Tempos fantásticos

Por Andréia Castiglia Fernandes, para Coletiva.net

Quando iniciei minha jornada nas salas de aula da Administração e da Publicidade e Propaganda, havia uma situação que eu provocava e percebia a inquietude que causava nos alunos. Eu dizia que uma empresa ou instituição só deveria se instaurar como tal se tivesse, em sua essência, o propósito de melhorar o mundo.
Isso incomodava os alunos. Eles, provavelmente, trabalhavam em locais que não ousavam, nem de longe, possuir essa diretriz. Os olhinhos desses alunos eram intrigados e desconfiados. Porém, bastavam algumas aulas para que eles pudessem perceber do que realmente tratava esta minha provocação.
Eu falava de qualidade, de atendimento, de momento da verdade das empresas com seus consumidores e clientes. Falava, principalmente, de verdade e de relações duradouras.
O tempo foi passando e, com ele, as dinâmicas sociais, econômicas e culturais vêm se modificando. E de uma forma bastante rápida percebemos que as pessoas se tornam colaborativas e criativas. Nossas prioridades de vida seguem sendo alcançar sucesso, viver bem com mais conforto e com qualidade, mas passam por atitudes, por caminhos um pouco diferentes do que, por vezes, fizeram nossos pais e avós. Exigimos mais, pois estamos evoluídos.
Exigimos qualidade nas relações que devem sustentar reciprocidade, e, então, a palavra PARCERIA se sobressai no mundo empresarial. Exigimos respeito e dignidade e, por consequência, as palavras DIVERSIDADE e DIFERENÇAS são abordadas pelas empresas que, inclusive, passaram por grandes reposicionamentos de marca. Exigimos vínculos com nossos valores mais íntimos e fizemos com que as empresas trabalhassem suas missões e seus valores para adequar seus discursos aos nossos, pessoais, para fazer por nós o que sozinhos não seria possível. Situações estas que ficam claras quando vemos as causas que as empresas e suas marcas vêm se esforçando em defender.
Tudo isto só foi possível porque nós modificamos. O marketing é consequência.
Estamos no grau mais elevado de desenvolvimento de nossa espécie humana, o qual chamamos de Era da Sociedade Criativa. Fazer parte dela é permitir usar o lado direito do cérebro e produzir inovações, tecnologia e novos conceitos. Somos uma sociedade que usa mídias sociais e influencia os outros (cuidemos esta grande responsabilidade!). Criticamos marcas que impactam negativamente a vida das pessoas e exaltamos as que solucionam os problemas dos outros.
A humanidade já passou pelo trabalho braçal, usando, praticamente, seus músculos (desde os primitivos até os agricultores), já vivenciou estrategistas e executivos que usam o lado esquerdo do cérebro e agora nos percebemos conduzindo nossos filhos e netos para formações artísticas, musicais e criativas, explorando ao máximo seus potenciais para que se desenvolvam de forma plena. Isso mudou, visto que grandes artistas que, hoje, são consagrados por sua arte, tiveram que fugir de suas casas, quando jovens, para apostar no que eles realmente acreditavam. Eram considerados desajustados ou até preguiçosos por escolherem o lado criativo e não o "jeito certo de trabalhar e viver".
Vemos que estas experiências são fantásticas e vemos a sociedade começando a trabalhar e a viver dignamente como artistas, cientistas, criativos. Pessoas criativas acreditam na autorrealização, no espírito humano, na moralidade e tentam aperfeiçoar a si mesmas e ao mundo a sua volta.
Temos a Economia Compartilhada provando novos caminhos. Temos serviços fantásticos que, há muito pouco tempo, eram incompatíveis ao nosso modo de pensar: carros compartilhados para viagens curtas, casas compartilhadas que podem ser alugadas em todo o mundo. Podemos ser cuidadores de cães por alguns dias. Isso tudo gerando renda e resolvendo dores dos outros. Isso causa empoderamento. Isso é mágico e está apenas no começo.
Uso Kotler para esclarecer: "Como as pessoas criativas, as empresas devem refletir sobre sua autorrealização além dos objetivos materiais. Precisam entender quem são e por que estão no negócio. Precisam saber o que querem ser".
Ressalto que os recursos buscados por essa nossa sociedade, por cada um de nós, os que já têm consciência, e os que ainda não estão conscientes disso, são os recursos espirituais que, segundo Zohar, em Capital Espiritual, significam a "valorização dos aspectos não materiais da vida e as sugestões de uma realidade duradoura".
Agora, questiono: estamos ou não caminhando neste sentido real de responsabilidade em melhorar o que está a nossa volta? Tem sentido uma empresa que foca em produção e esquece as dores do seu cliente? Tem sentido uma empresa incorporar valores de boa cidadania corporativa e não praticar no cotidiano de seus negócios?
Meu discurso é positivo. Minha fala é animadora, mas não descolada da realidade que assusta a nós, brasileiros. Uma realidade que parece impor desonestidade e corrupção. Acredito que seja exatamente através da exposição destas duras verdades que conseguiremos transpor os graves problemas que nos assolam diariamente. Enquanto não houver conhecimento do tamanho dos equívocos de nosso País, não será possível superá-los. E falo de criatividade exatamente para suscitar essa superação.
É muito possível fazer deste lugar um mundo melhor. Basta fazer o que vocês aprenderam e exercitaram durante o tempo que dedicaram a esta formação profissional.  Basta fazer diferente do que está errado. Basta não ter medo do que vibra dentro de cada um de vocês, meus queridos, como sendo o certo para si próprio e para o seu entorno.
Sigo convocando cada um dos meus alunos a continuar este ciclo virtuoso que se inicia nesta era e que valoriza muito além da qualidade total. Eu convoco para que em cada negócio, em cada gestão que estiverem, plantem a semente da colaboração. Votem em confiar no outro. Acreditem no que ainda não existe. Perpetuem dignidade. Iniciem processos que valorizem os outros e colham os prósperos retornos dignificados que as suas carreiras vão prover.
Enquanto eu puder estarei bradando aos quatro ventos para que nunca tenham medo de fazer diferente, pois o mundo não é mais o mesmo. Nós não somos mais os mesmos. E o mundo espera novas ações de profissionais de futuro, de forma cada vez mais urgente.
Andréia Castiglia Fernandes é coordenação de Publicidade e Propaganda da Faculdade São Francisco de Assis.

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