Tempos difíceis para a mídia

Por Iraguassú Farias para Coletiva.net

Rupturas na normalidade institucional não são novidades no Brasil. Depois de 1985, quando os militares deixaram o poder, terminaram mandato FHC, Lula e Dilma, uma vez. Tancredo nem assumiu. De vices assumindo, vi três: Sarney, Itamar e Temer.
Nestes processos todos, em que se envolveram, mais ou menos, os poderes da República, aquele que não é reconhecido, o quarto, interferiu sempre. Ou como instigador, ou como defensor. Refiro-me às grandes redes, detentoras que são de concessões públicas, e que ou elegem ou derrubam governantes a seu sabor. Não que seja um privilégio do nosso País, mas o alinhamento ou não com o governante de plantão implica em algumas mazelas.
Tanto quanto dos atores da dança das cadeiras, igualmente é fácil lembrar expoentes em meio a elas, que, em que pese seu desempenho profissional, encarnam ou são depositários da ira ou incensamento da população. Refiro-me aos jornalistas.
Minha memória não me permite ir muito longe, eis que não afeto ao mister jornalístico, mas como não lembrar de um jornalista gaúcho - Brito, anunciando a morte de Tancredo? Cid Moreira no JN. Alexandre Moreira e Figueiredo e mais recentemente Bonner, Boechat e outros que jantam conosco trazendo, atualmente, o que há de mais horrendo na politica nacional, para falar apenas da telinha.
Ah, o Jornalismo? E aqui, razão do texto, fica a pergunta: afinal, o jornalista quando obedece ao mando do patrão desfigura-se? Há dois tipos de "credibilidade"? Uma do patrão, outra do profissional?
Creio que, em outras atividades, empregado obedece e pronto. Pelo menos me mostra a minha experiência. Mas e na imprensa, onde o profissional muitas vezes é o responsável pela excelência - ou não, do veículo e grande partícipe na construção da audiência?
Cá entre nós: deve ser um parto de bigorna enfrentar esta situação. E a mudança de rumo? Imagine um âncora qualquer da TV Globo, apenas para exemplificar, num final de noite noticiando algo desabonador sobre um mandatário, e no dia seguinte, por razões que a vã filosofia vai sim explicar, ter de mudar completamente o enfoque? Volta pra casa e encara a mulher e filhos como? E os colegas?
Sejamos claros, então: em um dia a norma é incensar e impulsionar a reputação de Michel Temer. Dias depois, é para arrebentar com ele.
Sei que me faço entender. E sei que o povo, o leitor, ouvinte, ou telespectador, também entende. Mas já acha normal.
Mal comparando, é mais ou menos como o aluno ouvir em um dia que Duque de Caxias foi um herói nacional. E no outro, que foi chamado de Caxias, o terrível dizimador (parece que a figura de expressão nem é tão irreal assim). Mas pensa chegar em casa e falar para o pai coisas tão antagônicas.
É mais ou menos como vejo o cenário atual: uma confusão que perpassa o Jornalismo e que faz com que os porta-vozes do noticiário, que deveriam nos informar, estão a nos dizer subliminarmente: "olha, o que eu falei ontem, não vale mais. Vale o de hoje, que é fruto de novas investigações e do aumento de 1069% na verba publicitária que recebemos".
Ou o contrário: aquela empresa, aquela pessoa, sabe?não era bem assim. Patrão falou que cortaram a verba publicitária, então?.sinto muito".
Haverá vozes discordantes. Serei criticado. "Nem jornalista és", dirão. Mas acho que conheço um pouco da alma humana para inferir que muitos excelentes profissionais de imprensa estão nestes dias submetidos ao terrível embate que muitas vezes vimos na figura de alguém, com dois símbolos, um em cada ombro a lhe infernizar o ouvido, dizendo um: "fala!". E o outro: "cala a boca".
Não queria estar na pele de alguns. Ficando só observando, não serei grampeado, não serei conduzido coercitivamente, não precisarei pedir 18 mil por mês e não precisarei ler no teleprompter de uma forma que meu rosto pareça o do Papa Francisco ao lado de Trump.
Iraguassú Farias é diretor Comercial do portal Coletiva.net (www.coletiva.net)

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