O fim do homenzinho verde

Há água em Marte, mas congelada. Quer dizer, o Homenzinho Verde com Antenas jamais tomou banho. Ou será que desenvolveu uma tecnologia sofisticadíssima para …

Há água em Marte, mas congelada. Quer dizer, o Homenzinho Verde com Antenas jamais tomou banho. Ou será que desenvolveu uma tecnologia sofisticadíssima para derreter o gelo? Ou inventou uma pílula? Dependendo da dose, o Homenzinho Verde com Antenas faz uma meia-sola ou toma um banho de noivo, em que até as antenas saem brilhando. É sabido que os alienígenas são muito mais inteligentes que nós.



Ou, vai ver, o Homenzinho Verde com Antenas é um ser que não necessita de banho, uma espécie de francês aperfeiçoado. Ou é um réptil que troca a pele de tanto em tanto. Sempre achei suspeita a cor verde e a falta de roupas.



Mas, enquanto penso nessa questão fundamental, meu temor cresce: e se o Homenzinho Verde com Antenas não existe? Se os alienígenas forem apenas protozoários, amebas, germes, bacilos, enfim, esse povinho invisível a olho nu? Vai ser uma tremenda decepção, isso vai. Mesmo que esses alienígenas sejam uma ameaça terrível, uma ameaça que não tem antibiótico ou vacina que resolva, vai ser uma decepção. Sem tentáculos, sem dentes de tiranossauro, sem urros e babas, sem uma maldade de chinês de antigos folhetins não tem graça nenhuma.



O rugido do coelhinho



Os críticos não julgam Paulo Coelho pelos padrões do Paulo Coelho, segundo declarou Paulo Coelho em entrevista. Paulo Coelho escreve no presente, os críticos no passado, um passado de várias décadas. Como andei ocupado com um monte de besteiras, como de hábito, não li nem Paulo Coelho nem os críticos dele. Por isso não vou meter meu instrumento de tomar sopa nesse assunto. Apenas gostaria de dizer que eu, se fosse o Paulo Coelho, teria dito que os críticos tinham razão e continuaria vendendo, sossegado, milhões de livros. Ao estrilar, ele mostrou que se leva a sério, coisa que deve ter causado boas gargalhadas nos críticos.



Bush



Bush falou grosso contra a invasão da Geórgia. Que falta fez o Bush na invasão do Iraque.



Fantasias antropomórficas



Se o alienígena, por mais esquisito que seja, tem cabeça, tronco e membros, ainda podemos confiar na criação. Mas se for, como indica a lógica mais baixa, uma gelatina, inteligente ou não? Vai ser mais duro de engolir do que o parentesco com o macaco. Nós, como os maus fotógrafos, projetamos nossa sombra sobre o que fotografamos.



Limites muito legais



STF limita o uso de algemas às brincadeiras eróticas. STF limita o uso de isca artificial à pesca de peixes pequenos. STF limita o uso de alvejante na lavagem de colarinhos brancos. STF limita o uso de imagens de prisões se o bandido não recebe o devido cachê. STF limita escuta à voz interior e a murmúrios de fontes cristalinas.  STF limita os contratos às letras pequenas e, antes que seja tarde, limita a vida após a morte a sessões do copo.



David Lynch



Pelo que vi, o livro de Lynch foi uma decepção - como pensador o cara é um cretino em tamanho natural. Sob a decepção, se agita uma velha estranheza: como alguém pode ser um grande artista com apenas dois dedos de testa? As armas da criação e as do raciocínio não são as mesmas, vide Almanaque Capivarol. George Simenon, capaz de escrever obras-primas como Neve suja, Os fantasmas do chapeleiro e O gato em dez ou doze dias cada uma, levou quase dois meses pra alinhavar uns lugares-comuns sobre Balzac para uma palestra. Aldous Huxley, autor de ensaios deslumbrantes, como romancista chega a ser constrangedor, fora numa que outra sátira. Mais raro são os casos de escritores que manejam todas as armas, como Jorge Luis Borges, por exemplo.



Prejuízo



Sindicato dos coveiros entra com liminar contra a lei seca.


Autor
Ernani Ssó se define como ?o escritor que veio do frio?: nasceu em Bom Jesus, em 1953. Era agosto, nevava. Passou a infância ouvindo histórias e, aos 11 anos, leu seu primeiro livro sozinho:Robinson Crusoé. Em 1973, por querer ser escritor, entrou para a Faculdade de Jornalismo, que deixou um ano depois.  Em sua estréia, escreveu para O Quadrão (1974) e QI 14,(1975), publicações de humor. Foi várias vezes premiado. Desenvolve projetos literários para adultos e crianças.

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