O boneco Ken pra presidente

Só há uma saída pro Bananão: boneco Ken pra presidente em 2018. A única dúvida é: Ken loiro ou Ken moreno? A Barbie nem entra na conta: a loira é perfeita pra primeira dama. Quer dizer, o boneco Ken não é a única saída pro Bananão, mas pra direita do Bananão. O interessante é como os estrategistas conseguiram essa proeza.

Vejam o Aécio. Apesar de bater numa mulher em público, apesar da fama de ser chegado a um pó, apesar da lista de Furnas, apesar das contas em paraísos fiscais, apesar de retaliações jurídicas-policiais a jornalistas críticos em Minas, a Globo, suas afiliadas, os grandes jornais e vários delegados da polícia federal podiam continuar vendendo a imagem de bom moço até 2018. Bastava ele direcionar o ressentimento em críticas à Dilma dentro dos limites dessa choldra que a Globo, Gilmar Mendes, Moro e Temer, entre outras ilustres personalidades, querem que a gente acredite ser democracia. Seria eleito presidente com uma mão nas costas.

Mas não. Preferiu, como disse, encher o saco da Dilma. Os demais aderiram alegremente. Todos, inclusive os que têm vários processos nas costas, esbravejaram contra a corrupção. É, no Bananão, há corrupção condenável e corrupção não-vem-ao-caso.

Não é que não se pensasse em quem botavam no lugar da Dilma. É que tanto fazia. Teve inclusive quem garantisse que a mera saída de Dilma poria o Bananão nos eixos. Tradução: vamos roubar o que der no tempo mais curto que for possível, enquanto os ricos botam o Bananão de volta no século 19, na fase pré-Lei Áurea, de onde nunca deveria ter saído. Se o Bananão explodir? Não explode. Faz 500 anos que esse barril de pólvora queima e não explode. Vamos a la playa, que el sol ya viene.

Mas e se o hospedeiro morrer? Os parasitas maiores irão devorar os parasitas menores. Vão sobrar poucos parasitas pra defender o mercado livre.

A jogada do Aécio destruiu Aécio e, de quebra, o seu partido. É pouco? Fortaleceu o PT. É pouco? Revelou a quadrilha do Temer em todo o seu esplendor. Mais: deixou claro do modo mais didático a manipulação criminosa, às vezes grotesca, da grande imprensa e ainda escancarou os métodos da Justiça, que sentencia conforme o réu, não conforme o crime. Gênio.

O Lula estava quieto no seu canto. Mas, como é preciso mostrar pras próximas gerações que ninguém deve se meter a besta, resolveram acabar com ele. Não bastava a tevê, os jornais e as revistas chamarem o homem de ladrão em todas as manchetes e em todos os horários nobres. Os dias do mensalão haviam despertado a ânsia por sangue fresco. Providencialmente surgiu Sérgio Moro - e com uma camisa negra que parece um sinal de nascença ou homenagem a justiceiros italianos.

E o que aconteceu? Moro, com sua cara enfarruscada - exceto quando confraterniza com o Aécio e quando aperta a mão do ladrão presidente -, com suas convicções e falta de provas violou a Constituição tantas vezes que obrigou Lula a voltar. Pior, Moro, a quadrilha que Moro ajudou a botar no Planalto e a imprensa que aplaudiu os dois conseguiram fazer Lula disparar nas pesquisas. A direita bananense deu o golpe, está faturando com ele, mas perdeu a guerra moral. Não teria lucrado mais ou menos a mesma coisa sem golpe? Não teria mantido em pé a fachada moral? Sim, sim, mas aí se perderia o gostinho da vingança.

Como deter Lula agora? Os truques são sempre os mesmos.

O primeiro: se foi possível engendrar uma criatura como Collor, por que não Dória? Mas o camelô dos ricos implodiu do modo mais bisonho. Virou farinata, como se diz. Foi meio como um filme do Monty Python num dia não muito inspirado.

Então se providencia o Huck, que tem projetos sociais de auditório, como Dilma apontou. Vamos lá, rapidinho: o pessoal esquece que era amigo do Aécio e do Cabral. Mas então, quando o primeiro sócio foi preso por corrupção, o Huck sentiu saudades dos tempos despreocupados em que deu sua única contribuição à cultura bananense: a bunda da Tiazinha e a da Feiticeira. Pena. Lá se foi a chance de termos a Tiazinha no Ministério da Educação e a Feiticeira, digamos, no Ministério de Ciência e Tecnologia. No atual quadro do Bananão, em que tudo é espetáculo e temos um pé numa suruba e outro na Idade Média, seria perfeito.

O segundo: parlamentarismo ou semipresidencialismo, seja isso que bicho for. Com os deputados e senadores que temos, o troço leva jeito de o Bananão se tornar Bananão na segunda potência. Sem falar que justificar essa canetada vai exigir mais contorcionismos jurídicos que o impítim da Dilma. Não sei que gênio publicitário vai vender esse peixe.

O terceiro: Moro condenar o Lula e a segunda instância, o puxadinho de Curitiba que leva jeito de sumir - lembre-se: órgão que não se usa atrofia -, manter a condenação. É a mais provável. Mas a Globo, que sustenta a pose do Moro, está perdendo ela mesma a pose, pega em pagamentos milionários de propinas. Pra complicar, surgiu Tacla Duran, que fez pagamentos à senhora Moro e apontou o compadre do Moro como parte de um esquemão pra arrancar grana pra premiar delatores. Nada mais cara de Bananão, os paladinos anticorrupção acusados de corrupção. Isso se soma às sentenças que o Moro distribuiu a torto e a direito, com penas mínimas pra criminosos notórios, com multas irrisórias e até esquecimentos de contas em paraísos fiscais, mas, em compensação, ferrando réus com base na palavra dos tais criminosos notórios tratados a pão de ló, como diria minha avó, ótima confeiteira.

Enfim, vai ficar chato pra chuchu. Certo que o pessoal perdeu completamente a vergonha. O perigo é a ralé perder a paciência.

Daí o boneco Ken. É a saída mais fácil e fotogênica. Sem falar que, como é gringo, se eliminam alguns intermediários.

Autor
Ernani Ssó se define como ?o escritor que veio do frio?: nasceu em Bom Jesus, em 1953. Era agosto, nevava. Passou a infância ouvindo histórias e, aos 11 anos, leu seu primeiro livro sozinho:Robinson Crusoé. Em 1973, por querer ser escritor, entrou para a Faculdade de Jornalismo, que deixou um ano depois.  Em sua estréia, escreveu para O Quadrão (1974) e QI 14,(1975), publicações de humor. Foi várias vezes premiado. Desenvolve projetos literários para adultos e crianças.

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