Um mundo nada ideal

Num mundo ideal, não haveria humoristas: eles morreriam de tédio na pasmaceira reinante nesse hipotético e apático sistema perfeito. Por isso mesmo, nem fariam …


















Num mundo ideal, não haveria humoristas: eles morreriam de tédio na pasmaceira reinante nesse hipotético e apático sistema perfeito. Por isso mesmo, nem fariam falta.

Num mundo um pouco menos ideal, com a raça humana aprendendo a se mancar cada vez mais, mais cedo ou mais tarde pintaria a idéia: ei, gente, que tal inventar uns caras que estejam sempre pegando no nosso pé, só pra não ficarmos caindo nos mesmos buracos? Vão gostar tanto do serviço que nem caros deverão ser.


Num mundo muito longe de ideal porém ainda com um desenvolvido senso de civilização, não só haveria humoristas como brotariam tipo erva daninha (sendo inclusive classificados como tal mas nem por isso afastados do jardim botânico). Por iluminar o obscurantismo e refrescar as idéias, em troca não seriam privados de água e luz.


Num mundo nada ideal mas com predominantes noções de justiça e de igualdade na sociedade, os humoristas, apesar de taxados de rabugentos e sempre do contra, ainda assim seriam apreciados por suas pílulas douradas, com a possibilidade, mesmo remota, de elas fazerem efeito aqui e ali em seres imaginários como autoridades e governantes abertos à crítica.


Num mundo bem ao contrário do ideal e cada vez mais fdp em todos os aspectos sociais, o senso de humor dos humoristas não seria mais tolerado, mas, beneficiado apenas pelas estatísticas da água mole em pedra dura, talvez funcionasse, vez ou outra, como contrapeso na balança desregulada dos valores.


Neste mundo à beira do caos e no fundo do poço ético, chamado Hoje Em Dia, se se usasse um resquício da graça primitiva da espécie e um resto da clareza de que a diversidade de opinião é uma contribuição progressista, a imprensa mesmo pressionada pelos interesses ainda assim não pressionaria seus humoristas.


Neste mundo egresso de recente ditadura militar, onde a Censura asfixiou liberdades, se houvesse vergonha na cara, memória histórica e reserva moral na opinião pública, os chargistas Santiago, Moa e Kayser ainda estariam empregados no Jornal do Comércio, respeitados em seu utilitário papel de divergir.


Bobagens.


Num mundo ideal, ideal mesmo, a expressão "num mundo ideal" nem existiria.


A bomba pneumática ficou mais de duzentos anos sem nenhuma
utilidade, até a invenção do pneumático.

Ming Nang Sei Tang, médico chinês do século XII, viveu
82 anos fazendo acupuntura e era cego de nascença.
Criou a expressão "agulha no palheiro".


No Pólo Norte, às vezes a temperatura baixa tanto
que chega ao Pólo Sul.


O jogo de tênis, no início, era jogado de sapatos.


Toulouse Lautrec era tão baixinho, mas tão baixinho,
que jamais passou da altura dos seus próprios ombros.


Os bebês de proveta, depois que crescem,
dão excelentes sopradores de vidro.


No Japão, há uma seita religiosa que aperfeiçoou a técnica
do haraquiri, cujos praticantes ganham a vida na via pública
se suicidando várias vezes diariamente.


O trânsito mais civilizado do mundo fica
na Ilha Ohanayoyanaho, no sul do Pacífico, em cuja área
de 38m2 não existe um único automóvel.


De todas as árvores frutíferas, só o abacateiro
consegue dar abacates.


A partir de 1873, na costa da Sibéria, uma baleia azul
viveu maritalmente com um lobo cinzento durante anos,
sem nenhuma discriminação cromática.


O Brasil tem algumas das maiores jazidas de mármore de Carrara.


Na Índia, os hindus encantadores de serpentes são
obrigados a pagar uma taxa anual para o fundo
do auxílio-surdez dos ofídios mais idosos.


A jugular é a única veia que acredita em vampiros.


Na área da cabeça de um alfinete cabem mil, cinco mil e
até dez mil coisas minúsculas, o que em nada diminui
as espetadelas dele.


Juvenal de Santarém e Silva, do Ceará, tinha uma memória
fabulosa mas jamais se lembrava que ninguém tinha nada com isso.


Marilyn Monroe nunca foi, até hoje, superada
nas suas imitações de Marilyn Monroe.


Das muitas espécies de animais em extinção,
houve algumas que nem chegaram a dar as caras.


Em 1963, pela primeira vez, foi observada
o sintoma de claustrofobia em pessoas que vivem
apertadas pelo custo de vida.


Quem de fato escreveu as Aventuras de Gulliver foi um anão.


O cérebro pesa, em média, 1.000 gramas, as quais não
deixam nossas idéias darem um quilo certo.


Ilusão de ótica é o que faz as pálpebras piscarem.


Pero Vaz de Caminha, logo que chegou ao Brasil,
escreveu uma carta reclamando dos correios daqui.


A lua tem três movimentos, os quais não deixam ela parar.


Anorexia é uma doença que dá somente nas pessoas
sem nenhum apetite.


Praga foi capital do Egito por sete anos.

Autor
Fraga. Jornalista e humorista, editor de antologias e curador de exposições de humor. Colunista do jornal Extra Classe.

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