Não podia ser diferente. Como referência gaúcha na área de gastronomia e um bom amante da comida, ele insiste destacar que não é um professor profissional de culinária, mas sim um advogado que foi para a cozinha e se transformou no conhecido Anonymus Gourmet. Natural de Porto Alegre, o advogado e jornalista José Antônio Pinheiro Machado, 53 anos, iniciou sua carreira na extinta Folha da Tarde, em 1969. Depois trabalhou na Folha da Manhã, juntamente com Ruy Carlos Ostermann. Foi correspondente do Correio do Povo em Paris e Roma, durante dois anos, período em que fez a cobertura do Campeonato Mundial de Fórmula 1, e da conferência de Paz do Vietnã, em 1973.

Como ele mesmo faz questão de enfatizar, esses trabalhos foram determinantes em sua atuação como jornalista. Formado em Direito e decidido a seguir a carreira - trabalha até hoje no escritório de advocacia de seu pai, José Antônio Pinheiro Machado Neto - Pinheirinho, como também é conhecido pelos mais próximos, diz que nunca conseguiu se afastar do jornalismo, e no total acumula hoje 34 anos de trajetória profissional. "Exerço a advocacia, e sempre fiquei tentando me livrar do jornalismo, porém não consegui. Acho que já estava inerente ao meu ser", diz ele, lembrando suas passagens como repórter nas revistas Playboy (da qual foi também editor), Placar e Quatro Rodas.

No telejornalismo, apresentou durante cinco anos um programa de entrevistas na RBS TV, o RBS Entrevistas, posteriormente retirado da grade de programação da emissora. Ao longo do anos de atuação no jornalismo, Pinheiro publicou vários livros, quase todos pela LP&M, editora em que um dos sócios e editores é seu irmão. "O Ivan, além de ser meu irmão, é o meu melhor amigo e editor". Entre seus livros publicados estão 'O Brasileiro que ganhou o Prêmio Nobel', 'Recuerdos do Futuro', 'Enciclopédia das Mulheres', 'Copos de Cristal' e cinco envolvendo seu personagem Anonymus Gourmet e suas receitas.

O autor que virou seu próprio personagem

O Anonymus Gourmet foi criado a partir de histórias vividas pelo jornalista Pinheiro Machado, e que acabou sendo personagem central de incontáveis artigos sobre gastronomia publicados em jornais e revistas. A estréia do nome Anonymus Goumet foi com a publicação do seu primeiro livro, em 1982, `O Brasileiro que ganhou o primeiro Nobel`, que tinha como subtítulo 'Uma Aventura de Anonymus Gourmet'. Em 1995, Pinheirinho foi convidado pela RBS para apresentar um quadro de gastronomia na emissora. Do convite surgiu a idéia de utilizar seu personagem fictício como figura central do programa.

Ligando o útil e o agradável, o personagem foi incorporado por Pinheiro na apresentação do quadro, que viria a se chamar 'Anonymus Gourmet'. Ao longo desses anos o projeto foi crescendo, o quadro virou programa, e, segundo Pinheiro, alcançou uma dimensão que ele próprio nunca imaginara. Atualmente o programa Anonymus Gourmet é veiculado pela RBS, com apresentação aos sábados, às 9h, e diariamente na TVCOM, além do quadro no Jornal do Almoço, às quintas-feiras. Pinheiro também é colunista da Zero Hora, onde tem uma coluna no caderno de Gastronomia, e dá dicas de culinária todos os dias, às 11h, nos programas da Rádio Gaúcha, Chamada Geral e Gaúcha. Quer mais? Pois o Anonymus Gourmet ainda tem uma figuração na internet, através do site clicRBS.

Talento que vem de berço

Desde guri, como ele refere-se a si próprio, Pinheiro já cozinhava. "Eu que fazia os carreteiros e outras comidas nos acampamentos com os amigos". A arte de cozinhar vem de berço, pois o dom para a gastronomia foi herdado da mãe, Dona Circe - uma cozinheira de mão cheia que até hoje dá dicas e faz críticas às receitas do Anonymus. "Ela me ensinou muita coisa, eu admirava seu talento na cozinha", afirma ele. Mas a gastronomia em sua vida foi marcada pelo período em que passou na França. Para aquele jornalista gaúcho que se aventurava a viver em Paris, lá era tudo muito caro, e não havia condições de comer sempre em restaurantes e lancherias.

Decidiu então começar a preparar as refeições em casa, o que obrigou-o a trabalhar sistematicamente na cozinha. "Uma coisa que me impressionou muito foi a maneira e o culto que os chef's de cozinha franceses dedicam à comida, com seus rituais da boa mesa, o respeito e o amor que eles têm pelas refeições". Grande parte de sua biblioteca foi adquirida na França. Ele conta que começou a se interessar cada vez mais por gastronomia, o que o levou a comprar livros para aprofundar seu conhecimento sobre o tema. Resultado: hoje Pinheirinho tem mais de dois mil volumes de gastronomia em sua biblioteca. "Comprei um livro que se chama `Viver entre livros`, isto justifica a minha vivência. Todo canto da minha casa tem livros".

Uma produção bem caseira

Como não poderia ser diferente, o projeto Anonymus Gourmet transformou a vida de Pinheiro. Os programas do Anonymus Gourmet são gravados todos em sua casa, uma moradia privilegiada, com vista para o Rio Guaíba, no bairro Ipanema. Pinheiro realiza as gravações dos pilotos aleatoriamente em uma de suas quatro cozinhas. Segundo ele, a casa já tinha uma estrutura completa, mas foram feitas algumas adaptações para facilitar a produção dos programas para a televisão. "Isso que é o diferencial do programas: são cozinhas vivas, existentes na minha casa, não é um cenário montado. Os programas são realizados numa cozinha de verdade, onde eu almoço, tomo café com a minha família, lugar que eu me reúno com meus amigos", explica ele.

Uma figura carimbada nos programas do Anonymus é o seu câmera, Trindade. O Tri, como é chamado por Pinheiro, é cinegrafista da RBS, mas há oito anos grava o programa do Anonymus e ajuda com os preparativos das receitas e comidas. Enquanto realiza as instalações e prepara as câmeras para as gravações, Tri ainda tem tempo para auxiliar o apresentador na cozinha, picando as verduras, organizando os ingredientes e conferindo com o próprio Anonymus se não está faltando nada para a receita.

Advocacia ou Gastronomia?

Pinheiro acorda de manhã, toma café e vai caminhar na beira do rio, a uma quadra de sua casa. De manhã ele se dedica aos trabalhos do escritório de advocacia Pinheiro Machado, onde tem atendimento em determinados horários pré-agendados. No turno da tarde, grava os programas. Nos dias de gravações, geralmente terças e quintas-feiras, o jornalista não come quase nada até a hora em que termina a gravação. Ele diz que pretende sempre fazer jus à fome, pois o telespectador deve sentir que ele está com água na boca. "Cozinhar com fome dá mais prazer, depois que acabo de gravar, eu e minha equipe saboreamos as especialidades", diz ele. Para organizar todos seus compromissos, Pinheiro tem uma agenda muito rígida, controlada por sua secretária. "Às vezes eu nem sei o que está marcado para o dia de amanhã", comenta.

Nas horas de folga, aproveita para ir ao supermercado, pois faz questão de ir ele mesmo e escolher os ingredientes. Depois de seu dia terminado, Pinheiro prefere ficar em casa com a família. "Para descansar eu carrego pedra, sempre acabo cozinhando em casa, tomo um chopp, mas na verdade sou caseiro, gosto de ficar em casa", salienta ele. E, mesmo com uma demanda enorme de trabalho, não deixa de realizar as suas viagens para o exterior, que, segundo ele mesmo, são prioridades na sua vida, embora o grande lazer mesmo seja a leitura: "Sou um leitor voraz". Para o futuro, Pinheiro pretende reduzir a demanda de trabalho, mas ressalta estar satisfeito e realizado com o sucesso dos programas do Anonymus e sua carreira.

No momento está iniciando um novo desafio, ao assumir um programa exclusivo com maior profundidade, aquele exibido aos sábados na RBS TV. "Tudo isso para mim é uma surpresa, eu nem imaginava tanta aceitação por parte do público", acredita ele. A simplicidade seria o grande segredo para explicar o sucesso de seu programa, segundo sua própria avaliação. "O grande diferencial é a busca pelo simples. Eu sempre procuro simplificar cada vez mais as receitas e dicas, até porque eu tenho que ser sensível às condições dos diversos públicos-alvos que o Anonymus atinge".

Os planos para o futuro deste jornalista, quer dizer, deste advogado, quer dizer, do Anonymus, envolvem a publicação de muitos outros livros - sobre gastronomia, claro. Mas, e eis uma grande novidade: seu sonho mesmo é conseguir escrever um livro policial, de ficção. Talento para isto não lhe falta. Mas será que o Anonymus vai permitir?