Ai, que gente mais chata e lamurienta

Como as pessoas são estranhas, controversas, contraditórias e, por que não dizer, umas eternas insatisfeitas. Até é preciso concordar que se fossem todas iguais e certinhas, o mundo tenderia a ficar um imenso quadrado sem graça e sem vida. Mas precisavam ser assim tão incoerentes? Ninguém nunca está contente com nada. Ninguém nunca está feliz com tudo. Ninguém jamais mostra um contentamento absurdo com fatos corriqueiros. Ninguém jamais demonstra uma felicidade espontânea com acontecimentos extraordinários. Ai, que gente mais chata, lamurienta e sem capacidade de enxergar a beleza nas pequenas e valiosas coisas.

Faço esta reflexão depois de observar queixas e mais queixas de amigos (as), colegas e conhecidos (as) que acompanho nas tais redes sociais desde o último sábado, quando os sinais iniciais do frio se instalaram em Porto Alegre e demais cidades do nosso Estado. É gente a reclamar que está congelando. Outro que está chovendo sem parar (vejam bem a pessoa referia-se apenas um dia de chuva). Ou que foi a madrugada mais fria do Inverno (e olha que esta estação ainda nem começou) e alguns e algumas mais ousadas se permitem indagar quando é que volta o Verão?

Se não me falha a memória (querida da minha mamis adorava usar este termo), muitas destas pessoas que lamentam o frio (nem chegou perto ainda do frio que costuma fazer aqui no Pampa) são aquelas que destilavam ódio e indignação com as elevadas temperaturas. É possível entender? Claro que não. Penso que algumas pessoas têm um prazer inenarrável (coisa mais linda) em reclamar, em praguejar e em ser do contra. Se está calor, gosta do frio. Mas se está frio, diz que prefere o calor. Se o sol apresenta-se escaldante, admite que é mais fã de uma chuva. Já se chove, confessa que admira mais o sol.

Um pouco, um tantinho só de coerência meu povo. Todos podem até ter as suas preferências. Faz parte. Cada um tem direito a gostar mais do azul do que do vermelho. Mas cuidem para que as suas preferências não se alterem com a alternância das estações. Estar em desacordo é normal, é saudável, é democrático. Desde que você não tenha se manifestado publicamente um eterno e intratável apaixonado pelo que agora lhe desagrada totalmente.

Sei não. Posso estar equivocada (sim, sou humana e tenho minhas falhas), mas percebo um rol de pessoas que sempre gostam de reclamar. Da vida, do tempo, do futebol, da música, da comida do vizinho, do gosto do outro, da felicidade da colega. Ai, se cada um fosse fiel às suas idolatrias. Mais feliz, com certeza, seria o mundo. Ai, se cada um estivesse mais preocupado só com as suas plantas. Mais verde, com certeza, brotaria no planeta. Ai, se cada um cuidasse mais do seu próprio umbigo. Menos egoísmo, hipocrisia e fofoca reinariam entre os seres humanos.

Mas, voltando à questão de temperatura. Céus. Deixem de reclamar tanto. Sim. Recém experimentamos uma queda nos termômetros. Há de chegar ainda mais frio nos próximos três meses, pelo menos. Aproveite para se agasalhar mais. Com a beleza que o Outono/Inverno permite. Não estou falando daquele cenário horripilante do pijama de flanela mais fuleiro, com quatro camisetas por baixo e uma pantufa desastrosa de bichinho nos pés. Use o clima convidativo aos encontros para paquerar mais. Usufrua das amizades fiéis para bebericar um vinho nas noites. Ou, simplesmente, tome um banho quente de sair fumaça, acomode-se no sofá e desfrute de uma boa música, um livro excepcional ou um filme de arrasar.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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