momentos de ternura e felicidade. Comece com algo bem simples e infantil: coloque o sapatinho na janela do quintal. Diz a lenda que o Papai Noel só deixa os presentes para aqueles que se comportam e que acreditam na estória do sapatinho. Faça isso. Quem sabe, ao invés de um presente, o bom velhinho não deixa dentro do seu sapatinho um pequeno e eficiente sopro de esperança para que você possa acordar a cada novo dia de 2005 com uma vontade inexplicável de transformar o impossível. E fé, para que você não desanime quando, apesar dos esforços empreendidos, não conseguir mudar o impossível.
Tente montar uma árvore de Natal, não importa o tamanho, ou um presépio. Faça tudo com muito carinho e coloque muito amor em cada enfeite que pendurar na árvore. Pode ser que na noite de Natal o velhinho de barba branca não tenha recebido o suficiente para encher a árvore de presentes, mas quem sabe não faça a casa repleta de familiares e entes queridos. Recorde-se de outros Natais, lembre-se dos presentes mais originais, do familiar fantasiado de Papai Noel para enganar as crianças, da cereja furtada disfarçadamente antes da Ceia. Se não for possível segurar as lágrimas, chore.
Se você pensa que pode ser taxado de ridículo por mandar cartões de Natal aos amigos, ou e-mails, que é mais fashion, engana-se. No fundo, no fundo, ao receber um cartão de Natal, recebemos um sinal de que somos lembrados. De que temos amigos. De que somos importantes. De que para aquela pessoa, nós fazemos a diferença. De que nem sempre erramos nas nossas atitudes. De que temos sensibilidade e, principalmente, sabemos cultivar os amigos, mesmo aqueles que pensamos que nem se lembram mais de nós. Evite arrepender-se pelo que deixou de fazer. É sempre melhor arrepender-se pelo que você fez, certo ou errado.
Como já estamos um pouco grandinhos, não vamos escrever uma carta para o Papai Noel e mandá-la para o Pólo Norte, que está sempre com trânsito cheio nesse período. Mas, podemos, como diz a música do Osvaldo Montenegro - que voltou a ser cult na série os Aspones - fazer uma lista dos nossos amigos. Aqueles que você não vê há muito tempo, aquele que tomou um porre fantástico com você em algum bar da Cidade Baixa, aquele que lhe mandou um e-mail safado, aquele que está sempre telefonando e buscando manter o relacionamento. Faça uma lista dos seus amigos e ao lado do nome de cada um, escreva um desejo de que algo bem bom lhes aconteça.
Por fim, pense naqueles que já partiram e que você queria tanto que estivessem ali ao seu lado na noite do Natal. Nos mais próximos, que fazem falta sempre, em qualquer ocasião, seja de alegria ou de tristeza. Naquele familiar que sempre era o mais animado na abertura dos presentes e hoje não está mais nesse mundo. Tenha certeza de que se ele foi muito importante para você, ele estará sempre guiando seus passos, seu coração, sua vida, sua prosperidade e iluminando seus caminhos. E lembre-se da letra da música dos Titãs: "Devia ter amado mais, ter chorado mais, ter visto o sol nascer, devia ter me arriscado mais e até errado mais, ter feito o que eu queria fazer". Ainda há tempo.
* Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela PUCRS, trabalhou no Jornal do Comércio, Zero Hora e hoje atua em assessoria de comunicação social.
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