Ticiano Osório: Um geek na redação

Entre Esporte e Entretenimento, Ticiano Osório relembra o caminho traçado em duas décadas de jornadas na redação

Ticiano Osório | Crédito: Fernando Gomes/ Agência RBS
Por Gabriela Boesel
Assim como a vida pessoal, a trajetória profissional de Ticiano Osório se consolidou na capital gaúcha. Nascido e criado em Porto Alegre, o jornalista, formado pela Ufrgs, em 1996, já contabiliza 21 anos na redação de Zero Hora, metade da vida, já que tem 42 anos. Mas o envolvimento com a Comunicação vem desde a infância, quando, por incentivo dos pais, já desenvolvia o gosto pela leitura e pela escrita.
O filho mais velho do psiquiatra Cláudio e da professora aposentada de Genética Maria Regina, hoje separados, parece tímido, mas se revela um verdadeiro comunicador. Orgulhoso, conta as conquistas na profissão e não se acanha ao repetir algumas vezes que "falo bem de mim mesmo". Autoconfiança que adquiriu ao longo dos anos e, confessa, só é assim porque recebeu o respaldo dos gestores. "Se eu cheguei até aqui, foi porque fiz por merecer e aproveitei todas as oportunidades que me deram", esclarece.
Condutor da própria vida
"Tu quer ir a reboque ou quer levar tua vida?". A frase, dita por um antigo colega, fez Ticiano rever suas ações e, a partir daí, passou a se guiar pelas próprias decisões. "Eu sou meu condutor. Tenho que seguir as diretrizes e conversar com os outros, mas quem tem responsabilidades pela minha carreira sou eu", explica. E deu certo. Nesses 21 anos de atuação no Grupo RBS, se dividiu entre a editoria de Esporte e o 2º Caderno. Aficionado por futebol e por cinema, diz com convicção que é privilegiado: "Sempre trabalhei onde queria e com temas dos quais gosto muito".
Com tanto orgulho pelo trabalho, ninguém diria que a primeira opção foi Publicidade. Menos ainda que, por não ser aprovado no vestibular, optou por Letras. Mas um semestre foi suficiente para trocar de curso e dar início à trajetória no Jornalismo. História confusa? Ele explica: ingressou no curso de Letras apenas para começar a vida acadêmica e evitar ir para a tropa caso fosse chamado para o Exército.. Depois, desistiu da Publicidade, pois ouviu de um publicitário que esses profissionais, muitas vezes, precisam vender produtos nos quais não acreditam. "No Jornalismo isso também pode acontecer, mas achei que era mais fácil de ser fiel aos meus princípios", lembra.
Ainda na época de estudante, teve breve passagem no teatro, "o que deu um dinheirinho", como diz, mas não seguiu. O motivo da desistência é o mesmo que o levou a fazer diversas outras escolhas ao longo da vida. "Quando me envolvo, eu me envolvo mesmo. Não consigo me dedicar a várias coisas ao mesmo tempo. Sou um ser binário", brinca, e acrescenta que se dedica única e exclusivamente ao trabalho e à família. "Uma terceira atividade não se encaixa na minha vida."
Datas que marcam
Entre 1994 e 2016, há anos que tem um lugar especial na memória do jornalista. "Lembro as datas porque foram momentos muito marcantes na minha vida", conta, revelando, ainda, que lembra, inclusive, os meses de cada acontecimento. O ano de 1994, por exemplo, marca o início da carreira, quando ingressou na Revista Programa - publicação da Capital que oferece informações sobre Porto Alegre. No mesmo ano atuou por 10 meses como estagiário na rádio-escuta da Band. Lá, fez de tudo um pouco, desde levar cafezinho no programa Livre, de Luiz Arthur Ferraretto, até ajudar na produção, ser redator na Band FM, fazer Esporte, atuar como repórter, cobrir trânsito e andar de helicóptero.
Da Band foi para Zero Hora, de onde não mais saiu. Começou como copywriter, setor que hoje corresponde à Agência RBS. Fez escutas de jornais, telejornais e rádio e já nessa época, acredita, passou a desenvolver o senso crítico de editor. Em abril de 1995, surgiu a oportunidade de colaborar na editoria de Esporte, chance que nem pensou em recusar e passou a fazer plantões domingo sim, domingo não.
Mesmo envolvido com o Esporte, sempre foi admirador dos quadrinhos, sua maior marca geek. Em fevereiro de 1996 sugeriu para o então repórter do 2º Caderno, Eduardo Veras, uma matéria sobre a guerra dos heróis da Marvel contra os da DC Comics. "Sempre agradeço a preguiça dele", lembra, ao contar que Veras pediu para que ele mesmo escrevesse o texto. E a primeira produção - intitulada "A espetacular guerra de dois mundos" - está enquadrada na sala de casa. Por isso e por vários outros ensinamentos, Eduardo Veras é tido como uma das maiores referências profissionais de Ticiano, junto com Claudia Laitano.
Dedicação e recompensa
Até fevereiro de 2014 o trabalho do profissional se resume a três passagens no 2º Caderno e outras três no Esporte. Ajudou também em forças-tarefa de Política, fez cobertura de praia e de Carnaval, e editou o Guia ZH. Uma das produções das quais se orgulha foi a Prancheta ZH, criada em 2008 junto com um colega. A página semanal com estatística e brincadeiras ligadas ao Campeonato Brasileiro ganhou, inclusive, um reconhecimento interno. No mesmo ano foi eleito o editor do ano de ZH.
Em 2014, foi convidado para ser editor de Sua Vida, função que exerce desde novembro daquele ano. E, a partir de fevereiro de 2016, passou a dividir o tempo na Redação também com a editoria do caderno Doc, da superedição de fim de semana de ZH. Neste meio-tempo, lembra que 2015 foi marcante. "Foi um ano muito bacana para mim, pois várias matérias que eu editei ganharam prêmios", orgulha-se, e ressalta que esses reconhecimentos reforçam sua paixão pela função de editor. "Gosto de editar, pois sempre tenho algo para fazer. É chato ter que esperar as coisas acontecerem, e o editor não espera, faz. Meu trabalho é fazer o repórter brilhar."
Dos momentos de satisfação na carreira, as viagens para Londres/Escócia, África do Sul e Israel merecem destaque. "Fui a trabalho, mas conto como prêmio e recompensa pelo meu desempenho", diz. Outro momento memorável é o que está vivendo agora. "Acho que editar o Doc é uma das coisas que mais me dá prazer", revela.
Sobre o futuro traçou algumas metas, como a de se tornar um editor mais multimídia e dominar as ferramentas digitais. Mas o objetivo principal é o de completar 40 anos de ZH. "Já estou passando da metade", fala, esperançoso.
Santo de casa faz milagre
O exemplo dos pais se reflete em Ticiano, que não cansa em dizer que foi por causa deles que seguiu o caminho da Comunicação. Confessa que, às vezes, é difícil se dedicar como gostaria. "Não sou, nem perto, o leitor que eles são, muito menos o leitor que eu gostaria de ser." Na escola, nunca foi muito estudioso, mas sempre prestou atenção nas aulas. "Nunca fui um aluno nota 10. Fui nota 8", explica.
E, pelo visto, a afinidade com os livros foi passada adiante. Pai da Helena, de 6 anos, e da Aurora, de 2, diz que adora levar as pequenas para passear na Livraria Cultura, e se anima ao contar que a mais velha já gosta de ler. As filhas são fruto do relacionamento com a estudante de Nutrição Beatriz Zanetti, cuja história é lembrada com carinho e certa graça. "A gente brinca que eu fiz uma marquinha nela quando criança", ri, ao contar que o falecido sogro também era psiquiatra e amigo do seu Claudio. Por isso, já teria ido na casa da futura esposa na infância. Mas se conheceram, de fato, em uma festa. "Só depois fiquei sabendo que Beatriz era filha de um colega do pai e que, quando criança, eu já a conhecia", diverte-se com a coincidência.
Sobre aumentar a prole, "só se ganhar na megasena", brinca. E, caso ganhe, tem mais um destino para o dinheiro: comprar de volta a antiga casa dos pais em São Francisco de Paula. O lugar remonta às melhores lembranças da infância, onde passava os veraneios e "inverneios", como gosta de dizer, com a irmã mais nova, a hoje enfermeira Marília.
A frase "com um pai psiquiatra e uma mãe professora de Genética, Deus nunca entrou lá em casa", resume sua relação com a religião. Conta que foi batizado somente pela tradição, mas que não repetiu o hábito com as filhas. "Não tenho relação nenhuma com religião, tanto que não me considero nem ateu", pontua.
Futebol é um assunto que domina e, mesmo tendo atuado como jornalista esportivo, não tem problema nenhum em revelar que o Grêmio é seu time do coração. Considera o esporte, inclusive, um lazer eterno, mas se aposentou dos gramados porque as lesões passaram a se tornar rotina. Adotou, então, a corrida, que muito se relaciona com a tara por chocolate. "Corro para comer doce", confessa, aos risos. Aliás, na cozinha diz gostar de qualquer coisa, desde que feita na hora, e o prato predileto não poderia ser mais simples: pizza de calabresa e quatro queijos. Mesmo sem afinidade com a prática, fala que, se pudesse, seria jurado de reality show de culinária, "só para ter a experiência de provar todas aquelas comidas".
Das paixões que vêm de dentro
Assim como por esporte, Ticiano é aficionado por cinema e quadrinhos. Tanto que costuma dizer que a coleção de gibis de super-herói da infância foi a responsável por trazê-lo até aqui. "Graças a eles que abri uma porta para a Redação." No cinema, gosta basicamente de produções hollywoodianas, com algumas exceções argentinas. Billy Wilder e Christopher Nolan são os diretores preferidos, embora um filme belga esteja na lista dos Top 5. "Um homem com duas vidas", de Jaco Van Dormael, é seu totem e se cobra por tê-lo assistido apenas uma vez.
Na música, é categórico e diz com convicção: "Sou bem britânico". As bandas mais ouvidas são New Order, Depeche Mode e Cocteau Twins. No que se refere aos livros, confessa que, com o agito das pequenas, é difícil ter sossego, mas gosta muito de Philip Roth, Rubem Fonseca, Ian McEwan e Dennis Lehane, sem falar, é claro, nos quadrinhos.
Ticiano acredita que sua qualidade anda de mãos dadas com seu maior defeito: é persistente e teimoso ao mesmo tempo. Para compensar, busca agir com ética, baseando-se em ditados populares, mas que acredita serem verdadeiros, como "nunca faça aos outros o que não queres que façam a ti" e "não é porque não estão olhando que tu não vais juntar o cocô do cachorro". Não se considera um ativista, "mas tenho minhas bandeiras" e usa o Jornalismo para fazer defesa da cidadania. E falando em Jornalismo, diversão no trabalho é o que melhor define Ticiano, que defende a ideia de que "a gente tem que aproveitar o trabalho, senão, perde a graça".

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