André Haar: Como ser verdadeiro

Foi na rodoviária de São Leopoldo que André Haar iniciou a carreira na Comunicação

André Haar - Reprodução

O cenário é o estúdio de apresentação do Rio Grande No Ar, da TV Record RS, mas, ao contrário do que acontece de segunda-feira a sexta-feira, das 7h20 às 8h40, as câmeras estão desligadas. A ausência delas, no entanto, não interfere na postura e no temperamento de André Haar, apresentador do telejornal matutino. Independentemente do ambiente, André Haar é André Antonio Varnieri Haar, técnico em calçados e jornalista. Cara simples, discreto, mas, ao mesmo tempo, expansivo. Ao recordar sua trajetória, revela que, desde a infância, teve o jornalismo e, principalmente, a apresentação em TV, como certezas em seu futuro profissional.

O desejo de ser apresentador de TV e locutor o acompanhou desde criança, quando, ainda com cinco anos, imitava o falar e o agir de nomes da comunicação que costumava assistir e ouvir. Aos 10 ou 12 anos sua voz já despertava em colegas de escola a lembrança do rádio. O resultado não poderia ser outro: aos 17 tornou-se locutor e aos 21 anos comandou o seu primeiro telejornal. Desde então, não deixou mais a telinha - acumula passagens pela rádio União, TVE, Band, RBS TV, Canal Rural e Record, emissora que integra desde sua instalação no Estado, em 2007.

Da fábrica para o estúdio

Natural de Porto Alegre, morou cerca de 30 anos em São Leopoldo. No município de cultura calçadista teve as primeiras oportunidades profissionais e deu início à trajetória que perdura há 21 anos. Foi na rodoviária local que viveu a primeira experiência como locutor, fazendo a liberação dos ônibus. "Parte da plataforma A, ônibus da empresa Central, com destino a Porto Alegre via Freeway. Casamena deseja a todos uma boa viagem", diverte-se ao reproduzir com a voz empostada que lhe é peculiar, porém em tom mais sério que o de costume, o texto que o acompanhou no início da carreira.

Certo vez, soube por um dos motoristas que um menino desaparecido em Cambará do Sul havia sido encontrado. Fez o anúncio e resolveu aproveitar a informação para passar à rádio União, de Novo Hamburgo. "Sabia que não era uma rádio noticiosa, mas era uma maneira de eu me aproximar da emissora", lembra. A resposta do outro lado da linha foi: "Para nós não interessa, mas como é o teu nome mesmo?". Começava ali a carreira de locutor que, em breve, o levaria à TV como apresentador. No rádio, ainda passou pela Tramandaí FM e pela Guaíba AM e FM. Tempos que ele, por vezes, relembra através das chamadas do Rio Grande no Ar, no programa Bom Dia, de Rogério Mendelski.

Radialista pela Feplam, jornalista pela Feevale e técnico em calçados pelo Senai, André chegou a se dividir entre as duas áreas de atuação. Em 1991, por indicação da radialista Simone Ritter, estreou na apresentação do Jornal do Rio Grande, pela Band TV. Na época, chefe de montagem na Azaleia, deixava a fábrica às 17h, pegava emprestado o carro do cunhado e ia para Porto Alegre, onde vivia a segunda jornada de trabalho. "Uma menina que trabalhava comigo disse um dia: "Nossa. Tem um moço igual ao senhor que apresenta um programa na TV". Fiquei bem quieto", lembra aos risos.

Sai a bancada

Com mais de duas décadas de TV, André vive agora uma nova maneira de apresentar telejornal. Há dois anos e meio, o estúdio do Rio Grande No Ar perdeu a bancada e ele passou a comandar o programa em pé, comentando as notícias e, em muitos casos, "construindo a informação junto com o telespectador", como explica. "Apesar de gostar do tradicional jeito de apresentar, hoje tenho a ideia de que as coisas não precisam andar certinhas para funcionar", avalia, ao relatar que o telejornal está continuamente aberto à completa mudança de roteiro.

Foi assim com o caso de um carro que caiu no Arroio Dilúvio, que foi acompanhado ao vivo até o seu desfecho. Ao longo da transmissão, descobriu-se que o motorista era cadeirante e ainda estava dentro do veículo; acompanhou-se o resgate e a retirada do automóvel. "Não é porque o jornalismo é feito muito no improviso, que significa que a informação também é dessa forma. Pelo contrário, ela é muito bem estudada e apurada", garante.

A preparação para cada edição começa no dia anterior, quando acompanha o noticiário do programa A Voz do Brasil e assiste ao Rio Grande Record. A noite de sono acaba às 3h, quando o relógio desperta. Às 4h, está a caminho da emissora. Apesar da experiência, diz que cada edição do jornal é um desafio. "É preciso estar muito por dentro de tudo, ter domínio de vários assuntos, buscar coisas paralelas que tu possas acrescentar", explica.

Ansioso e reservado

Filho do falecido contador Rolf Haar e da dona de casa Marília Varnieri Haar, André é o caçula da família formada por mais seis irmãos - Laís, Thaís, Luiz Fernando, Rolf Haar Júnior, Dóris e Adriana. "Desde pequeno, eu infernizei a vida de todos", conta, ao recordar o que aprontava na infância. Por exemplo: colocava um cano de PVC para dentro da sala e ficava falando através dele, imitando o locutor do rádio. As personalidades da TV também eram alvos de brincadeiras. José Antônio Daudt foi um dos que teve seus gestos durante os comentários na TV Difusora e tradicionais batidas com os punhos na mesa reproduzidos pelo menino.

Pai de Nicolas e Bárbara, 14 e 16 anos, é extremamente reservado quando se trata da vida pessoal e da família, preferindo preservá-la de qualquer exposição - atitude que adota há bastante tempo. Nos momentos de lazer, gosta de ficar em casa, organizar os discos, passear de carro, "dar uma de jardineiro", além de, é claro, curtir a família. Em gastronomia, é apreciador de uma costela feita na parrila e até se aventura na cozinha para fazer o  boeuf bourguignon da norte-americana Julia Child - receita criada por ela durante passagem pela escola de culinária francesa Cordon Bleu e que leva cerca de três horas ao fogo.

Diz que tem na honestidade sua principal qualidade. "Não adianta agradar A, B e C, e me desagradar. Pela minha saúde emocional, tenho que fazer o que é bom pra mim e, quando a gente começa a fazer isso, ser verdadeiro, muitas pessoas começam a se distanciar da tua vida", explica. Já o defeito, "putz, qual deles?", questiona a si mesmo, para em seguida atribuir o título à ansiedade.

Gostos e peculiaridades

Gramofone, videocassete e toca-discos são alguns aparelhos antigos que André tem em casa e tudo em funcionamento. Em estilo musical, tem gosto especial pelos clássicos e pela música italiana. "Tenho alguns traços do século passado", brinca. Já a mãe, segundo ele, atribui essa característica ao sangue do avô. Quando o assunto é a sétima arte, não faz restrições quanto a gêneros. Assiste de tudo um pouco, sem preconceitos.

Nas leituras, além das velhas edições da revista Manchete, da década de 1970, tem na astronomia um segmento que acompanha bastante. É relacionada à mesma ciência uma de suas manias: quando acende a lareira, costuma ir para fora de casa ver a fumaça sair e aproveita para observar o céu. "As pessoas não têm noção da quantidade de satélites que cruzam o céu. Alguns eu já aprendi a identificar, como o ISS, a estação espacial internacional", ensina.

Apesar de não ter o judaísmo como religião, aprecia a cultura, o idioma hebraico - no qual até arrisca algumas palavras - e já visitou Israel por duas vezes. O assunto chega a ser tema de palestras que faz em escolas, nas quais aborda o conflito entre palestinos e judeus.

Pela felicidade

Guarda como um elogio marcante o agradecimento de um entrevistado pela forma com que conduziu a conversa. "Tu chega a ser duro e o entrevistado agradece pela tua postura profissional. Isso é uma coisa que me deixa muito feliz", relata. Críticas? "Não tenho nenhuma que tenha me traumatizado", afirma, explicando, em seguida, que costuma compreendê-las como possibilidades de aprendizado.

Essa característica também é lembrada por Rodrigo Falcão, editor-chefe do Rio Grande No Ar, que descreve André como alguém "com coração enorme, sempre disposto a ajudar todo mundo, a acudir quem quer que seja, nos momentos difíceis, e nos bons", além de "profissional competentíssimo, sempre aberto a críticas".

Crê na felicidade como um resultado dos próprios atos e, ao defender a ação em detrimento da espera, diz que substitui as esperanças pelos desejos. "Desejando, tu buscas aquilo que tu queres. E realizando, tu fazes a tua felicidade." Como ele próprio se define? Apenas uma pessoa realizada. "Não que eu tenha feito tudo, mas sou feliz por tudo o que fiz".

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