Em defesa dos nossos filhos

Nada é tão importante para uma mãe normal (se é que esta categoria existe) quanto o passado, presente e futuro de sua filha ou …

Nada é tão importante para uma mãe normal (se é que esta categoria existe) quanto o passado, presente e futuro de sua filha ou filho. O assunto da mesa de bar pode ser variado, mas sempre haverá uma mãe inoportuna (sabe, aquela que não se liga?) que associará o tema, entre um petisco e um gole de bebida, ao desempenho de sua prole. Mas, para as simpatizantes do Movimento Internacional das Mães que Amam Demais seus Filhos (Mimad) - com adesões crescentes pelo mundo - toda situação é superdimensionada e ganha um valor agregado quando envolve a figura do filho.
Desnecessário afirmar que esta que vos escreve é quase uma sócia honorária do Mimad na capital gaúcha. Quem algum dia, para passar o tempo ou pela falta de algo melhor para fazer ou para depois criticar com argumento (sei que ficou corrido, mas foi proposital para enfatizar), leu alguma coluna ou é um dos meus 17 leitores fixos, sabe da paixão desenfreada pela minha filha Gabriela Martins Trezzi. A adolescente famosa, digamos assim, já manifestou a vontade de ser jornalista. Tem herança genética de avô, mãe e pai. Para não influenciar, tento ficar neutra (capaz!). Não estimulo e nem desanimo.
E na quarta-feira, nos dias em que o STF agendou o julgamento do recurso contra a obrigatoriedade do diploma de jornalista para o exercício da profissão, ela acompanha meu nervosismo, em casa, durante a transmissão da sessão ou na volta das reuniões no Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul. Mais de uma vez, Gabriela me perguntou o que aconteceria se o fim da exigência do diploma fosse aprovado. Descartando as consequências naturais que desabam na desqualificação do profissional por vários motivos, não aceitei nunca falar para ela de um novo cenário, sem jornalista diplomado.
Sócia honorária do Mimad, jornalista com formação superior sim, e específica, e diretora eleita do Sindicato, pretendia retomar o tema da possibilidade remota do fim do diploma (sim, o STF promete julgar hoje) nesta coluna. Sob um viés diferente. Para evitar o tom de militante em defesa da profissão, que todos deveriam adotar, buscava um aspecto que fugisse da mobilização e da luta corporativa. E, pasmem, leitores. Encontrei o que buscava no Orkut, meu companheiro fiel das noites de insônia. Novamente, aconselhada pelo companheiro de profissão, sindicato e de vida, Jorge Correa.
Depois de uma conversa na terça-feira no sindicato, Jorge citou o perfil de uma amiga em comum, que alterava seguido as chamadas e suas frases em função da necessidade da manutenção do diploma. Mais tarde ao acessar a página da colega, encontrei argumentos mais do que convincentes e que interessam a toda a população. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o próprio sindicato devem ter enviado algumas vezes manifestações com o mesmo teor para o email da diretoria. Com certeza. No jornal Versão, do sindicato, também. Só que me pegaram de um jeito grudento na Versão do Orkut.
O retrocesso impiedoso é que somos mais de 80 mil jornalistas graduados no País. Um universo de 400 faculdades de comunicação social e 2.500 professores de jornalismo. Mais de 74,3% da população consultada em pesquisa do Instituto Sensus, em setembro do ano passado, afirmou ser a favor da obrigatoriedade do diploma em jornalismo. E o julgamento de um Recurso Extraordinário, que se arrasta desde 2001, pelos ministros do STF, todos com seus cursos superiores específicos, é claro, pode apunhalar o sonho profissional de muito adolescente, revirar a estrutura de uma categoria e enterrar utopias.
Tantas inquietações povoaram meus sonhos (ou pesadelos?) na fria madrugada de quarta-feira. Será justo que 11 ministros que defendem a justiça cometam uma enorme injustiça com os jornalistas diplomados? Quem será beneficiado com o fim do diploma, além das sete ou oito famílias que detêm os meios de comunicação social? A quem interessa uma sociedade informada por profissionais sem formação?
Mas, o texto no folder remetido pelo Sindicato dos Jornalistas do Ceará (Sindijorce), lembrando que o Supremo Tribunal Federal pode acabar com o direito de toda a sociedade brasileira à informação com ética e qualidade, instigou a sócia honorária do Mimad. "Você levaria seu filho a um pediatra sem diploma? Mas jornal escrito por amador ele pode, né"?

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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