O samba de Marielle

Por Cris De Luca

Sim, vocês não leram errado. Nem terminou o segundo turno das eleições e já estamos falando de Carnaval. Sim, vamos falar de samba, mas não um samba qualquer. Neste final de semana, fez sete meses que a vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes foram assassinados no Rio de Janeiro. O tempo passa voando e até agora não se prendeu nenhum suspeito pela morte deles. Há poucos dias, saiu uma notícia que teriam identificado o tipo físico do assassino. E só.

Também foi neste domingo que aconteceu um ato na Cinelândia para repor a placa com o nome da vereadora que foi arrancada por dois até então candidatos do PSL, hoje deputados eleitos, às vésperas do primeiro turno das eleições e exibida quebrada durante um ato de campanha ao lado do candidato ao governo do Estado do Rio de Janeiro pelo mesmo partido. Foi uma das cenas que mais me fez cair em mim durante esse período eleitoral tenso que estamos vivendo. A destruição de uma sinalização simbólica pelo assassinato de alguém e que comoveu o País, sendo usada de certa forma como troféu.

Acho que mexe comigo e com tantas outras pessoas, porque a gente ainda lembra o momento quando leu a notícia sobre a morte da Marielle. Eu, por exemplo, tinha acabado de chegar em casa do show da Kate Perry, sem bateria alguma no celular e quando abri o Twitter fui inundada por um sentimento de profunda tristeza e descrédito na humanidade. Escrevi sobre isso por aqui (https://bit.ly/2EnmBUM). E ontem o que inundou meu coração foi ver nas redes fotos lindas com mais de mil pessoas segurando novas placas simbólicas numa manifestação pacífica no mesmo lugar onde a outra foi destruída e o clipe do samba da Mangueira recém-escolhido.

"Mas, Cris, o que é que tem a ver samba e Carnaval com tudo isso?" Tem a ver, sim, porque também foi neste final de semana que a Estação Primeira de Mangueira escolheu o samba que vai levar para a Sapucaí em 2019. O enredo 'História pra ninar gente grande', do carnavalesco Leandro Vieira, tem samba de autoria de Deivid Domênico, Tomaz Miranda, Mama, Marcio Bola, Ronie Oliveira e Danilo Firmino, e vai contar o lado B da história do Brasil com outras versões para feitos atribuídos a personagens como Pedro Álvares Cabral, Princesa Isabel, Dom Pedro I e Marechal Deodoro. E também faz uma homenagem a Marielle Franco e tantas outras mulheres. 

O clipe apareceu na minha timeline logo cedo no domingo com o compartilhamento de um amigo carioca que conhecia Marielle de perto e começa com uma menina linda cantando versos como "Brasil, meu nego / Deixa eu te contar / A história que a história não conta / O avesso do mesmo lugar / Na luta é que a gente se encontra / Brasil, meu dengo / A Mangueira chegou / Com versos que o livro apagou / Desde 1500 / Tem mais invasão do que descobrimento / Tem sangue retinto pisado / Atrás do herói emoldurado / Mulheres, tamoios, mulatos / Eu quero um país que não está no retrato". Desde ontem, eu devo ter escutado uma dúzia de vezes, me arrepiei e chorei em cada uma delas. Acho que foi a junção do momento que estamos vivendo no País, angústia e medo com meu coração verde e rosa. Mas uma coisa é certa, esse samba na avenida sendo cantado por milhares de vozes vai ser das coisas mais emocionantes da vida. E, se tudo der certo, estarei presente por lá. Para quem ainda não viu, cá está: https://bit.ly/2NIn6Iv. Salve a Mangueira! Marielle, presente!

Autor
Jornalista, formada pela Universidade Federal de Santa Catarina, especialista em Marketing e mestre em Comunicação - e futura relações-públicas. Possui experiência em assessoria de imprensa, comunicação corporativa, produção de conteúdo e relacionamento. Apaixonada por Marketing de Influência, também integra a diretoria da ABRP RS/SC e é professora visitante na Unisinos e no Senac RS.

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