Objetivo: pelo menos um festival por cidade

Já escrevi aqui sobre o vigor da cena jazzística gaúcha e, na semana passada, a respeito da importância dos festivais culturais do Interior. Corro o risco, portanto, de voltar a bater nas mesmas teclas ao comentar o recente 2º Festival de Música de Nova Prata - mas acho que o tema é afinado e garanto que vocês não vão se arrepender de retornarmos a ele, ok? Acompanhei no último domingo o derradeiro dia do evento que, desde a quarta-feira anterior, mobilizou a cidade serrana de pouco mais de 25 mil habitantes. Confesso que me arrependi: deveria ter subido até lá desde o início, dada a alta qualidade da programação, o profissionalismo da produção e a hospitalidade do nova-pratense.

Foram cinco dias de muita música, em atividades gratuitas que iam de shows a céu aberto no centro urbano local e concertos em duas capelas do interior do município a palestras, bate-papos e oficinas. A ideia era não apenas mostrar para a população o trabalho de músicos e grupos gaúchos em apresentações ao vivo, mas também fomentar o interesse e levar informação musical para escolas, professores e artistas da região. As atividades formativas incluíram workshops de instrumentos e uma oficina de musicalização infantil. Já a Mostra Local contou com apresentações de formações como o Diego Berquó Trio, a Casa Muscaria e a Orquestra de Sopros de Nova Prata.

O interessante é que o festival também selecionou atrações por meio de edital aberto a nomes residentes no Estado. Foram escolhidos quatro excelentes grupos - três deles exclusivamente instrumentais - e dois conjuntos de câmara: Kula Jazz, MOIO, Trabalhos Espaciais Manuais, Veña, As Mulheres de Bah! e Ária Trio. O time de convidados estava igualmente repleto de bambas: os violonistas Gabriel Selvage e Jonathas Ferreira, o excelente Quinteto Canjerana, o guitarrista norte-americano Adrian Bellue, o músico e ator Philipe Philippsen, o duo de viola e acordeom formado por Valdir Verona e Rafael De Boni e o ídolo gaiteiro Renato Borghetti e seu quarteto. A agenda ainda extrapolou os domínios da música ao incluir o belo e performático espetáculo de rua "Automákina - Universo Deslizante". O palco principal dessa maratona artística foi a graciosa e aconchegante - como de resto toda a cidade - Praça da Bandeira, decorada com bonitos painéis em basalto, uma das principais riquezas do município, esculpidos pelo artista plástico Aido Dalmás, que lotava de gente da comunidade e visitantes, todos atentos às atrações musicais.

Como costuma acontecer em iniciativas desse tipo, o Festival de Música de Nova Prata nasceu da vontade e da persistência de um pequeno grupo, que acaba contagiando parceiros, patrocinadores e autoridades com sua teimosia, conseguindo transformar em realidade um sonho no qual muitos não colocavam fé. Neste caso, o núcleo duro orbitou em torno do coordenador geral Lucas Martini Volpatto - violonista, professor e diretor da Eclética Escola de Música - e da diretora de produção Liége Biasotto, que mobilizaram uma equipe de cerca de 120 pessoas a fim de tornar possível o festival.

Bienal - a primeira edição, em 2015, contou com destaques como Quinteto Persch, Quartchêto e Quiçá Se Fosse -, o festival promete retornar em 2019. Uma pena, porque eu já estava com o pé que é um leque para voltar a Nova Prata no ano que vem e curtir então na íntegra esse evento tri bacana - que já ocupa um lugar de destaque no calendário cultural gaúcho e cujo modelo pode servir de inspiração para outras cidades do Estado.

Autor
Jornalista e crítico de cinema, integrante da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Editou de 1999 a 2017 a coluna Contracapa (artes, cultura e entretenimento), publicada no Segundo Caderno do jornal Zero Hora. Neste período, também atuou como repórter cultural do caderno de variedades de ZH. Apresentou o Programa do Roger na TVCOM entre 2011 e 2015 e é é autor do livro "Mauro Soares - A Luz no Protagonista" (2015), volume da coleção Gaúchos em Cena, publicada pelo festival Porto Alegre Em Cena. Foi corroteirista da minissérie "Tá no Sangue - Os Fagundes", veiculada pela RBS TV em 2016. Atua como repórter e crítico de cinema no Canal Brasil.

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