O sono do templário

Não longe da efervescente Fleet Street, em pleno centro financeiro da City, o Viajante fica diante de um daqueles intrigantes enigmas de Londres. No …

Não longe da efervescente Fleet Street, em pleno centro financeiro da City, o Viajante fica diante de um daqueles intrigantes enigmas de Londres. No silêncio austero da belíssima Temple Church, um antigo templário dorme o sono dos séculos. Seu nome é William Marshal, que certa vez foi descrito como o "mais nobre cavaleiro que já viveu na Inglaterra".

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William Marshal começou por baixo e chegou a ser um dos homens mais influentes de seu tempo. Se alistou para ingressar na Cruzada dos Reis do papa Gregório VIII. Entretanto, Ricardo Coração de Leão decreta que ele deve permanecer em Londres, como conselheiro da Coroa. E enquanto os cruzados guerreavam na Terra Santa contra os poderosos exércitos de Saladino, William Marshal se empenha em mediar os conflitos entre o Rei João e os barões rebeldes do Norte. Em janeiro de 1215, finalmente acontece o encontro dos barões com o Rei João. O histórico evento tem lugar na nave redonda da Temple Church, uma réplica fiel da igreja do Santo Sepulcro, em Jerusalém. Iniciavam-se então as negociações que culminam com a assinatura da Magna Carta.
Como prêmio ao valor demonstrado longe dos campos de batalha, William Marshal ganha o privilégio de ser sepultado na cripta da Temple Church, reservada apenas para os Cavaleiros Templários mortos em combate.
Mas, ao longo dos anos, os cruzados da Temple Church não desfrutaram de um sono tranquilo, perturbado que foi por frequentes guerras e desastres. No século 14, a Ordem dos Templários é extinta e seus membros são perseguidos, presos e martirizados. A Coroa britânica confisca seus tesouros e toma posse dos santuários e igrejas.

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Em 1666, o centro histórico de Londres é destruído por um grande incêndio. Centenas de prédios emblemáticos, como a grande Catedral de Saint Paul e a igreja gótica de St. Bride, ficam seriamente danificados. Curiosamente, quando as chamas cercam a Temple Church, se extinguem de súbito, poupando da destruição um dos mais belos templos medievais de Londres.
Quase 300 anos depois, surge uma nova ameaça. Em 1941, as bombas incendiárias da Luftwafe chovem sobre Londres. Mas desta vez, a igreja dos templários não é poupada. Seu telhado é destruído e o calor das chamas carboniza as efígies de pedra do século 13 da nave central, mas, nas profundezas da cripta, as tumbas permanecem intactas.
Após o final da guerra, Londres se mobiliza para reconstruir prédios e templos destruídos. A restauração demora mais de uma década e, em 1958, as portas da Temple Church são reabertas. Antigos adornos, recuperados pelo arquiteto Sir Christopher Wren, voltam aos lugares originais. A grande biblioteca é restaurada e 250 mil livros e documentos históricos são digitalizados e abertos à consulta on-line.

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Hoje, quase 800 anos depois, o silêncio da Temple Church é mais uma vez rompido. Desta vez, pelas vozes dos 60 meninos-cantores do celebrado The Temple Church Choir. Certamente, William Marshal e os cavaleiros que ali descansam sob as lajes seculares, não poderiam esperar melhor homenagem.

Autor
José Antônio Moraes de Oliveira é formado em Jornalismo e Filosofia e tem passagens pelo Jornal A Hora, Jornal do Comércio e Correio do Povo. Trocou o Jornalismo pela Publicidade para produzir anúncios na MPM Propaganda para Ipiranga de Petróleo, Lojas Renner, Embratur e American Airlines. Foi também diretor de Comunicação do Grupo Iochpe e cofundador do CENP, que estabeleceu normas-padrão para as agências de Publicidade. Escreveu o livro 'Entre Dois Verões', com crônicas sobre sua infância e adolescência na fazenda dos avós e na Porto Alegre dos velhos tempos. E-mail para contato: [email protected]

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