Divergências na redação da IstoÉ abrem debate sobre papel da imprensa

"Estamos apenas segurando nosso emprego ou temos compromissos maiores com a cidadania?"

O editor de Política da sucursal de Brasília da IstoÉ, Luiz Cláudio Cunha, enviou uma carta a Carlos José Marques, diretor editorial da revista, na última segunda-feira, 27. No documento, Cunha criticou as posições editoriais e a forma como Marques vem exercendo seu cargo. Uma cópia foi enviada para Domingo Alzugaray, dono da Editora Três, que publica a IstoÉ, e para Alberto Dines, diretor do site Observatório da Imprensa, onde, na terça-feira, 28, a carta foi publicada. O conteúdo questiona os rumos do jornalismo nacional, e motivou o jornalista Roberto Andrade a escrever o artigo "Que maravilha, o bom jornalismo", publicado ontem por Coletiva.net.


Segundo o site Comunique-se, o fato que determinou a redação e o envio do documento foi o desligamento dos repórteres Donizete Arruda e Amauri Ribeiro Jr. da revista, no dia 17. O diretor da sucursal de Brasília, Tales Faria, exigiu algum tipo de discussão com ele, que era o responsável pelos repórteres. Marques se mostrou decidido, o que levou o diretor a colocar seu cargo à disposição. Faria foi demitido junto com os repórteres no dia 20. Com o episódio, Luiz Cláudio entendeu que não havia mais clima para continuar a trabalhar na IstoÉ e informou a Marques que também queria ser demitido, mas o diretor editorial não aceitou a decisão sob o argumento de que a revista não possuía o dinheiro necessário para pagar os valores decorrentes da quebra de contrato.


Para Luiz Cláudio, o motivo da insatisfação vai muito além da demissão dos três repórteres. A revista sofre com falta de profundidade e degradação editorial, além de uma preocupação estética acima da jornalística. Ele compara a IstoÉ atual ao sanduíche Big Mac, que "pode até ser usada numa emergência, mas como comida do dia-a-dia é pura tapeação". É o jornalismo fast-food. De acordo com Luiz Cláudio, toda a cadeia produtiva da revista é controlada por Marques. "Ele dizia qual era a foto escolhida, passava o título, o subtítulo, o lead e o tom da matéria, transformando profissionais tarimbados em seus office boys, obrigando todo mundo a cumprir o que ele queria", revolta-se. O jornalista revela ainda que o diretor alterava sem pudores os textos que eram entregues de forma diferente ao que ele esperava, num grau de intervencionismo que considera desrespeitoso.


As críticas abrem um precedente para um debate sobre o papel das revistas semanais. "Não estou preocupado em bater ou não bater no Marques, acho que ele é um detalhe menor na imprensa brasileira, ele não tem nenhuma relevância. O debate relevante é a gente sair de nosso comodismo e pensar no que estamos fazendo em nosso trabalho, se estamos apenas segurando nosso emprego ou se temos compromissos maiores com a cidadania, com o País, que é a veiculação de informações num jornalismo de qualidade. Estamos muito acomodados com esse avanço inexorável da mediocridade", avalia Cunha.

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