Quando o Antoninho Gonzales era a cara da Famecos

Comecei como professor da Famecos em 1973, ainda no prédio cinco, levado pelo Gilberto Lehnen e o Ito Ferrarri, depois que o Luís Augusto Cama foi embora para o Rio de Janeiro.

Eu trabalhava na Criação da Standard como redator e, ao mesmo tempo, formado em História pela Ufrgs, era professor no Colégio Estadual Marechal Rondon, em Canoas.

Para o Ito e o Gilberto, era a combinação perfeita, publicitário e professor, o cara ideal para dar aulas sobre Publicidade.

Primeiro no prédio cinco e, logo depois, no novo prédio, o sete, na Famecos, pelos seus professores e alunos, contrastava com a sisudez dos demais cursos no campus da PUC, naqueles anos em que a ditadura brasileira se tornava ainda mais rígida e brutal.

Boa parte desse espírito alegre e só, aparentemente, descomprometido com os estudos, devia-se ao diretor da Famecos, o Antoninho Gonzales.

Eu o conhecera no início dos anos 1950, no Ginásio São Tiago, em Farroupilha, onde ele era interno, junto com seu irmão, Agapito.

Dez anos depois, o reencontro na redação da Última Hora, na Rua 7 de Setembro, quando ele fazia cobertura policial.

O Antoninho ficou pouco no jornal do Samuel Wainer e logo conseguiu emprego na Caldas Júnior, que era a grande meta dos jornalistas da época.

Mais uma década e estamos juntos, novamente, na PUC. Ele como diretor e eu como professor.

O nome pomposo de Faculdade dos Meios de Comunicação Social, não conseguia esconder que a origem do curso - o Jornalismo - garantia aos que optavam por essa área, o sentimento de que eram, realmente, os donos do poder.

Publicidade e Relações Públicas eram os primos pobres, ainda que, a partir de determinado momento, fossem os cursos com o maior número de alunos e os mais rentáveis para a instituição.

Mesmo cultivando um estilo populista e fazendo uma administração onde as portas estavam sempre abertas para todos, professores e alunos sabiam que as exigências de equipamentos para Publicidade, por exemplo, ocupavam, na fila de prioridades do Antoninho, um lugar sempre atrás do Jornalismo.

Na época, você carregava para as salas de aula aqueles projetores de 16 milímetros para mostrar rolos de comerciais ou recortes de revista com anúncios premiados. A quase totalidade de professores era composta de profissionais de mercado, que usavam as aulas para contar como resolviam seus problemas práticos.

Era comum a superposição de conteúdos entre cadeiras diferentes, mas o que poderia ser um problema, às vezes, talvez devesse ser visto como sendo apenas olhares diferentes sobre o mesmo tema.

Acho que de alguma maneira funcionou esse método de ensino, porque alguns anos depois, eu pude constatar que alguns dos profissionais de maior sucesso do mercado publicitário tinham vindo da Famecos.

Ou eles eram talentos natos ou o curso os ajudou um pouco. Quem sabe as duas coisas?

Como a Publicidade não tinha na época a imagem libertária que o Jornalismo carregava, meu esforço, não sei se com sucesso, era tentar convencer os alunos da Publicidade de que eles eram melhores que seus colegas do Jornalismo.

Eu dizia para eles que as pessoas procuram a notícia no jornal. Mesmo que seu texto fosse ruim. O leitor está interessado no fato e vai se esforçar para entender o que foi publicado. Já na publicidade, em princípio, ninguém compra um jornal para ler, por exemplo, um anúncio de geladeira e que por isso mesmo quem escreve esse anúncio, precisa ser mais criativo para atrair o leitor, do que aquele que apenas relata um fato.

Quanto à questão da liberdade, minha tese era que, pelos menos, o publicitário nunca seria enganado. Ele trabalhava numa agência para vender qualquer produto e, para isso, era bem pago, enquanto que o jornalista, quase sempre ganhando menos, iria trabalhar num jornal onde, às vezes, precisava esconder sua linha política porque a do jornal era de outra, oposta.

Não sei se ajudou a valorizar o amor próprio dos meus alunos e nem sei, hoje, se eu mesmo ainda acredito naquele meu discurso.

De qualquer maneira, meus anos de convivência com os alunos foram felizes e guardo deles uma boa lembrança, principalmente dos primeiros, quando minha diferença de idade com eles não era assim tão grande, o que não me colocava naquele distanciamento entre professor e aluno, que o tempo vai trazendo inevitavelmente.

Alguém disse uma vez que o problema do professor é que a cada ano que passa, ele fica mais velho que seus alunos.

Todos os anos em que eu começava um novo período de aulas, meus alunos tinham 18 anos e eu estava um ano mais velho.

Autor
Formado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), foi jornalista nos veículos Última Hora, Revista Manchete, Jornal do Comércio e TV Piratini. Como publicitário, atuou nas agências Standard, Marca, Módulo, MPM e Símbolo. Acumula ainda experiência como professor universitário na área de Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e na Universidade do Vale do Rio do Sinos (Unisinos). É autor dos livros 'Raul', 'Crime na Madrugada', 'De Quatro', 'Tudo que Você NÃO Deve Fazer para Ganhar Dinheiro na Propaganda', 'Tudo Começou em 1964', 'Brizola e Eu' e 'Aconteceu em...', que traz crônicas de viagens, publicadas originalmente em Coletiva.net. E-mail para contato: [email protected]

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