Além do mais que óbvio talento, a nossa estrela maior, Fernanda Montenegro, teve os seus momentos de sorte, assim como eu tive em relação a ela, pois há muitas décadas somos amigos, inclusive quando ela me comunicou que estava grávida de seu primeiro filho e me comunicou também que a gestação era decorrente de uma noite em que ela, Fernando Torres, o marido, outros artistas e eu, dormimos na pousada da dona Herta, na serra gaúcha, voltando de um passeio a Gramado. Nessa época, em que eles estiveram fazendo uma temporada no Theatro São Pedro, em Porto Alegre -, eu morava e tinha um teatro na capital gaúcha, o Teatro de Equipe, onde meus sócios eram Milton Matos, Paulo José e Peréio - e o Fernando Torres me consultava para saber como aproveitar o "feriado teatral", das segundas-feiras.
Fernanda, junto com outros artistas, teve parte de sua vida ocupada com muito trabalho, pois após as noites de participação nos espetáculos teatrais em cartaz, ensaiavam uma adaptação para a TV do programa Grande Teatro Tupi, normalmente textos produzidos para o veículo por Manoel Carlos e, à tarde, ensaiavam o próximo espetáculo para o teatro.
As apresentações na TV eram normalmente dirigidas por Antunes Filho ou meu amigo/irmão, Flávio Rangel, a quem apresentei o teatro e que foi, até o cigarro matar, dos mais brilhantes diretores deste país.
Fernanda não é apenas um exemplo, é sinônimo de trabalho e de talento. Vai aqui um exemplo também de sorte.
Maria Della Costa em O Canto da Cotovia, protagonizando Joana D?Arc, abusou de suas cordas vocais e foi para o estaleiro. Enquanto Della Costa estava no estaleiro, recuperando-se, a companhia montou A Moratória, de Jorge Andrade, também meu amigo. Foi o momento de sorte da Fernanda cujo desempenho como Lucília, mostrou que o país possuía uma nova estrela.
A partir daí o acúmulo de sucessos fez da Montenegro uma das primas donas de nossos palcos, além de seus trabalhos na televisão e no cinema, incluindo uma indicação para o prestigiado e cobiçado Oscar.
A figura de Fernanda, por sua trajetória artística e humana é, pessoalmente, uma das grandes referências gloriosas deste país.
Eu quebro minha natural modéstia quando afirmo que Fernanda e eu somos amigos há décadas e não me perdoo por não haver colecionado os muitos telegramas Western que ela me enviava em meio a nossa relação de amizade.
Beijos, Fernanda.