Somente para os seus olhos

      Richard Nixon viu adiada por mais de uma década sua vez de prejudicar o país porque se deu mal no primeiro debate eleitoral da …

img src="fotos/coluna_eliziario_06_08.jpg" align="right" border="1">      Richard Nixon viu adiada por mais de uma década sua vez de prejudicar o país porque se deu mal no primeiro debate eleitoral da história transmitido pela TV. Enquanto John F. Kennedy preparava-se para o confronto com a ajuda de especialistas em marketing político, Nixon concedia a ele a importância de uma escala no boteco. Kennedy ampliou a vantagem graças ao bronzeado adquirido durante a campanha na Califórnia. Usou pouquíssima maquiagem, o que lhe deu um ar mais natural. Ao tentar fazer o mesmo, Nixon expôs sua palidez e ainda deixou à mostra a marca da barba por fazer. Quem acompanhou pelo rádio deu vitória a Nixon. Os telespectadores ficaram com JFK que, ainda por cima, era muito mais bonito. Sabe-se lá o que poderia ter acontecido se coubesse a Dick Vigarista fazer o jogo do sério com Nikita Kruschev durante a Crise dos Mísseis. Kennedy dificilmente sobreviveria à maldição do clã. Um resultado inverso talvez apenas antecipasse Watergate.
      Os políticos brasileiros sabem o quanto a TV é decisiva nas campanhas. No começo era mais fácil. Aparelhos em preto-e-branco e com tela pequena os mantinham a distância relativamente segura no corpo-a-corpo eletrônico. Com o surgimento da TV em cores, tiveram de aprender a mentir sem corar. As tomadas cada vez mais fechadas os levaram a exibir preocupação de debutante com a roupa, o cabelo e a maquiagem. Os aparelhos de tela grande ampliaram as armadilhas do close, que também lhes subtraiu boa parte do gestual. A popularização do formato wide screen ainda levará tempo, mas possivelmente representará a redenção dos braços estendidos, recurso fundamental para mostrar ao eleitor o tamanho das promessas.
      Debates na TV não mostram necessariamente quem é o melhor candidato, mas qual candidato é o melhor na TV. Um bom desempenho pode transformar um amontoado de idéias estapafúrdias ou apenas razoáveis em um grande programa de governo, enquanto uma interpretação ruim faz plataformas consistentes soarem pífias. Não é necessário ser bonito para brilhar na tela, mas tem de ser convincente. Gerard Depardieu nunca precisou submeter-se ao bisturi para ser aclamado como ator de primeira linha.
      No mundo do cinema é senso comum que ninguém salva um mau roteiro. No palco político assistimos todos os dias a maus roteiros nas mãos de protagonistas que fazem o Alexandre Frota parecer ator. A TV expõe as fragilidades do texto e a falta de capacidade do elenco, por isso o longo histórico de agressões e baixarias. Ingrid Bergman seduzia as platéias apenas com um olhar. Uma atriz-e-modelo tem de tirar a roupa para prender a atenção do público.
Dedicado a Deonísio da Silva
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Autor
 Eliziário Goulart Rocha é jornalista e escritor, autor dos romances Silêncio no Bordel de Tia Chininha, Dona Deusa e seus Arredores Escandalosos e da ficção juvenil Eliakan e a Desordem dos Sete Mundos.

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