Ayres Cerutti: Agregador idealista

Engajado e inquieto, o jornalista está sempre buscando realizar ações para melhorar as relações humanas

O jornalista Ayres Cerutti abdicou da carreira religiosa e acadêmica para se dedicar ao mundo do jornalismo, com o qual teve contato através das lutas e movimentos estudantis. Engajado e inquieto, está sempre empenhado em promover ações que possam melhorar a sociedade onde vive. "De vez em quando, me dá uns lances de criatividade, e também sou muito persistente quando abraço uma causa. Claro que isso acaba se transformando em um defeito: a teimosia. Estou neste meio-termo, entre a persistência e a teimosia", conta.


O espírito político esteve constantemente presente em sua vida, mas Ayres  garante que nunca pensou em se envolver com a política em si. "Sou filiado ao PDT e cheguei a atuar como secretário da SMIC, na administração de Alceu Collares. Mas, com certeza, sou mais dos bastidores do que da linha de frente", diz.


Gaúcho de coração


Nascido no dia 7 de janeiro de 1951, na vila Engenho Velho, no interior de Concórdia, em Santa Catarina , Ayres se considera um gaúcho de coração. Boa parte de sua infância foi vivida neste vilarejo, que ficava às margens do Rio Jacutinga, onde hoje existe a barragem de Itá. O jornalista é o mais velho de uma família de seis irmãos e traz boas lembranças da época vivida em terras catarinenses. "Como meu pai era sapateiro, e também fabricava equipamentos para montaria, eu vivia ao redor dele, e o ajudava em algumas atividades. Estava sempre no meio daquelas vendas de interior e acompanhava todo o movimento dos colonos chegando e saindo e mandando fazer botas. Hoje, quando lembro do período, imagino como se o local fosse uma vila medieval, pois lá tinha ferreiro, alfaiate? e hoje é até difícil de explicar como funcionava tudo aquilo, pois havia dez famílias e cada uma seguia uma profissão", relata.


O tempo passou, os filhos saíram de casa e, atualmente, Ayres tem irmãos em Porto Alegre , Curitiba, Florianópolis, Brasília, Chapecó e Foz do Iguaçu. O pai do jornalista faleceu há dois anos e, até então, a casa dos seus pais era o ponto de encontro da grande família.


Com apenas 10 anos, saiu de casa para estudar. O destino foi um seminário no município de Peritiba. Mais tarde, deu continuidade aos estudos religiosos na cidade de Chapecó, onde permaneceu até os 18 anos. "Na época, o seminário era o caminho mais procurado pelos jovens para estudar. Mas, no meu caso, não era só incentivo da família, pois eu realmente queria ser padre!"


A vontade de seguir a carreira religiosa era tanta que, em 1969, ele mudou-se para Porto Alegre para estudar Filosofia no Seminário de Viamão. Foi quando Ayres começou a participar ativamente dos movimentos estudantis, que ganharam força e se espalharam pelo mundo a partir de "Maio de 1968" , como ficou conhecido o grande movimento social e cultural do final do século XX. Entre as primeiras conquistas do jornalista neste meio, está a reinauguração do Diretório Acadêmico de sua Faculdade, do qual foi eleito presidente. Ele também orgulha-se de ter conseguido fazer com que o curso de Filosofia da entidade, que, na época, durava apenas dois anos, voltasse a totalizar quatro anos.


Idealismo despertado


Ayres reconhece que sempre foi um idealista, mas essa característica ele conta que foi despertada a partir do momento que ingressou no curso de Jornalismo, nos anos 70, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). Após conquistar o diploma de filósofo, havia sido aprovado em um concurso de magistério, mas, conta ele, estava tão encantado com a futura profissão de jornalista que nem foi fazer a prova de títulos e acabou abandonando a possibilidade de construir carreira como professor.


O início de sua carreira jornalística se deu durante o primeiro ano da faculdade, pois foi convidado pelos colegas Mauro Toralles e Júlio Magalhães para estagiar na editoria de Polícia do Diário de Notícias, onde permaneceu até terminar os estudos. Desta forma, durante quatro anos, teve que se dividir para conciliar os dois cursos com a atividade no jornal. "Era uma ginástica! Nem sei como conseguia. Passei por todos os setores da Redação, pois eu acabava fazendo meu horário e não tinha nada definido, trabalhava de manhã, de tarde, de noite, de madrugada?". No final do mesmo ano, assumiu o cargo de chefe de reportagem da publicação.


Formou-se em 1974 e, no mesmo período, iniciou suas atividades no jornal Zero Hora, na editoria de Esporte. Mais tarde, atuou em Economia e Política. "Como eu não era muito fã de futebol, quando me surgiu a oportunidade de trabalhar neste meio, fiquei um pouco receoso. Logo, percebi que o fundamental no jornalismo é saber trabalhar com o texto e com a informação, então, me soltei e foi mais fácil." A passagem pelo jornal do Grupo RBS foi rápida, pois, em seguida, noivou e a meta do momento era juntar dinheiro para o casamento. Então, começou a fazer trabalhos freelancers para aumentar a renda.


No início de sua trajetória profissional, Ayres lembra que o sotaque típico do oeste catarinense - com o "r" carregado - era motivo de piada por parte dos colegas. Mas, com o tempo, acabou se acostumando com as brincadeiras e os colegas, com o sotaque.


Revista Programa: Três décadas de dedicação


Há mais de três décadas, Ayres se afastou da vida de repórter para se dedicar à área editorial. Em 1975, ele se ofereceu para realizar trabalhos freelancers na Revista Programa, que seria lançada no mesmo ano pelo jornalista Políbio Braga. "A publicação começou a ser editada por Geraldo Canali e, como a revista estava começando, fiz questão de me envolver para ver como era. Então, além de fazer os textos, acompanhava a produção de arte e a finalização na gráfica", relata.


Já no segundo número da revista, Ayres assumiu a edição da publicação, pois Canali, que exercia o cargo, viajara para a Europa. Há 18 anos, também é sócio-diretor majoritário da Intermédio, editora responsável pela Revista Programa, guia de turismo com circulação mensal dirigida a  agentes de viagens, hotéis, transportadoras, empresas aéreas, imprensa em geral, entidades de classe, restaurantes e casas noturnas.


Entre suas atividades atuais, está o comando da Associação Brasileira dos Jornalistas de Turismo (Abrajet), da qual é presidente desde 2004. Sempre envolvido com as entidades de classe, atua ainda como diretor de Patrimônio da Associação Riograndense de Imprensa.


Amores de uma vida


Foi durante a apresentação de uma ópera com libreto em alemão que Ayres conheceu sua primeira esposa, Oneide Ana Orso, funcionária do Banco do Brasil. Enquanto acompanhava o espetáculo, ele resolveu puxar assunto com a bela moça, perguntando se ela entendia alguma coisa do que estava sendo cantado. Oneide explicou que não entendia nada, pois era descendente de italianos. "A ópera terminou e eu a convidei para tomar uma cerveja no antigo e famoso Bar Alasca." Assim nasceu a paixão entre o casal. Eles namoraram, noivaram e foram casados durante oito anos. Tiveram um filho, Jean Francesco, que hoje tem 29 anos, é formado em Engenharia de Minas, pela Ufrgs, e trabalha na Petrobrás, em São Mateus , no Paraná.


Oneide adoeceu, teve leucemia. "Ela  se tratou até nos Estados Unidos, durante seis meses, pois na época já se falava de transplante de medula. Mas ela não chegou a ter condições de fazer o transplante e veio a falecer lá mesmo."  Casou-se novamente, com a advogada Carmen Regina, e com ela teve uma filha, Isadora, de 21 anos, estudante de Direito, na Ufrgs. Hoje, ele está separado e se diz 100% dedicado ao jornalismo.


Rato do Centro


"Me considero um rato do centro de Porto Alegre. Moro na rua Duque de Caxias, meu escritório é na Caldas Junior e a ARI, que eu freqüento semanalmente, é ali na Borges de Medeiros. Minha vida gira em torno do Centro, então, faço minhas atividades como se estivesse me divertindo!" Ele ainda participa de uma organização chamada Instituto Rua da Praia de Análises Políticas e Sociais, composto por jornalistas, advogados, e  funcionários públicos, entre outros. O grupo de 15 pessoas costuma se reunir mais de uma vez, durante a semana, a partir das 13h30, na Rua da Praia, e depois vai para um café discutir temas relevantes sobre a Capital.


No momento, seu grande objetivo é estimular as pessoas a cuidar do Centro Histórico de Porto Alegre, pois, segundo ele, o urbanismo da cidade deixa a desejar. Para isso, organiza ações para preservar o patrimônio dos gaúchos e utiliza um antigo hobby seu como aliado: Ayres sempre gostou de fotografar e se considera um fotógrafo dos bons. Em suas caminhadas pelo bairro, aproveita a habilidade para registrar tudo o que necessita de melhorias - calçadas esburacadas, monumentos depredados, etc. Nos álbuns e nas caixas de sapatos em que guarda seus retratos, estão, principalmente, imagens de paisagens e de monumentos. 


Aproveita os finais de semana para descansar, almoçar com os filhos e caminhar pelo Gasômetro e Brique da Redenção, com a máquina fotográfica analógica sempre a tiracolo.


Instinto agregador


Além de ter um forte senso de consciência social e cultivar suas raízes, o jornalista se afirma como uma pessoa simples, de bem com a vida e que preza as verdadeiras amizades, procurando agregar e unir aqueles que estão à sua volta. Orgulha-se de ter organizado um grupo de chimarrão na ARI que busca valorizar a sede da entidade como um local de encontro de jornalistas.


Devido à atividade que desenvolve relacionada com o turismo, lê bastantes revistas, jornais e artigos relacionados ao tema. Quanto à literatura, costuma ler ensaios e artigos sobre os mais diversos temas. O filósofo italiano Umberto Eco é seu autor preferido. "Na minha casa, tenho papéis e publicações espalhadas por todos os cantos. Então, quando paro, eu sento e leio o que estiver ao meu alcance. Algo que gostaria de fazer com mais freqüência é ir cinema e ao teatro", ressalta.


Descendente de italianos, aprecia massas acompanhadas de um bom vinho ao som de música clássica. Agora que mora sozinho, está se dedicando mais à culinária. "Antes, gostava de comer, mas não sabia cozinhar. Agora, já estou aprendendo a fazer molhos e algumas coisinhas mais básicas. Claro que é mais fácil ter alguém para fazer isso. Sempre fui mais de articular e convidar as pessoas, mas evitava ir para a cozinha. O empenho é tanto agora que até já tenho uma pequena hortinha no apartamento."


"Acredito que todas as pessoas podem fazer alguma coisa para deixar o mundo um pouquinho melhor. Eu procuro olhar ao redor, pois a gente vive numa Metrópole e tudo é anônimo, mas, por outro lado, todo mundo se conhece. Com minhas ações, busco fazer com que esses anônimos se conheçam e que passem a trabalhar em conjunto, pois eles começam a se encontrar e ver que têm os mesmos objetivos". Ayres acrescenta: "Gosto de criar momentos ou situações em que as pessoas possam se encontrar. Nossa função, como comunicadores, é juntar essas pessoas."

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