Mantenha distância: inferno astral antecipado

E assim, sem pedir licença e nem mesmo receber autorização. Sem aviso prévio. Sem que eu estivesse preparada e com meu estoque de paciência …

E assim, sem pedir licença e nem mesmo receber autorização. Sem aviso prévio. Sem que eu estivesse preparada e com meu estoque de paciência e resignação devidamente abastecido. Na quinzena final de abril, com uma antecedência absurda de mais de 15 dias do seu início oficial, bate à porta do apartamento, inaugurando uma manhã ensolarada, e entra forçando, contra a minha vontade, o tal do inferno astral. Este período consiste naqueles 30 dias anteriores à data do nascimento de uma pessoa. E segundo o dito popular, é uma época em que o futuro aniversariante esbanja sensibilidade e parece que tudo conspira contra tal vivente.
Como faço aniversário no dia 9 de junho (anota e circula aí na agenda para não esquecer porque geminiana gosta de ser paparicada), o meu inferno astral deveria começar no dia 10 de maio. Mas parece que o diabo do inferno astral estava com pouco serviço e decidiu chegar antes na minha rotina. Lá pelo dia 24 de abril, sem mais nem menos, percebi o diabinho que habita tal inferno bem instalado na minha casa e debilitando meu corpo e mente.
Desde então, e juro que não é neurose, ficou tudo embaralhado na minha vida, o dia parece noite, e vice-versa, as energias ruins e confusas decorrentes de tal inferno acompanham-me, apareceram espinhas da puberdade nesta senhora cinquentona e brigam com as rugas da idade. A enxaqueca que há muito me abandonara voltou e com vontade de incomodar. O bolo de baunilha abatumou (acho esta palavra muito linda). E aquela pessoa que parecia sempre disposta a lhe ajudar, de repente, não mais que de repente, conta um episódio que mostra a total e desmesurada falta de amparo justamente numa situação em que mais poderia auxiliar.
Quando eu percebi, assim sem mais nem menos, estava mergulhada numa fase de "pouca sorte" (melhor usar este termo porque aquele outro já vem carregado de mau agouro). E não existe nada pior do que uma geminiana em inferno astral. Agora faça um esforço e imagine, se é que você acredita um pouquinho neste lance zodiacal, uma geminiana da gema, por todos os poros, ascendentes, descendentes, antepassados, sol, lua e planeta em gêmeos vivendo um período antecipado de inferno astral. É melhor não chegar perto.
Por conta disto e pensando (olha o inferno astral até me fez usar gerúndio) naquelas pessoas que convivem comigo diariamente, estou com planos de andar, pelo menos até o final oficial deste período, no dia do aniversário, com algumas placas de advertência. Talvez algo semelhante aqueles avisos de "Mantenha Distância" ou "Estou em obras para melhor atendê-los" ou "Evite contato, pessoa em quarentena". Porque a minha sensibilidade está no grau máximo e qualquer dor é sempre maior, qualquer problema é insolúvel, toda cicatriz custa a sarar e não encontro de jeito nenhum o fim do caminho, onde prometeram o pote de ouro.
Se o tal do inferno astral das pessoas é quando tudo aquilo que poderia não dar certo, pasmem, realmente dá errado mesmo, informo, meu mundo caiu e tudo começou a desandar antes do tempo. Para não piorar as coisas, evitarei passar embaixo de escadas, fugirei dos gatos pretos (meu Deus, porque os coitadinhos carregam tal fama) e das encruzilhadas. E renovei alguns adereços essenciais: figa, olho grego, crucifixo e outros itens que espantam a falta de sorte. E namastê!

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

Comentários