A árvore madrinha

Por José Antônio de Moraes

Em uma tarde fria, o carteiro Karl-Heinz Martens entra na densa floresta de Dodauer, a 100 quilômetros de Hamburgo, no norte da Alemanha. Depois de uma longa caminhada, chega a uma clareira, abre sua bolsa e sobe a escada de madeira de três metros de altura, para entregar um envelope a um carvalho de 500 anos. O 'Bräutigamseiche', ou 'Carvalho dos Noivos' acabou de receber uma das mais de mil cartas que lhe chegam a cada ano.

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"Hoje foi apenas uma carta", diz o carteiro Martens, antes de voltar em seus passos e desaparecer no meio das árvores em direção à próxima caixa de correio na sua rota diária na cidadezinha de Eutin. O envelope depositado na velha árvore foi enviado por uma mulher de 55 anos da Baviera. Ela ouviu falar na fama casamenteira do 'Carvalho dos Noivos'  e quer saber se existe um homem de sua idade que também esteja à procura de romance. A cada ano, pessoas de diferentes partes da Alemanha e da Europa escrevem cartas ao velho carvalho, na esperança de que, pelo preço de um selo postal, encontrem o amor de suas vidas. Os habitantes de Eutin juram que a árvore já foi responsável por mais de 100 casamentos felizes. Karl-Heinz Martens garante:

"Há algo de muito mágico naquela floresta."

Ele tem 72 anos e entregou cartas na floresta por mais de 30 anos, desde 1987. Durante todos estes anos, levou cartas vindas de seis continentes, muitas vezes em idiomas que não conseguia decifrar. Ele conta que embora o carvalho tenha ficado famoso, há 128 anos era um segredo ciosamente guardado por um único casal. Em 1890, uma bela jovem da região, chamada Minna se apaixonou por Wilhelm, que fabricava chocolates. Quando pai a proibiu de ver o rapaz, os dois passaram a trocar cartas secretamente, deixando mensagens apaixonadas em uma fenda no tronco do carvalho. Um ano depois, o pai de Minna concordou em dar permissão para a filha noivar com Wilhelm, o chocolateiro. A festa de casamento aconteceu em um dia do verão de 1891, sob a sombra do venerável carvalho.

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A estória se espalhou e não demorou para que românticos de toda a Alemanha escrevessem cartas de amor para serem depositadas no tronco do carvalho. Foram tantas correspondência que, em 1927, a Deutsche Post, o correio alemão, atribuiu um código postal para o carvalho e um carteiro foi designado para fazer as entregas na floresta. Os moradores de Eutin se apressaram em construir uma escada até a "caixa de correio", para dar acesso às pessoas interessadas em ler e responder as cartas. Segundo o carteiro, Martens, existe uma única regra não-escrita: se alguém abrir uma carta que não lhe interessar, deve colocá-la de volta  na árvore para que outra pessoa tente sua sorte. E as lendas não faltam: se uma jovem sonha em encontrar seu príncipe encantado, deve dar três voltas ao redor do tronco do 'Carvalho dos Noivos' em noite de luz cheia, enquanto pensa no seu futuro amado, sem falar uma palavra ou sorrir. Em um ano, é certo que ela estará casada. Ao que se sabe, a árvore na floresta de Dodauer é a única árvore no mundo que tem endereço postal próprio. Seis dias por semana nos últimos 91 anos, um carteiro caminhou pela floresta - com chuva, neve ou sol - sobiu a escadinha e depositou os envelopes na fenda no tronco da árvore. E ninguém conhece mais estórias do carvalho casamenteiro do que o veterano carteiro Karl-Heinz Martens:

"Em 1958, um jovem soldado alemão chamado Peter Pump foi até o carvalho, vasculhou o buraco de cartas e encontrou um bilhete com apenas um nome e endereço. Por capricho, respondeu a uma 'honrada senhorita Marita', que, na verdade, não escrevera o bilhete. Foram os amigos da tímida Marita que colocaram a mensagem na árvore. Peter e Marita trocaram cartas durante um ano até que finalmente se encontraram. Os dois trocaram alianças em 1961 e agora vão celebrar seu 57º aniversário de casamento debaixo da velha árvore".

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Autor
José Antônio Moraes de Oliveira é formado em Jornalismo e Filosofia e tem passagens pelo Jornal A Hora, Jornal do Comércio e Correio do Povo. Trocou o Jornalismo pela Publicidade para produzir anúncios na MPM Propaganda para Ipiranga de Petróleo, Lojas Renner, Embratur e American Airlines. Foi também diretor de Comunicação do Grupo Iochpe e cofundador do CENP, que estabeleceu normas-padrão para as agências de Publicidade. Escreveu o livro 'Entre Dois Verões', com crônicas sobre sua infância e adolescência na fazenda dos avós e na Porto Alegre dos velhos tempos. E-mail para contato: [email protected]

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