Um milagre do Padre Brown

O mais famoso personagem de Gilbert K.Chesterton é um Sherlock Holmes de batina. O Padre Brown é um devoto sacerdote, embora tenha crises de …

O mais famoso personagem de Gilbert K.Chesterton é um Sherlock Holmes de batina. O Padre Brown é um devoto sacerdote, embora tenha crises de fé e questionamentos sobre os dogmas da Igreja. Mesmo assim, 40 anos depois de aparecer em livro, o padre/detetive operou um milagre, quando induziu Alec Guinness a se converter ao catolicismo. O suposto milagre aconteceu justamente quando o grande ator estudava textos de Chesterton sobre Teologia, ao mesmo tempo em que se preparava para fazer o Padre Brown no cinema.

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Alec Guinness não foi apenas um dos maiores atores ingleses do século XX. Reconhecido como um dos mais versáteis intérpretes no teatro e cinema, alcançou fama ao viver uma imensa variedade de personagens. A atuação como Hamlet, nos palcos de Londres, definiu seu perfil de grande ator dramático, confirmado com sua magistral criação como o velho Fagan em "Oliver Twist".
Também transitava com facilidade pelo ácido humor britânico, como demonstrou em "O Quinteto da Morte" e "Kind Hearts and Coronets" (no Brasil, tolamente traduzido para "As Oito Vítimas").
Em 1957, ganha o reconhecimento mundial com o Oscar de Melhor Ator em "A Ponte do Rio Kwai". Segue-se outro sucesso, "Star Wars" e a premiada série da TV inglesa, "Tinker, Tailor, Soldier, Spy", onde vive o atormentado e sombrio George Smiley, de John Le Carré. Em 1959, recebe título de cavaleiro de Elizabeth II, que, quebrando o protocolo, se diz uma grande admiradora.

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Na auto-biografia, "Blessings in Disguise", Alex Guinness descreve sua infância desafortunada, a escalada do sucesso e a sofrida conversão ao catolicismo. Nascido de mãe solteira, não conhece a origem do nome com que foi registrado. Adolescente, ingressa na Igreja Anglicana, mas se considera ateu e cínico em questões de religião. Aos 18 anos, troca os estudos por um emprego como redator de publicidade. Não dá certo e tenta os palcos, onde logo se realiza como ator. Em 1942, um episódio o marca profundamente. Uma noite, quando Londres está sob pesado bombardeio, Alec Guinness procura refúgio em uma igreja, onde o vigário lhe oferece um cálice de clarete e um livro sobre a vida de São Francisco de Sales. Ele bebe o vinho e lê o livro, enquanto bombas caem sobre Londres. As casas vizinhas são destruídas, mas a igreja permanece incólume entre chamas e ruinas.
Mais tarde, em 1954, outro episódio sinalizaria sua proximidade com a fé religiosa - aconteceu durante as filmagens de "Padre Brown" em uma remota aldeia na França. Ao final de um dia, ainda vestido com o traje do personagem, Guinness encontra no caminho um menino, que lhe dá a mão, o confundindo com o pároco local. O gesto de confiança do menino o faz pensar no personagem que interpreta e nos livros de Chesterton e São Francisco de Sales.
Na mesma época, seu filho de 11 anos, Matthew, é vitimado pela polio e ameaçado de ficar paralisado. Alec Guinness decide propor uma barganha ao deus do Padre Brown - se o menino se curasse, ele abraçaria a fé católica. Não muito mais tarde, Matthew se recupera e Guinness cumpre a promessa.
Mas Deus queria mais. Durante as longas filmagens de "A Ponte do Rio Kwai", no Sri Lanka, ele recebe a notícia que a sua esposa e o filho Matthew também haviam se convertido.
Sr. Alec Guinness faleceu em 2000, aos 86 anos de idade. Dizia que, de todos os grandes personagens e figuras históricas que personificou, nenhum foi mais importante do que o Padre Brown, que um dia, deu a mão a um menino francês - e mais tarde, ao seu filho Matthew.

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Autor
José Antônio Moraes de Oliveira é formado em Jornalismo e Filosofia e tem passagens pelo Jornal A Hora, Jornal do Comércio e Correio do Povo. Trocou o Jornalismo pela Publicidade para produzir anúncios na MPM Propaganda para Ipiranga de Petróleo, Lojas Renner, Embratur e American Airlines. Foi também diretor de Comunicação do Grupo Iochpe e cofundador do CENP, que estabeleceu normas-padrão para as agências de Publicidade. Escreveu o livro 'Entre Dois Verões', com crônicas sobre sua infância e adolescência na fazenda dos avós e na Porto Alegre dos velhos tempos. E-mail para contato: [email protected]

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