A difícil vida dos criativos

Apesar de não trabalhar em agencia de propaganda, tenho amigos que atuam como criativos e, portanto (e já por quilômetros rodados na minha vida profissional), tenho uma boa ideia do problema que está para se desenvolver nesta atividade nos dias de hoje.

Explico: porque há dois grupos em franca atividade. O do patrulhamento ideológico e o do politicamente correto. Não se pode criar livremente (claro, nunca se pode, sempre houve limites como em qualquer atividade, impostos pela sociedade, pela cultura, pelo Poder Judiciário, etc, mas os limites eram mais amplos) como se fazia há pouco tempo atrás. Hoje, há a turma do politicamente correto, para começar. Foi uma praga que se instituiu há alguns anos. Não estou falando em detonar a imagem das pessoas, de minorias, nada disto. Estou falando em brincar com os outros como se faz a si mesmo. Rir da situação sem acabar com a(s) pessoa(s). Como a pessoa que está criando riria de si mesma. Agora não, já se é julgado e (em grande parte das vezes), vetado. Quando não se é olhado de lado e com desconfiança.

O respeito deve estar intrínseco a toda atividade humana, mas o politicamente correto (como um "respeito" exagerado e desmedido) de uma forma geral é falso, pois várias daquelas pessoas que condenam não praticam na sociedade o que pregam. Aliás, fazendo uma análise psicológica, todos aqueles que têm ojeriza a determinado assunto (estejamos falando de negros, gays, obesos ou de quaisquer seres humanos) não estão bem resolvidos com a questão tratada. Ojeriza revela que a questão ou grupos de pessoas incomoda e muito, toca em um tema com o qual aquele indivíduo não sabe lidar bem e, portanto, mal resolvido. Muitas vezes extremamente mal resolvido.

Mas como disse anteriormente, este comportamento veio com força há alguns anos e se enraizou como uma seringueira. Espero que esteja rumando para o fim, embora não pareça.

Já o patrulhamento ideológico anda de mãos dadas com o politicamente correto, embora incida prioritariamente (e como diz o nome) em questões ideológicas. Na política, parece ser claro que não só o Brasil como o mundo está dando uma guinada à direita. Basta ver as recentes eleições. A isto computo o fato da fragmentação da realidade e das certezas: quando as pessoas se viram sem referências claras (o mundo líquido a que Zygmunt Bauman se referiu), foram buscar em modelos que "resolvam" para elas estas incertezas. Alguém que as diga o que fazer, que de preferência (e não está sendo só de preferência) tome as decisões por elas. É quase um "faça o que quiser, mas faça por mim". Porque isto é característico do ser humano, retornar ao antigo e já experimentado em tempos turbulentos. Vai daí que a guinada também é conservadora, ficando vigilantes (no exagero da coisa) a qualquer coisa que permita maior liberdade de pensamento, expressão e - principalmente - de questionamento das certezas que as pessoas estão desesperadamente em busca.

Diante deste cenário, há uma verdadeira histeria contra qualquer manifestação que fuja aos extremamente rígidos padrões estabelecidos por grupos conservadores. Uma perseguição não só ao que de fato seja desrespeitoso, mas ao que lhes parece desrespeitoso. Estes grupos se alçaram a tribunais da ética e da moral, como se ela não existisse antes deles na vida humana. Some-se a isto o barulho que um pequeno grupo pode fazer em redes sociais e o verdadeiro pavor em que se encontram as empresas em sua comunicação (no aspecto de não serem "julgadas" por estes grupos) e temos a atual e difícil vida dos criativos nas agências. E das próprias agências e seus anunciantes, é claro. Limites que se estreitaram na velocidade da luz. Difícil a vida. Mas ela também acontece em ciclos. Fiquemos atentos a como as coisas se desenvolverão nos próximos meses, anos, décadas e gerações (lembrando que gerações eram medidas em 25 anos, mas com a velocidade das mudanças, podemos encurtar este tempo para 10 anos). A ver.  

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