TV Digital: incrível, vai ter mais um round!

Por Roberto Andrade O que foi dado como certo pela Folha de S. Paulo e repetido pela Globo, Band, Record, SBT, Radiobras, Portal Terra, Globo.Com, …

Por Roberto Andrade

O que foi dado como certo pela Folha de S. Paulo e repetido pela Globo, Band, Record, SBT, Radiobras, Portal Terra, Globo.Com, Uol, IG e quase toda a imprensa, não aconteceu. O anúncio a ser feito na última sexta-feira relativo à adoção do sistema japonês de TV Digital como o escolhido para ser implantado no Brasil não ocorreu.

Não ocorreu por muitos motivos. O principal deles é a força do adversário. É como no boxe. O sujeito entra seguro, preparado, favorito. Bate forte nos 4 primeiros rounds e o adversário não cai. No quinto round, já meio desatento e cansado, toma um cruzado de direita. E cambaleia. Hélio Costa, a Globo e a grande corporação das redes de TV e rádio cambalearam. E os adversários são fortes: Nokia, Philips, Siemens, STMicroeletronics, Rohde&Schwarz e Thales. Só peso-pesado.



Estas empresas formam a "Coalizão DVB Brasil - Sistema Brasileiro, Padrão Mundial". É uma pedra no sapato de quem achava que os japoneses já tinham liquidado a fatura. Estes grupos, também cheios de interesses comerciais, estão ligados às grandes corporações de telecomunicações (telefonia fixa, internet e celular). E, neste momento, recebem o apoio de mais de 100 entidades, organismos e ONGs, cobertas de bons propósitos políticos, que exigem do presidente Lula uma discussão pública sobre a TV Digital no Brasil. Surpreendentemente, conseguiram trancar o processo, aos 49 minutos do segundo tempo.

O sistema DVB (Digital Video Broadcast), chamado de "sistema europeu", já foi adotado em mais de 50 países e, em alguns mercados, teve finalizada a migração total ao sistema digital. É um sistema aberto, que desobriga o País a se atrelar a interesses específicos dos detentores de patentes. Tem um vínculo internacional com comunidades acadêmicas e científicas, várias delas no Brasil. É o único padrão convergente com a TV digital por satélite e a TV digital no cabo, já implantadas no País, o que já significaria diminuição de custos para sua implantação.

Mas o golpe final, o nocaute nas intenções vencedoras do sistema japonês, veio de forma inequívoca do Palácio do Planalto, pelas mãos da ministra Dilma Roussef. Ela nunca sentiu-se à vontade com a movimentação política que seu colega Hélio Costa, das Comunicações, fazia junto ao staff de lobistas japoneses e representantes das redes abertas de TV, em especial da TV Globo. Para azar do antiquado grupo dos radiodifusores, Hélio Costa deu a luta como encerrada, vencida.
Chegou um dia a ridicularizar o próprio presidente, ao dizer que botaria a bola na marca do pênalti e Lula escolheria entre fazer um gol, chutar na trave ou errar feio. Foi prepotente. E vai pagar por isso. Estas empresas majors que formam o sistema Coalizão DVB Brasil, reuniram-se também a portas fechadas com a ministra Dilma e passaram a ela, ministros e assessores muito próximos do presidente, alguns números impressionantes.

Por exemplo, adotando o sistema DVB, a coalizão propõe apoiar uma estrutura industrial no País para explorar um mercado de 80 milhões de set top boxes (as caixinhas que vão adaptar as tevês analógicas ao sistema digital) para serem exportadas somente para a América Latina. Uma projeção de 26 bilhões de dólares em receitas para o País, somados à criação de 32 mil novos empregos. Além disso, as empresas que formam a coalizão já atuam no Brasil, geram mais de 20 mil empregos e possuem 30 unidades de pesquisa tecnológica.

Os principais argumentos usados pelo ministro Hélio Costa para descartar o sistema europeu era o fato dele funcionar "em canais de 8 Megahertz, enquanto o Brasil padronizou o uso em 6 Megahertz". E, ainda, que "o sistema japonês tem melhor desempenho em todas as aplicações, fixas, móveis e portáteis". Os defensores do modelo europeu contestaram com rigor as afirmações do ministro, uma a uma. E trouxeram à tona debates essenciais, como a democratização dos modelos de negócio que vão surgir e a responsabilidade social e cultural que deve existir no novo universo de mídias digitais.

A tarde da última sexta-feira, que deveria ser de alegria e comemorações para o ministro Hélio Costa, TV Globo, SBT, Record, Band, Rede TV e suas afiliadas, além dos japoneses, terminou com o gosto amargo de um pedido de "novo prazo" feito pelo Comitê que debate o assunto, formado por vários ministros e assessores especiais do primeiro escalão do Governo. Entre eles o próprio Hélio Costa que, com seu tradicional sorriso amarelo, afirmou aos jornalistas que este novo prazo será "curto". E que "o governo está convencido de que o padrão japonês ISDB é o melhor".

A diretora de Telecomunicações da TV Globo, Liliana Nakonechnyj, em carta enviada à imprensa - também na sexta-feira - bateu forte na apresentação e nos testes abertos feitos pelo padrão europeu DVB em São Paulo na semana passada. Ela afirma que o sistema DVB "não tem robustez", e que "sua configuração torna obrigatório o uso de antenas externas para que as pessoas possam ver televisão em suas casas, e as imagens ficam congeladas caso o liquidificador seja ligado". E concluiu: "O DVB impõe limitações na qualidade e na variedade do que o cidadão pode receber gratuitamente e impossibilita o acesso grátis à mobilidade".

Se fosse resumir para vocês o sentido de toda esta briga, usaria um conceito muito simples. As tevês querem ter seus sinais digitais de alta resolução transmitidos diretamente para aparelhos fixos ou móveis (celulares), para poderem continuar vendendo e faturando sozinhas um mercado gigante, que rapidamente chegará a 200 milhões de usuários. As empresas de telecomunicações querem que o sinal das TVs passem por elas, para vender e faturar junto, criando novos paradigmas e modelos de mercado. Esta é a luta, amigos, ainda sem vencedores.

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