Estas avós embaladas em açúcar e afeto

As redes sociais foram invadidas na terça-feira por um festival de homenagens recheados de doçuras, ternuras, afetos e declarações de amor. Tudo porque o …

As redes sociais foram invadidas na terça-feira por um festival de homenagens recheados de doçuras, ternuras, afetos e declarações de amor. Tudo porque o calendário indica que na data de 26 de julho ocorre a celebração do Dia das Avós. Segundo o Tio Google, nesta data são comemorados os Dias de Santa Ana e São Joaquim, pais de Maria e, por consequência, avós de Jesus Cristo. Catolicismo e dias assinalados na folhinha para se lembrar de alguém deixados de lado, não existe nada mais amado, idolatrado, carinhoso e que merece o amor de todos do que os avôs e as avós. E eternos merecedores de qualquer manifestação de amor.
São aquelas criaturas especiais que sempre transbordam carinho nas rugas visíveis ou que recém começam a se manifestar ao redor dos olhos. São aqueles seres que sempre encontram um tempo disponível para cuidar dos netos a fim de facilitar a vida pessoal ou profissional dos filhos e filhas. São aqueles homens e mulheres que não se importam de ver e rever quantas vezes os netos e as netas pedirem aquele filme da Disney, da Galinha Pintadinha ou do Carrossel. São aquelas pessoas que burlam as ordens paternas e maternas e permitem o doce antes das horas determinadas, uns minutos a mais na frente da televisão e outros pequenos desvios que jamais saem da memória dos netos e netas.
Os avôs e as avós mimam os netos e netas sem a responsabilidade pesada da educação correta que deve ser exercida pelos pais. Por isso, fingem que nem percebem se ficou um resto de comida no prato, se o neto pede toda a refeição uma porção extra de batatas fritas, se o tema não foi feito na hora, se a manha já está passando dos limites. Os avôs e avós paparicam os netos e netas com doses generosas de compreensão, porque já não lhes é mais exigido o rigor de disciplina aplicado nos filhos e filhas. Para os avôs e avós, é a vez de ser mais complacente, paciente, benevolente e amável.
Por motivos diversos, a minha filha (hoje já chegando aos 22 anos), conviveu mais tempo de sua infância e início de adolescência com a avó materna. Minha mãe, que já havia ajudado a criar um neto e uma neta filhos da minha irmã, não economizou nunca em carinho, dedicação, afinco e disposição nos momentos em que esteve com Gabriela. Minha mãe abdicava de qualquer compromisso que poderia ter agendado para zelar pela neta, contar estórias, assistir filmes, preparar delícias gastronômicas (e ela era especialista em comidas boas) ou até mesmo trocar sua noite de sono para cuidar de alguma enfermidade dos primeiros anos.
A minha mãe Mirthô, entre tantas guloseimas que inventava na sua cozinha, tinha expertise em fazer trufas. Das mais deliciosas. Das mais envolventes. Das mais tentadoras. Das mais saborosas. Simplesmente trufas de dar água na boca. Só de lembrar aquelas gostosuras, sou capaz de salivar. Mirthô iniciou-se nesta experiência para aumentar a sua renda após a separação. Mas gostou tanto e era tão elogiada que nunca mais deixou de elaborar trufas. Para qualquer ocasião. Em embalagens cuidadosamente arrumadas com carinho e habilidade.
Eu e Gabriela moramos com minha mãe durante quatro anos e privamos, é claro, destas infinitas delícias. Mas a minha filha Gabriela (ainda hoje só gosta de chocolate puro) preferia se lambuzar com os recheios de brigadeiro ou de chocolate ao leite antes que eles fossem enfeitar o interior daquele bombom refinado. Pois não é que mamãe Mirthô sempre deixava separadas na geladeira algumas tigelas e vidros com os recheios para fazer a felicidade de sua neta. É muito amor. É muita dedicação. É muito carinho. É muito mimo. Ah, estas avós embaladas em açúcar e afeto.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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