Grupo RBS prepara mudanças radicais na estrutura

Head hunter procura executivo no centro do País e Tvcom mudará até o nome

Sede do Grupo RBS | Crédito: Agência RBS/Divulgação
Mudanças significativas deverão ocorrer nas próximas semanas no Grupo RBS, em um movimento que é considerado o mais radical já adotado pela empresa nos últimos anos. Há semanas circula no mercado a informação de que foi contratado um escritório de head hunters de São Paulo para identificar um profissional que assuma o comando do grupo. Mais do que o afastamento dos executivos Deli Matsuo e Anik Suzuki, o movimento atual mexerá com várias cadeiras - entre elas a do atual diretor executivo de Jornalismo, Marcelo Rech, que voltará a ter relevância maior na empresa.
Nos próximos dias também deverá ser anunciada outra alteração radical, a da Tvcom, que inclusive trocará de nome. Passará a ser considerada um meio "multiplataforma", dentro de um projeto mantido a sete chaves, sob o comando da executiva Flavia Moraes. Toda a programação atual será modificada e, a princípio, apenas uma atração será mantida: o programa Bate Bola, com o comunicador Pedro Ernesto Denardin, que passará a ser transmitido de um restaurante de Porto Alegre.
O portal do jornal JÁ avança nas informações e publicou na noite desta segunda-feira, 28, uma extensa reportagem de Luiz Cláudio Cunha, detalhando mudanças no board. A empresa não confirma as informações, mas há dias o mercado identificava sinais que iam na contramão da rotina. No evento ZH Em Pauta, anunciado com ênfase como importante iniciativa do jornal Zero Hora, Nelson Sirotsky, presidente do Conselho de Administração, estava presente; Duda Melzer, presidente executivo, não. Na entrega do Troféu Guri, durante a Expointer, uma das mais destacadas promoções do grupo de comunicação, o anfitrião e orador foi Nelson; Duda não compareceu.
Confira aqui o trabalho do repórter, que atualmente reside em Brasília:
Ainda não é oficial, mas será: caiu o presidente do Grupo RBS, Eduardo Sirotsky Melzer, o Duda.
O afastamento do principal executivo do maior grupo de mídia do sul do país deverá ser formalizado em outubro. Uma empresa de head-hunters de São Paulo já está procurando um profissional que assuma o comando do conglomerado sulista e de forte repercussão na mídia nacional, já que a RBS é a maior afiliada da Rede Globo no Brasil.
O grupo possui 18 emissoras de tevê que cobrem 789 municípios do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, além de sete rádios e seis jornais, liderados por Zero Hora, o diário mais influente da região e o sexto jornal de maior circulação no Brasil.
Eduardo Sirotsky, neto do fundador da RBS, Maurício Sirotsky (1925-1986), assumiu o comando do grupo em 2012, recebendo o bastão de comando do tio, Nelson Sirotsky, da segunda geração da família mais poderosa da mídia da região Sul.
O que parecia promessa virou decepção. O jovem Duda, então com 40 anos, se defrontou com uma crise de conjuntura que mesclou redução de faturamento, aumento de custos, fuga de leitores e a crise existencial da internet que atingiu o fígado, o bolso e o modo de operação dos jornais impressos, núcleo central que sempre deu prestígio e influência às famílias tradicionais da grande mídia brasileira.
A crise que afetou Zero Hora e outros grandes jornais erodiu o prestígio dos Sirotsky - e o comandante em exercício na terceira geração, Duda, acabou pagando o pato. Para tentar estancar a sangria, ele acertou em 2013 a contratação de um consultor respeitado em São Paulo e temido pelo apelido que o define: Cláudio Galeazzi, um especialista em hemorragias empresariais que, à custa de seu rigor impiedoso e cirúrgico, conquistou no mercado a merecida fama de Galeazzi Mãos de Tesoura.
Sua aparição no grupo, sobrevoando o emprego de seus 6.500 funcionários, foi revelada aqui no JÁ numa reportagem em setembro de 2014 sob o título de ?A tesoura que assombra a RBS?. A lâmina de Galeazzi cortou fundo na empresa, fundo demais. O fio agudo do consultor acabou sangrando até as relações entre criador e criatura, os dois Sirotsky que se revezaram no poder, Nelson e Eduardo.
Gente de confiança de Nelson foi tesourada, sem piedade, pelo plano de arrocho imposto por Eduardo. Dois homens da tropa de elite de Nelson - o vice-presidente de jornais, rádio e digital, Eduardo Smith, e o diretor de jornalismo, Marcelo Rech - foram excluídos do círculo de decisão da RBS, provocando uma cisão irreparável nas relações entre tio e sobrinho. Eduardo afastou Rech da área crítica da direção editorial, contrariando frontalmente a visão de Nelson, que via o jornalista como uma referência de ponderação nas decisões sempre delicadas da redação.
Apostas erradas
O sobrinho, um inexperiente administrador de empresas com rápida passagem na juventude por uma inexpressiva franquia de pirulitos e balas, acabou sendo uma aposta errada do tio. Eduardo não mostrou o talento e o apego jornalístico que Nelson herdou do pai, Maurício, um homem que trazia a comunicação nas veias do veterano profissional de rádio.
A sangria desatada dos últimos tempos mostrou ao clã Sirotsky que o próprio Galeazzi e sua impiedosa tesoura também foram apostas equivocadas. Nelson e membros da família acham, agora, que a dose foi exagerada, e o desgaste na imagem vencedora da RBS tornou-se insuportável. Os laços profissionais com Galeazzi estão cortados, ele já cumpriu sua missão de serial killer com louvor, e ninguém mais quer lembrar de sua sangrenta passagem por lá. Para conveniência geral, a conta da contratação de Galeazzi ficou nos ombros largos do jovem Duda Sirotsky.
Diante do tamanho da crise que afeta os negócios da comunicação, agravada pelas dificuldades mais amplas da economia brasileira, a família Sirotsky percebeu agora que Eduardo não tem o perfil para cavalgar o tsunami da conjuntura e não tem o pulso necessário para impor um novo rumo à RBS.
Com a frieza de um Galeazzi, Nelson aprovou, na família, a dolorosa decisão de tesourar o sobrinho, afastando-o da cadeira de comando antes que o buraco fique maior. Coincidência ou não, isso fará com que Eduardo Sirotsky Melzer compareça à CPI do CARF, no Senado Federal, na condição de ex-dirigente da RBS. Ainda não há data marcada para seu depoimento, mas ele já foi convocado para depor em nome da RBS, uma das principais empresas brasileiras flagradas pela Operação Zelotes, da Polícia Federal, que investiga a manipulação de multas e crimes de sonegação no âmbito da Receita Federal.
Fim da perpetuação
Eduardo prepara o desembarque da RBS há algum tempo. Nunca formalizou a transferência da mulher, Lica, de São Paulo para Porto Alegre e, há algum tempo, trocou a casa na capital gaúcha por um apartamento, onde mora só. A mudança já foi concluída para a sua mansão no elegante bairro do Morumbi, na capital paulista, onde ele pretende morar definitivamente - dentro ou fora da RBS.
A ousada decisão da RBS de requisitar os serviços de uma empresa head-hunter para definir o sucessor de Eduardo mostra que a família desistiu do privilégio hereditário de manter um Sirotsky no comando da empresa. É um exemplo inesperado de profissionalismo, que afeta o dogma da "perpetuação" que o clã Sirotsky cultivou com obstinação até agora. Mas, revela também o reconhecimento de que não encontraram, nas veias familiares, o talento empresarial necessário para manter a RBS no rumo de sucesso que tinha com os dois primeiros Sirotsky, Maurício e Nelson.
No grande evento de Porto Alegre da transmissão de mando na RBS, em 2012, as fotos mostram um sorridente Nelson Sirotsky cumprimentando o eufórico Eduardo Sirotsky Melzer. Sem perceber que o microfone continuava aberto, o tio deu um forte abraço no sobrinho e fez uma clara recomendação, que repetiu duas vezes, numa inconfidência que ecoou pelo salão:
- Não se acadele, Duda, não se acadele!
O verbo acadelar, no restrito linguajar gauchesco, significa desmotivar-se, perder a coragem, apequenar-se, quase uma desonra para o rígido código de ética do gaúcho tradicional. Nelson Sirotsky, sem querer, definiu nesse descuido, num momento de festa, o que acontece agora no momento de tragédia pessoal do sobrinho.

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